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                    Francisco, Terra  Faz 
                  pouquíssimo tempo, revi  "Jornada nas Estrelas IV: A Volta 
                  Para Casa" na companhia de alguns queridos amigos, depois 
                  de um churrasco de domingo. Neste filme existe a cena em que 
                  os tripulantes da Enterprise original chegam ao século 20, numa 
                  ave-de-rapina Klingon. Tão logo eles visualizam o seu destino, 
                  Sulu, feliz, profere as seguintes palavras “San Francisco. Eu 
                  nasci lá!”. Daí, complemento: “Eu também!”
 
 Isto é, em parte, uma brincadeira, 
                  porque nasci no bairro carioca de São Francisco Xavier, na Zona 
                  Norte, entre o Méier (onde moram Alfredo e Chacal -- que fazem 
                  uma feijoada sem igual!) e a minha querida Mangueira, ao lado 
                  do Maracanã e da Vila Isabel (terra de Orestes, Martinho e Noel). 
                  Aí, na rua de mesmo nome, está a universidade onde me formei 
                  e trabalho. No centro do Rio, no Largo de São Francisco, fiz 
                  pós-graduação. Uma das minhas avós também se chamava Francisca 
                  e meu compositor preferido é Francisco Buarque. Olha que nem 
                  sou católico, mas gosto muito de São Francisco de Assis. Se 
                  tivesse nascido nos EUA, também gostaria de ser de São Francisco, 
                  uma cidade que, de certa forma, é parecida com o Rio de Janeiro, 
                  porque, apesar de seus problemas, possui características singulares.
 Quando Kirk e sua turma desembarcam na “paranóica” San Francisco 
                  do século 20, ela é bem diferente da cidade do século 23 que 
                  abriga o quartel general da Frota Estelar. Entretanto, é bom 
                  lembrar que tal fato é uma homenagem de Gene Roddenberry à cidade 
                  que tem uma grande importância nacional e internacional.
 
 Os espanhóis que fundaram o vilarejo original em nome da Coroa, mudaram o nome da localidade, dado pelos nativos:
            “Yerbabuena”. Talvez, porque pegasse mal, e alguém confundisse com alguma outra planta de cheiro e sabor envolvente, com efeito alucinógeno, não é mesmo?! A marcha para o Oeste, que dizimou vários índios, foi o motivo da colonização que fundou a cidade em 1850, às margens do Pacífico. Ao longo do tempo, São Francisco se tornou uma cidade portal entre o Oriente e o Ocidente, o que contribuiu para criar um espaço de grande variedade cultural, onde vários povos, de costumes e valores distintos se encontraram e se encontram até hoje. Esta é uma boa inspiração para o IDIC atribuído aos
            Vulcanos. Por causa da influência da cultura oriental, a cidade foi um dos berços do movimento “hippie” de contestação contracultural à civilização industrial de consumo de massa, que produz um modo de vida excessivamente consumista, destruidor do meio-ambiente e causador de profundas desigualdades sociais e guerras entre os países.Os jovens alternativos dos anos 60 contestaram essas coisas, com os lemas: “Faça amor, não faça a guerra” , “É proibido proibir”. Isto explica porque Spock é apresentado à doutora Gillian como um cara meio doidão, ex-aluno da universidade californiana de
            Berkeley.  
 San Francisco tem uma outra peculiaridade importante. É uma 
                  cidade que pode desaparecer do mapa por causa da falha geológica 
                  de Santo André, responsável por causar vários terremotos na 
                  região e temores à sua população, como foi o caso de 1906. Por 
                  esta razão, discordo de Harlam Elison, que pôs Nova York no 
                  episódio da  Série Clássica “The City on the Edge on Forever”, 
                  como cenário para a visita dos tripulantes da Enterprise. No 
                  meu entender, este título tem mais a ver com San Francisco.
 
