Ricardo Juarez: O Tom Paris brasileiro

Por Salvador Nogueira  

Ricardo Juarez já é célebre entre os trekkers brasileiros. O dublador ganhou fama em outubro de 2000, quando o canal USA começou a exibir os primeiros episódios de Voyager. Nela, Juarez faz a voz do personagem Tom Paris, originalmente interpretado pelo ator Robert Duncan McNeill.

Juarez promete se esforçar para manter intacto todo o sarcasmo e o bom humor do personagem. Leia a entrevista e saiba o que o ator, que também dubla o desenho animado Johnny Bravo, pensa de Jornada e do trabalho de dublar.


 









 

 

 

 

 

 

 

 

 
Trek Brasilis - Dublar Jornada nas Estrelas é uma grande responsabilidade. Dificilmente há telespectadores tão atentos e críticos quanto os fãs do seriado e os roteiros são tão complicados e cheios de textos técnicos que às vezes são difíceis de ser interpretados. Como você encara essa responsabilidade?

Ricardo Juarez - Quando o assunto é Jornada nas Estrelas, é preciso atenção redobrada. Os textos de ficção geralmente são mais complicados. Com a responsabilidade para fazer um bom trabalho, a dificuldade cresce bastante.


TB - Você é conhecido como a voz de Johnny Bravo, um personagem de desenho animado. Qual a diferença entre dublar um desenho e um personagem de carne e osso? Qual dos dois você prefere e qual deles é mais fácil?

Juarez - Gosto de dublar filmes e desenhos. Gosto de ambos por motivos diferentes. No desenho é possível desenvolver um trabalho mais solto, exercitar a "veia cômica". No caso dos filmes, como Voyager por exemplo, tenho que tomar mil cuidados para deixar o personagem "Paris" o mais natural possível. O que, diga-se de passagem, não é fácil.


TB - Muitas vezes, uma dublagem pode melhorar ou piorar a performance dos atores vista na tela. Quanto do resultado final, após uma dublagem, pode ser atribuído ao dublador e quanto ao ator?

Juarez - Olha, concordo que existam dublagens boas e ruins, mas pra quem não acompanhou todo o processo, é difícil dizer de quem foi a culpa pelo sucesso ou fracasso do filme ou desenho. Às vezes o dublador é bom, mas não fica bem naquele papel, tipo, a voz não combina com o personagem. Às vezes é a tradução, e algumas vezes a direção não orienta o dublador na hora de gravar. Um bom diretor pode fazer a diferença no final. Mas esse conceito de dublagem boa ou dublagem ruim termina sendo uma coisa pessoal. O que posso dizer é que todos os profissionais envolvidos são altamente treinados e competentes, mesmo não agradando muitos. Essa é a verdade nua e crua.


TB - Dublagem normalmente é um ponto de partida para atores de teatro e televisão. Você tem alguma pretensão ou desenvolve alguma atividade nesse sentido?

Juarez - Apesar de já ter feito alguma coisa de teatro, não tenho vontade de entrar de cabeça nessa área. Em termos de televisão, tenho vontade de fazer apresentação de vídeo. Atualmente curso jornalismo, quem sabe posso até tentar apresentar um telejornal... E existe uma possibilidade de eu tentar fazer cinema, minha paixão. A pouco tempo fiz parte do elenco de um curta-metragem, "Rodolfo o Medroso e o Temível Monstro Dentro do Armário". No elenco estão João Campelli (Rodolfo), Murillo Rosa (pai do Rodolfo) --esses dois também fazem novela, estão no elenco da novela das seis, "O Cravo e a Rosa", e, é claro, eu ..o Monstro que mora dentro do Armário (risos). Apesar do título ter uma conotação infantil, o curta é bem sombrio e "não" tem final feliz.


TB - Como no caso dos atores, os dubladores também levam um tempo para entrar na "pele" dos personagens. Em função disso, você acha que a dublagem de uma série permite uma qualidade de dublagem maior do que de um filme, em função do maior volume de material a que o dublador é submetido?

Juarez - Sim. Com certeza, numa série, você conhece melhor o ator e consegue pegar os trejeitos do personagem. O dublador não tem muito tempo pra entrar na pele do personagem, tudo acontece muito rápido em dublagem. A gente entra no estúdio, assiste à cena e logo em seguida já grava, não tem muito tempo para analisar a cara do personagem.


TB - Você já conhecia Jornada nas Estrelas antes de ser escalado para dublar Tom Paris?

Juarez - Já, sou fã desde a Série Clássica!


TB - Nas equipes que dublam Jornada nas Estrelas na VTI Rio, há algum dos dubladores que é trekker (fã do seriado)?

Juarez - Hummm, acho que só eu! Na verdade, eu curto muito a série, mas não sei se me considero um trekker. Acho que sou mais um fã...


