Em maio de 1975, sete meses após o cancelamento da Série Animada de Jornada nas Estrelas, Gene Roddenberry começou a escrever um roteiro para um filme de cinema de Jornada. O título seria "The God Thing", e a data de início das filmagens seria 15 de julho de 1976 (depois alterado para janeiro de 1977). O orçamento seria de US$ 5 milhões. Era a Paramount preparando o retorno de um dos programas mais cultuados de todos os tempos, e tudo o que o estúdio precisava era de uma história.

E aí estava o problema. Em "The God Thing", a tripulação original da Enterprise (e a única tripulação de Jornada na época) retornaria de sua missão de cinco anos, seria promovida, e assumiria outros postos na Frota Estelar. Porém, quando uma força misteriosa ameaça a Terra, Kirk reuniria sua antiga tripulação (inclusive Spock, que havia largado a Frota e estava em Vulcano), e partiria para o espaço a fim de confrontar a misteriosa ameaça e salvar o planeta. Ah, esqueci de um detalhe: a tal força poderia ser simplesmente Deus.

A Paramount não gostou dessa "coisa de Deus" ("The God Thing") no roteiro e, surpresa, em agosto de 1975 Jornada nas Estrelas voltaria ao limbo.

Roddenberry não desistiu, e com a ajuda de seu assistente Jon Povill, outro roteiro foi criado. Dessa vez seria sobre uma linha de tempo alternativa, criada quando Scotty introduziu uma avançada tecnologia na Terra de 1937. O resultado é um futuro em que humanos são escravos de um computador central, e a Federação e Frota Estelar nunca existiram. A Enterprise deve voltar no tempo, encontrar Scotty e reparar o que ele fez. Ao final, a Enterprise é ajudada por uma "entidade de plasma", que na verdade é um ser humano vindo do futuro desta linha do tempo. Novamente o roteiro não foi aceito, mas a Paramount e Roddenberry continuavam atrás de uma boa história. Para isso Gene recrutou os escritores John D.F. Black, Robert Silverberg e até Harlan Ellison, "brigado" com Gene desde que seu roteiro para o episódio da Série Clássica "The City on the Edge of Forever" foi reescrito.

Enquanto a procura continuava, o mundo de Jornada recebeu boas notícias: o ônibus espacial. O primeiro ônibus espacial (space shuttle) construído nunca foi destinado para o espaço, e sim para testes na atmosfera. Seu nome seria Constitution, mas, após milhares de cartas de fãs de Jornada endereçadas à Nasa e à Casa Branca, em 17 de setembro de 1976, quando o ônibus foi apresentado, o nome era outro: Enterprise.

Ao mesmo tempo em que Jornada voltava à mídia graças ao Enterprise, a Paramount confirmava a produção do primeiro longa-metragem da série, "Planeta de Titãs", orçado em US$ 7,5 milhões e com Philip Kaufman escolhido para ser o diretor. Os esboços estavam por conta de Ralph McQuarrie, que tornaria-se famoso ao criar naves para outro filme passado no Espaço: "Star Wars". McQuarrie criou uma nova Enterprise, com traços que lembram o star-destroyer de Darth Vader.



Com o filme começando a adquirir vida, a Paramount não conseguiu um acordo para William Shatner voltar a interpretar James Kirk. As primeiras versões do roteiro de "Planeta de Titãs" passaram a contar com a ausência de Kirk. Com a dificuldade apresentada, a Paramount aceitou a proposta de Shatner e o capitão finalmente passou a fazer parte do projeto.

A trama de "Planeta dos Titãs": a Federação e os Klingons estão em disputa por um misterioso planeta que pode ser o lar dos Titãs, uma raça que todos acreditam ser apenas uma lenda. Durante o conflito Klingon/Federação, o planeta é sugado por uma "fenda espacial". A Enterprise vai atrás do planeta, e emerge na órbita da Terra, porém na pré-história. A tripulação acaba dando uma de "monolito negro de 2001", mudando a história da Terra graças à sua interação com os humanóides pré-históricos que lá estavam (cadê a primeira diretriz?). No final é revelado que a tripulação da Enterprise são na realidade os "Titãs", aqueles que aceleraram a evolução na Terra. 

Em abril de 1977, a Paramount recusou o roteiro. O diretor Kaufman reuniu-se com os roteiristas e reescreveu a trama, que foi novamente recusada em 8 de maio de 1977, enterrando de vez o projeto de filme de cinema de Jornada. Neste ponto, a orçamento estava em US$ 10 milhões e pré-produção já havia começado. A Paramount negou-se a dar maiores explicações, mas sabe-se que a estréia de "Star Wars" desmotivou os executivos de estúdio. Enquanto Jornada baseava-se em uma série que aos poucos foi conquistando seu espaço, "Star Wars" havia chegado do nada e mudado tudo. Era difícil competir. Logo, com a pré-produção pronta porém sem uma bom roteiro, para não ter prejuízo, a Paramount decidiu cancelar o projeto. 

