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               Capítulo 
                3  
                Câmeras no século 24 
                Roddenberry 
                volta a colocar a franquia na televisão, mas será 
                que ele sabe como ela funciona na década de 80? 
                 
                “O 
                século 24 está prestes a começar”. Com esta frase, o chefe de 
                televisão da Paramount, Mel Harris, deu início à campanha publicitária 
                para o lançamento de “A Nova Geração”. 
                 
                Simultaneamente, nos estúdios da Paramount, este moto era uma 
                realidade. Com o conceito definido e atores escalados, a produção 
                do primeiro episódio inédito de uma série de Jornada nas Estrelas 
                em 18 anos estava prestes a começar. E, com isto, um desafio a 
                todos os envolvidos: produzir 26 episódios de uma série de ficção 
                científica dentro do prazo e orçamento restritos de uma produção 
                televisiva. Mas, como a própria definição do episódio piloto, 
                a jornada não seria simples. 
                 
                Fairpoint 
                 
                 Gene 
                Roddenberry e D.C. Fontana haviam, para o episódio piloto, desenvolvido 
                toda a trama envolvendo o mistério da estação Farpoint. O rascunho 
                original de Fontana era mais voltado à ação, com uma criatura 
                alienígena capturada por uma raça simiana conhecida como “Annoi”. 
                 
                Os Annoi forçavam a criatura a criar uma plataforma orbital em 
                torno de si, simultaneamente alimentado a criatura apenas o bastante 
                para sua sobrevivência. Neste rascunho, duas naves da Federação, 
                a Enterprise e a Starseeker, iriam até o planeta, mas a Starseeker 
                seria destruída pelos Annoi. Este rascunho original previa um 
                episódio piloto com uma hora de duração. 
                 
                Foi então que a Paramount comunicou a Roddenberry o seu desejo 
                de que o episódio piloto, afinal, tivesse a duração 
                de duas horas. Sentindo-se confortável ao voltar para o comando 
                de uma série de TV, Roddenberry negou-se terminantemente a produzir 
                um piloto com duas horas. Enquanto este impasse perdurou, continuou-se 
                a trabalhar num roteiro de uma hora de duração.  
                 
                Quando Gene finalmente entregou os pontos, havia pouco tempo para 
                se ajustar e expandir o roteiro do episódio piloto. Ele, então, 
                criou uma segunda trama, que pudesse se desenrolar em paralelo 
                com o mistério de Farpoint – criando, no processo, Q. Algumas 
                outras cenas ainda foram incluídas, de modo a se conseguir a duração 
                necessária ao episódio – entre elas, encontram-se as longas seqüências 
                de separação e junção da seção disco da nave, e a visita do Almirante 
                McCoy. 
                 
                Com o roteiro em seus estágios finais, faltavam poucos detalhes 
                para as filmagens, programadas para terem início em 01/06/1987, 
                apenas nove meses após a aprovação do conceito inicial pela Paramount. 
                O principal, porém, dizia respeito à aparência de alguns personagens. 
                 
                 Michael 
                Westmore, maquiador vencedor do Oscar de 1981, foi contratado 
                para cuidar de todos os alienígenas da série, e um certo andróide. 
                Para Worf, o primeiro klingon a ser visto trabalhando na ponte 
                de uma nave da Federação, a tarefa era simples. “Eles me mostraram 
                uma série de vídeos com todos os klingons mostrados nos filmes”, 
                relembra Westmore, “e o que eu pude perceber foi que não haviam 
                dois klingons iguais! Assim, pude criar minha própria visão dos 
                klingons, a partir do que havia visto nos filmes”. O desafio, 
                porém, era tornar o processo de maquiagem o mais curto possível. 
                Westmore desenvolveu o rosto de Worf em três peças separadas: 
                uma carapuça que incluía a “testa de tartaruga” típica dos klingons 
                e os cabelos, um nariz postiço e dentes falsos. 
                 
                 Deste 
                modo, o processo de maquiagem levava “apenas” cerca de 2 horas 
                e meia – criando para Dorn a rotina de chegar ao set às 5 horas 
                da manhã. Data, porém, mostrou-se um assunto mais complicado. 
                Roddenberry simplesmente não se decidia quanto ao que desejava 
                para sua aparência. Foram necessários 24 testes de maquiagem antes 
                de se chegar ao já conhecido prateado de sua pele, o que resultou 
                em histórias interessantes. Rick Berman relembra que “teve de 
                conversar muito com Gene para fazê-lo desistir de a série 
                ter um andróide cor-de-rosa!” O tom prateado de sua pele, eventualmente, 
                foi completado com a adição de lentes de contato amarelas. 
                 