TB - Pelo que você viu, o que achou do personagem que está dublando? Como é o Tom Paris, visto pelo "Tom Paris Brasileiro"?

Juarez - O Tom é um cara muito simpático, brincalhão... e sempre faz uma piadinha quando se sente desconfortável com alguma situação. Ou seja, se der mole, ele solta uma piada... sacaneando (risos). É difícil dublá-lo, tento estudar seu rosto, quando o olhar muda, uma sombrancelha levanta, ele faz aquele riso de canto de boca... é um motivo pra uma interpretação, uma inflexão diferente. É preciso ficar muito atento, porque se eu gravar de qualquer jeito, posso estragar uma dessas piadinhas que falei. Estou adorando fazer o Tom Paris.


TB - Conte mais sobre o processo de dublagem. Como funciona esse trabalho, desde a entrega dos episódios à VTI até o produto final chegar ao telespectador?

Juarez - Quando o filme chega, ele é traduzido, em seguida é mandado para o diretor, que fica responsável pelo esquema de dublagem, ou seja, ele marca o filme, escolhe os horários em que cada dublador vai gravar, tudo isso tendo em vista que existe uma verba para fazer esse filme, e com "essa" verba, ele precisa fechar o filme... dentro de um prazo que é dado pela empresa onde está sendo gravado.


TB - Sabe-se que a Cristina Nastasi, uma das mais célebre trekkers brasileiras, cuida das traduções dos episódios para a VTI. Ela já sofreu várias críticas no passado, tanto por erros de tradução, quanto pela tradução de termos como nomes de naves e outras coisas. Ela demonstrou alguma preocupação com essas críticas dos fãs na produção das novas traduções?

Juarez - Olha, a Cristina é uma das pessoas que mais conhece o universo de Jornada na Estrelas. O lance da tradução às vezes é levado para um lado pessoal. A verdade é que, por melhor que seja o tradutor ou dublador, sempre existirão críticas. Sei que ela se dedica muito ao trabalho que faz e que tenta fazer o melhor possível. Ela é apaixonada por Jornada.


TB - Jornada nas Estrelas é uma série que requer da VTI Rio um tipo de tradutor diferente: o tradutor "especializado". Isso é muito comum? Você acha que é importante que o material de tradução seja feito por alguém que tenha um conhecimento mais profundo do seriado?

Juarez - Nem sempre uma série ou filme tem um tradutor "especializado". No caso de Jornada, fora a Cristina, tem também a Anna Luísa e a Isabel, que também curtem a série. Mas como já disse, não é uma coisa comum...


TB - Como é a relação entre os dubladores em um estúdio durante a gravação? E fora? Há o mesmo tipo de "picuinhas" e concorrência por determinados papéis que se ouve falar nos estúdios de televisão, teatro e cinema?

Juarez - Olha, a concorrência sempre vai existir, em todas as profissões. No caso da dublagem, não poderia ser diferente. A relação no estúdio é super tranqüila, ninguém é "estrela".


TB - Como são escolhidos os papéis de um dublador?

Juarez - Normalmente são feitos testes para os personagens ou então a emissora indica as vozes que quer.


TB - O que há de melhor na profissão de dublador?

Juarez - Acho que o fato de, em um único dia, poder viver vários personagens... e no caso do Johnny Bravo, colocar um sorriso no rosto de muita gente.


TB - O que há de pior na profissão?

Juarez - Fora o salário... o fato de sempre gravar correndo, às pressas. Muitas vezes a qualidade fica comprometida devido ao ritmo industrial.


TB - Você costuma ser reconhecido pelo público como a voz deste ou daquele personagem?

Juarez - É meio difícil... normalmente as pessoas falam: "Acho que conheço você de algum lugar..."


TB - Você (ou alguém do elenco de dublagem) estaria disposto a participar de uma convenção de Jornada nas Estrelas?

Juarez - Não sei quanto ao resto do elenco, mas eu adoraria participar de uma convenção.


TB - Você costuma assistir aos programas que dubla?

Juarez - Sim, sempre que posso. Sou meio chato com meu próprio trabalho. Sempre que assisto, já fico imaginando mil maneiras de melhorar... sempre melhorar. Nunca me dou por satisfeito. Mas quando faço um trabalho, principalmente quando é uma coisa que gosto, como Jornada nas Estrelas, me esforço muito para fazer um bom trabalho.


TB - Alguma mensagem especial aos trekkers brasileiros?

Juarez - Bom, espero que gostem do meu trabalho, estou fazendo o máximo para deixar o "Paris" o mais natural possível, sem fugir das características originais.


TB - Alguma outra coisa que gostaria de mencionar?

Juarez - See you around the galaxy! Paris out!



Entrevista realizada em duas etapas, em 20 de agosto e 5 de novembro de 2000, para os sites Voyager Brasil e Trek Brasilis.