Mas o estúdio sabia o que tinha em mãos: uma série conhecida e amada por muitos, de valor comercial muito grande. Jornada poderia não estrear na telona, mas voltar para a telinha.


A série que nunca houve

O anúncio oficial foi feito em 10 de Junho de 1977. A Paramount chamou a imprensa e comunicou: iria lançar a quarta rede de televisão americana de âmbito nacional (as três redes até então eram a NBC, CBS e ABC) e a âncora de sua programação seria uma nova série de Jornada nas Estrelas, de nome "Jornada nas Estrelas - Fase II" ("Star Trek - Phase II").

O episódio-piloto de duas horas de duração seria exibido em fevereiro de 1978, e os episódios seriam semanais. A reação de Hollywood foi de curiosidade, já que um estúdio ter sua própria rede de televisão fazia sentido, mas tentar encarar as três grandes NBC, CBS e ABC era loucura.

Gene Roddenberry estava radiante. Após cinco anos de promessas e decepções, Jornada voltaria! O produtor seria Robert H. Goodwin, que no início foi um pouco relutante em aceitar o cargo, já que não estava familiarizado com o mundo de Jornada. Por outro lado, Matt Jefferies, o diretor de arte da Série Clássica, estava de volta.



Ainda não havia nenhum roteiro para o episódio-piloto, mas Gene não abria mão de utilizar elementos de "The God Thing". Sobre a Enterprise, Roddenberry pediu que Jefferies apenas atualizasse a nave, e não a mudasse complemente, como Ralph McQuarrie propôs.

Uma das diferenças entre a série original e a Fase II estava na melhoria das condições de trabalho. Para se ter uma idéia, a Enterprise da Série Clássica foi construída com uma variedade de materiais (madeira, alumínio), e a nova nave seria construída apenas com fibra de vidro, seria maior, mais detalhada e muito mais fácil de se trabalhar.

Enquanto isso Gene corria atrás de pessoal para produção e dos atores. Com a certeza de que haveria além do piloto pelo menos 13 episódios confirmados, que ator diria não a oportunidade de voltar ao cenário da TV? Bem, Leonard Nimoy (Spock) o fez, já que seu relacionamento com Roddenberry nunca foi dos melhores. Gene chegou a propor que Nimoy trabalhasse apenas no episódio-piloto e em onze episódio dos treze já confirmados, com dois episódios de folga. Nimoy não aceitou. Trabalhar em Jornada não fazia mais partes dos planos. Jornada nas Estrelas retornaria, mas sem seu principal personagem.

Para suprir a ausência de Spock, Gene criou um personagem: Xon (pronuncia-se "Zahn"), um jovem Vulcano oficial de ciências. Roddenberry aproveitou o embalo e resolveu introduzir mais um personagem, desta vez graças a William Shatner. O salário de Shatner para o episódio-piloto e para os treze episódios seguintes era muito alto, e, dependendo da receptividade financeira que a Fase II tivesse, talvez Kirk fosse relegado a aparecer apenas em alguns episódio como convidado especial, ou quem sabe, se as coisas ficassem difíceis, até poderia ser morto. Para substituí-lo se fosse necessário, foi criado o comandante Willard Decker, que, por enquanto, seria o primeiro-oficial de Kirk.

Um mês após a conferência de imprensa onde a Paramount anunciou a Fase II de Jornada, a pré-produção da série começaria. William Ware Theiss, o criador dos uniformes da Série Clássica, já estava criando novos uniformes e a equipe de produção já tinha praticamente prontos novos feisers de alumínio, com o mesmo desenho das antigas armas da Série Clássica, porém mais bonitos e detalhados. A "bíblia" da série estava pronta, e as instruções para os roteiristas dos novos episódios eram as seguintes:



A Nave

Com suas modificações e atualizações, a USS Enterprise é a maior e mais moderna nave da Frota Estelar. Sua tripulação será de 430 pessoas, metade sendo do sexo feminino.

Armamento

O poder de fogo da Enterprise continua sendo os bancos de feisers, porém os novos feisers são mais poderosos do que na série original. Os disparos agora são emitidos através de uma estrutura principal na nave, e não na parte superior da seção disco.

Equipamentos

O comunicador pessoal foi atualizado e tem mais funções agora. Pode ser anexado ao tricorder para transmitir informações diretamente do planeta para os computadores da Enterprise. A tela principal na ponte de comando não tem mais o aspecto de uma enorme televisão, pois agora ela é oval e holográfica.

Outras mudanças

No geral, a atmosfera a bordo da Enterprise será mais confortável do que antes, afinal, a nave é o lar de 400 pessoas. Haverá mais plantas exóticas de outros planetas, e as vestimentas não serão restritas apenas aos uniformes de serviço.

Agora os esforços eram para criar o roteiro do episódio-piloto, que seria intitulado "In Thy Image". Mas as coisas ainda mudariam muito para Gene & cia. nos próximos meses daquele ano de 1977.

A seguir: Um piloto para a série