Ciência Hoje
abril de 2006

O espaço, a fronteira final...

Por que o homem anseia conquistar o espaço? Qual é a importância da exploração espacial? Vale a pena enviar humanos para outros mundos? Chegaremos em um futuro próximo a colonizar o espaço? Estas são algumas das perguntas que o jornalista científico paulistano Salvador Nogueira tenta responder em seu livro. Com uma linguagem simples, direta e bem-humorada, ele nos conduz através do percurso da humanidade desde os primórdios da pesquisa astronômica, passando por Galileo Galilei (1564-1642), Johannes Kepler (1571-1630) e Isaac Newton (1642-1727), até chegar à era espacial. Expõe as idéias pioneiras de Konstantin Tsiolkovsky (1857-1935) e Vernher von Braun (1912-1977), os pormenores do programa Sputnik e das missões Apollo, as diferentes estratégias adotadas pela Rússia e pelos Estados Unidos que levaram à construção da estação MIR e ao desenvolvimento do ônibus espacial, e nos explica como a junção desses dois empreendimentos acabou concretizando o surgimento da Estação Espacial Internacional.

Mais adiante, o autor nos introduz aos principais resultados das missões espaciais, inclusive as mais recentes, dirigidas aos diversos corpos do sistema solar. Comenta os principais projetos de sondas interplanetárias que estão sendo desenvolvidos, e nos confronta com as perspectivas científicas da exploração do espaço para os próximos anos. Aborda o problema da colonização de outros mundos, começando pela Lua, discutindo as vantagens econômicas que isso pode oferecer para a humanidade em um futuro próximo. A possibilidade de enviar humanos para Marte e de utilizar a experiência para uma colonização global do sistema solar é apresentada sob uma perspectiva pragmática, analisando o papel que os robôs poderiam cumprir na empreitada. No final, Nogueira nos convida a refletir sobre a possibilidade das viagens interestelares e a exploração de outros sistemas planetários em um futuro indefinido.

Desprovido do tom puramente jornalístico, o autor propõe um diálogo informal com o leitor, cheio de referências históricas e conceitos científicos, mas sem cair na mera atitude descritiva normalmente encontrada nos livros de divulgação científica. Surpreende particularmente sua capacidade para introduzir ou explicar detalhadamente alguns problemas complexos de astronomia dinâmica e astrofísica em termos perfeitamente acessíveis ao leitor leigo, mas sem por isso perder o rigor científico dos conceitos envolvidos, como freqüentemente acontece no âmbito do jornalismo científico. Se o leitor procurar no livro por erros históricos ou científicos não vai conseguir achar -- exceto pelo fato de que, contrariamente ao que afirma o autor, Clyde Tombaugh (1906-1997) descobriu Plutão por acaso e não baseado nas predições erradas de Percival Lowell (1855-1916).

Entre outras coisas, o livro nos mostra como um programa espacial bem estruturado pode, por um lado, ajudar a que não acabemos extintos pela queda de um asteróide na Terra, e, por outro lado, acelerar a nossa extinção ao ser utilizado com fins bélicos. Também nos mostra como o espaço pode oferecer lucro econômico, além do evidente lucro científico, através de projetos que visam, por exemplo, explorar o turismo espacial. O autor deixa transvazar seu entusiasmo ao opinar sobre o futuro da exploração e colonização espacial, mas mantendo uma postura equilibrada e, em alguns casos, até conservadora se comparada com algumas idéias arrojadas que circulam no âmbito científico.

Cada assunto tratado no livro é sempre complementado com diversos depoimentos de reconhecidos cientistas, produto das entrevistas feitas pelo autor ao longo dos últimos anos, o que contribui para reforçar as idéias e dá ao livro um caráter documentário. Porém, cabe aqui criticar o fato de que quase todos esses depoimentos vêm de cientistas dos Estados Unidos e, apesar da certa liderança que esse país possa ter na exploração espacial, surpreende um pouco a falta de heterogeneidade nesse ponto, particularmente em um livro escrito por um autor latino-americano.

Resulta curioso o fato de que quase todos os capítulos são autosuficientes, sendo possível lê-los de forma independente, e no entanto acabam formando um conjunto harmônico que segue uma linha de raciocínio bem definida. Em suma, trata-se de um livro ameno, interessante, equilibrado, e certamente recomendável para qualquer um que deseje entender a importância e transcendência da astronomia em geral e da ciência espacial em particular.


Fernando Roig
Coordenação de Astronomia e Astrofísica, Observatório Nacional (RJ)