 Outro fator importante daria justamente à essa cidade tal título 
                  por causa da história do Mundo. Como já disse aqui no  TB 
                  alguma vez, foi em San Francisco que redigiram a Carta das Nações 
                  Unidas nos anos 40, dando origem à ONU e à sua Declaração Universal 
                  dos Direitos do Homem, base de qualquer sociedade moderna que 
                  queira viver segundo os ideais da liberdade e da justiça. Tanto 
                  para nós mesmos, como para quaisquer outros que venhamos conhecer, 
                  esse documento é fundamental para entender quem somos, donde 
                  viemos e para onde poderemos ir como povo de um planeta historicamente 
                  acometido por guerras e outras catástrofes sociais. De todo 
                  modo, ele é um indicador de que a humanidade poderá vir a ser 
                  melhor do que tem sido, conforme demonstra a utopia da saga 
                  criada por Roddenberry. Só para lembrar, San Francisco foi há 
                  pouco uma das principais cidades dos EUA e do planeta que patrocinaram 
                  os protestos contra a invasão do Iraque, que temos visto no 
                  dia-a-dia como um enorme problema diplomático-militar para Bush 
                  e seus aliados.
  
 San Francisco é também muito conhecida pois é onde os grupos 
                  homossexuais passaram a conquistar espaços importantes para 
                  as suas reivindicações, empunhando a bandeira arco-íris. Hoje, 
                  isso tem se tornado mais comum, inclusive no Brasil, com as 
                  paradas comemorativas do “Orgulho Gay”, onde expressam livremente 
                  a sua opção. Concordemos ou não com eles, somos levados a aceitar 
                  os seus direitos.
 
 De volta à ficção, uma das cenas mais chocantes em Jornada 
                  nas Estrelas, antecipando a realidade de 11 de setembro 
                  de 2001, foi a aparição da destruição da ponte Golden Gate, 
                  símbolo da cidade, por causa de um ataque inconseqüente dos 
                  Breen contra Federação, na guerra ao Dominium, como vimos em 
                  DS9. O coração da Frota Estelar foi atingido para causar 
                  pânico e terror. A imagem na tela tem poucos segundos mas, seu 
                  impacto no curso da situação é decisivo, a ponto de Sisko e 
                  seus comandados procurarem se mobilizar mais ainda para destruir 
                  os inimigos. A vida passada na bucólica San Francisco do século 
                  19 é apresentada no episódio duplo "Time's Arrow", 
                  da  Nova Geração, onde Picard e sua turma voltam no tempo 
                  perseguindo perigosos alienígenas e conhecem tanto Guinan como 
                  o famoso escritor Samuel Clemens (Mark Twain).
 
 Em vários outros episódios da  
                  Nova Geração, DS9,  Voyager ou  Enterprise 
                  essa cidade é lugar de muitas cenas, principalmente passadas 
                  na sede da Frota Estelar e da sua Academia. Nos filmes da  
                  Série Clássica, apenas o quinto não retrata alguma ação 
                  na cidade. Por aí podemos ver que não há outro lugar terrestre 
                  com maiores referências no universo da saga do que San Francisco. 
                  Várias naves, assim como a própria Enterprise original, foram 
                  construídas no estaleiro que leva seu nome. 
 Os brasileiros têm uma lembrança especial da cidade porque ela foi uma das sedes da seleção de futebol na Copa do Mundo de 1994. O pessoal saiu lamentando de lá por causa da boa receptividade aos nossos patrícios. Para mim,
            "Frisco", como é chamada pelos seus habitantes e visitantes, é meio um caso mal resolvido, do tipo "nunca te vi, sempre te amei". Talvez um dia poderei passar um tempo lá, como fez um amigo nosso. Ele me disse que é inesquecível. Não é mesmo, Antônio?!
 
 Como diz a canção: "I left my heart in San Francisco..."
 
 Cláudio 
                  Silveira escreve 
                  regularmente sobre os filmes com exclusividade para o Trek 
                  Brasilis 
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