                Se a cor dos olhos de Data foi o menor dos problemas de maquiagem 
                para Brent Spiner, outro utensílio ótico mostrou-se mais complicado: 
                o V.I.S.O.R. usado por La Forge. Por três meses o departamento 
                de arte da série procurou desenvolver um artefato que fosse ao 
                mesmo tempo avançado e facilmente reconhecível pela audiência. 
                LeVar Burton, porém, dizia que “todos os protótipos se pareciam 
                apenas com óculos modernos”. Finalmente, Mike Okuda trouxe um 
                dia para o estúdio um prendedor de cabelo de sua namorada, dizendo 
                que daria um ótimo V.I.S.O.R. para Geordi.  
                 
                Partindo da idéia de Okuda, Rick Sternbach eventualmente criou 
                o modelo visto ao longo das sete temporadas da série. Com o início 
                das filmagens, a produção finalmente colocou todas suas engrenagens 
                para girar. A teimosia de Roddenberry com relação à duração do 
                episódio, porém, teria seu preço: o episódio ficou curto demais. 
                Coube a Bob Justman e os editores da série esticar ao máximo possível 
                o episódio, tornando-o, em alguns momentos, lento demais. 
                 
                O bom e velho Gene 
                 
                Roddenberry trouxe da Série Clássica a fama de reescrever 
                todos os roteiros da série. Na “Nova Geração” não foi diferente: 
                virtualmente todos os roteiros passavam pela mão do Grande Pássaro, 
                provocando inevitavelmente conflitos com a equipe de roteiristas. 
                Mas Roddenberry achava fundamental que todos os episódios fossem 
                fiéis à sua visão de Jornada, e durante a primeira temporada, 
                quando a série ainda estava encontrando o seu tom, o método encontrado 
                por ele para garantir que esta visão chegasse à tela era reescrevendo 
                todos os roteiros. 
                 
                “Houve muitos roteiros reescritos, e isso feriu alguns egos”, 
                relembra Maurice Hurley, que eventualmente se tornou produtor 
                durante a primeira temporada.“Você suspende seus sentimentos e 
                suas crenças e se adequa à visão de Gene – ou você terá seu roteiro 
                reescrito”. Mas as intervenções de Gene não eram a única causa 
                de atrito entre os roteiristas. “No começo, haviam muitas idéias 
                sendo incluídas em cada roteiro. Havia uma tendência de se fechar 
                um episódio muito rapidamente. Muita coisa no pacote, tentando 
                faze-lo transbordar”, relembra Hurley.  
                 
                Com isso, iniciou-se um padrão que perduraria até a terceira temporada 
                da série: as constantes substituições de roteiristas. David Gerrold, 
                veterano da série clássica responsável pelo roteiro do episódio 
                “The Trouble with the Tribbles”, foi o primeiro a abandonar 
                o barco, antes mesmo de as filmagens do episódio piloto terem 
                início. Gerrold alegou que “promessas não haviam sido cumpridas” 
                como justificativa para deixar a série, referindo-se a um episódio 
                que escrevera como uma alegoria à epidemia de AIDS. Pouco depois, 
                foi a vez de Dorothy Fontana demitir-se, inconformada com as constantes 
                revisões dos roteiros. Com isso, e as saídas de Ed Milkis e Bob 
                Justman, o único membro da série clássica a permanecer na produção 
                de “A Nova Geração” foi o próprio Roddenberry. Com isso, 
                Rick Berman acabou sendo promovido... e o resto é história. 
                 
                Simultaneamente, Roddenberry lutava para manter intacta a sua 
                filosofia de que os personagens principais da série não entrariam 
                em conflito entre si – o que se mostrava uma grave dificuldade 
                para os roteiristas. Outros problemas que começariam a aflorar 
                em setembro, com a estréia da série, seriam a enxurrada de críticas 
                as tramas dos episódios, que muitas vezes relembravam reaproveitamento 
                de episódios da série clássica. Os casos mais claros eram o segundo 
                episódio da série, “The 
                Naked Now” (refilmagem do episódio da série clássica “The 
                Naked Time”), e o episódio “Where 
                No Man Has Gone Before” (que foi uma adaptação do romance 
                “The Wounded Sky”, que Diane Duane escrevera com os personagens 
                da série clássica).  
                 
                Os roteiristas passariam a temporada inteira tentando encontrar 
                uma identidade para a série, sem sucesso. E os fãs notavam esta 
                inconsistência e uma certa falta de continuidade, exemplificada 
                pela longa fila de engenheiros chefes mostrados ao longo da temporada, 
                e mesmo alguns personagens surgindo em mais de uma função na nave 
                ao longo da série. Simultaneamente, Deanna Troi conseguia pouca 
                ou nehuma atenção no roteiro, e seu romance com Riker foi paulatinamente 
                sendo esquecido. 
                 
                “Vocês estão me pagando US$ 2.000 por hora apenas para ficar 
                sentado aqui” 
                 
                Se no campo das histórias a série encontrava dificuldades para 
                encontrar seu tom, a equipe de produção rapidamente adequava as 
                necessidades da série aos prazos e orçamento apertados.  
                 
                 Inicialmente, 
                optara-se por adotar a mesma sistemática da série clássica para 
                efeitos especiais: a criação de uma biblioteca de imagens, começando 
                com as tomadas criadas pela ILM para o episódio piloto, e com 
                uma pessoa a cargo da supervisão e criação de novos efeitos. Robert 
                Legato, porém, no cargo de coordenador de efeitos especiais, rapidamente 
                ficou claro que esta estratégia não daria certo. “O plano era 
                iniciar com a biblioteca de imagens criadas pela ILM, e adicionar 
                cerca de cinco tomadas a cada episódio”, relembra Legato. 
                 
                O que ele descobriu, porém, é que seria muito mais rápido – e 
                conseqüentemente mais barato – criar as tomadas especificamente 
                para cada episódio. O uso de uma biblioteca de imagens resultava 
                em se perder um longo tempo ajustando uma determinada tomada às 
                necessidades específicas de cada episódio. Por exemplo, mostrar 
                a Enterprise em órbita de um planeta significava substituir um 
                planeta utilizado em um episódio anterior pela imagem do planeta 
                necessário ao episódio da semana. A mesma sistemática era válida 
                para a Enterprise encontrando uma outra nave, uma nebulosa, e 
                por aí vai. “Se você quer fazer certo e fazer de modo efetivo, 
                o certo é filmar exatamente aquilo que você precisa. Dá menos 
                trabalho e fica dramaticamente e visualmente melhor”, relembra 
                Legato. 
                 
                O modo de se realizar os efeitos, porém, era o menor de seus problemas. 
                Com cada episódio exigindo cerca de oitenta tomadas de efeitos 
                especiais, Legato se viu cada vez mais atolado em trabalho, quase 
                o levando a exaustão. Sua rotina incluía trabalhar a noite toda 
                nas tomadas realizadas durante o dia – deixando tudo pronto para 
                que as câmeras voltassem a funcionar pela manhã. Com o excesso 
                de trabalho, rapidamente a unidade de efeitos especiais começou 
                a estourar o orçamento. Chamado a uma reunião para discutir o 
                assunto, Legato rapidamente conseguiu mostrar seus problemas ao 
                afirmar que “apenas para eu ficar sentado nesta reunião está lhes 
                custando US$ 2.000 por hora”. A partir de então, a série contaria 
                com dois supervisores de efeitos – o próprio Legato e o recém 
                contratado Dan Curry.  
                 
                Uma outra mudança de paradigma envolvia as tomadas de efeitos 
                especiais que incluíam ao atores – as famosas tomadas de tela 
                azul. Ao longo dos primeiros nove episódios, o diretor de cada 
                episódio era responsável por coordenar as filmagens em tela azul. 
                Porém, por não conhecer as sistemáticas necessárias para a condução 
                dos efeitos, o diretor acabava filmando estas tomadas de modo 
                que atrapalhava o trabalho da equipe de efeitos. Deste modo, legato 
                convenceu a produção a criar uma segunda unidade de filmagem, 
                que seria responsável exclusivamente pelas tomadas de efeitos 
                especiais. 
                 
                AQUELA GOSMA PRETA...  
                 
                 Se 
                no campo técnico a produção da série cada vez mais era uma máquina 
                bem lubrificada, os problemas no desenvolvimento dos roteiros 
                começavam a cobrar o seu preço. Denise Crosby, insatisfeita com 
                o desenvolvimento dado a seu personagem, pediu amigavelmente aos 
                produtores da série para providenciarem a sua saída. A decisão, 
                afinal, foi que seu personagem seria morto – o primeiro personagem 
                regular de Jornada a morrer de forma definitiva. Enquanto 
                a equipe de roteiristas não chegava a uma conclusão sobre como 
                realizar a sua partida, Roddenberry deu sua palavra final – Tasha 
                teria uma morte “à la camisa vermelha”. Em outras palavras: o 
                segurança presente no planeta alienígena sofreria uma morte rápida. 
                 
                 
                Se por um lado o modo como sua personagem morre seria uma tanto 
                quanto sem glamour, sua cena final na série, porém, compensaria 
                pela falta de desenvolvimento de seu personagem na série. Com 
                uma mensagem holográfica gravada, Tasha se despede de seus amigos 
                – cena que provocou muitas lágrimas no set.  
                 
                Problemas com roteiro ou não, a primeira temporada da série deixou 
                a Paramount feliz. A audiência era boa – a maior no cobiçado segmento 
                “homens entre 18 e 49 anos" – e a resposta dos fãs era entusiástica. 
                Pesquisas realizadas pelo estúdio apontavam uma aprovação de noventa 
                por cento entre os fãs. 
                 
                A segunda temporada estava garantida. Bastava, agora, a série 
                encontrar o seu rumo – o que não seria fácil. 
               
                  
                 
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