TNG 5×23: I Borg

Episódio dá novos horizontes aos borgs a partir de uma perspectiva individual

Sinopse

Data estelar: 45854.2

Picard envia um grupo avançado para investigar os destroços de uma pequena nave acidentada em uma lua. Eles encontram apenas um sobrevivente – um borg adolescente. O capitão inicialmente não demonstra sinais de querer ajudá-lo, mas Beverly acaba convencendo-o a transportá-lo a bordo, apesar do risco de que sua visita acabe alertando outros borgs da presença da Enterprise.

De volta a bordo, Beverly desconecta os sinais que permitem ao borg se comunicar com o resto da Coletividade. Troi sente raiva em Picard, que foi temporariamente assimilado pelos borgs quase dois anos antes, mas ele se recusa a discutir seus sentimentos. Contudo, eles acabam ficando transparentes quando Beverly descobre que os implantes cerebrais de seu paciente estão danificados e pede a Picard autorização para que Geordi construa outros. Picard percebe que, se Geordi conseguir mexer com a estrutura de comando do cérebro desse borg, pode destruir a raça inteira – que está interconectada em rede.

Beverly fica chocada ao saber que Picard pretende usar a criatura que ela está tentando curar com fins genocidas. Entretanto, o resto da tripulação concorda com o capitão, citando a história de guerra dos borgs contra a Federação. Mais tarde, o borg acorda confuso e desorientado, após ser desconectado da mente coletiva.

No laboratório de ciências, Geordi e uma relutante Beverly tentam se comunicar com o borg para que o engenheiro possa aprender mais sobre as rotinas de comando em seu cérebro. Conforme eles conversam, descobrem que este borg é inofensivo e inocente – diferente dos outros que eles haviam encontrado. Eles dão a ele o nome de Hugh, e Geordi começa a repensar a ideia de programar a criatura para destruir sua espécie. Quando ele diz isso a Guinan, ela reage com medo e raiva. Mais tarde, Picard e Riker descobrem que uma nave de resgate borg está a caminho.

Guinan visita Hugh e, de forma agressiva, conta a ele como os borgs destruíram sua raça, mas a criatura reage de forma humilde e compassiva. Em seguida, Geordi conta a Picard que está em dúvida sobre a decisão de usar Hugh para destruir os borgs, mas o capitão segue convicto – até Guinan convencê-lo a falar com Hugh. O borg imediatamente reconhece Picard como Locutus, a identidade que o capitão assumiu quando foi assimilado pelos borgs. Mas, diferentemente do resto dos borgs, Hugh está demonstrando emoções humanas.

Persuadido por esse encontro, Picard abandona seu plano de destruir os borgs. Em vez disso, ele oferece a Hugh a escolha de retornar ao ponto da queda para ser resgatado ou permanecer a bordo da Enterprise permanentemente. Hugh fica tentado pela oferta de seguir com seus novos amigos, mas opta por voltar ao local do acidente para garantir a segurança da nave. Ele troca tristes despedidas com o pessoal da Enterprise antes de Geordi devolvê-lo ao local da queda. Lá, ele diz a Geordi que não quer esquecer suas experiências após a reassimilação. Conforme Geordi assiste à reintegração de Hugh por um grupo borg, seu novo amigo olha para ele, dando a esperança de que, mesmo depois da volta à Coletividade, ele ainda vá se lembrar da amizade dos dois.

Comentários

Criatividade é a arte de pensar em coisas que normalmente só conseguimos imaginar depois que nos contam. Faz parte, portanto, de um talento que é manifestado muito mais de forma individual do que coletiva. Os borgs, raça que ofereceu os melhores inimigos durante A Nova Geração, trouxeram um grande desafio para Picard e sua tripulação, mas seguramente seus fortes não eram a individualidade e, por consequência, a criatividade.

Isso sem dúvida se traduzia em problemas para um roteirista à procura de uma história envolvendo os borgs. Seria muito fácil bolar uma grande aventura da Enterprise enfrentando seus mais temidos inimigos, mas o desafio de desenvolver personagens borgs estava além das perspectivas mais remotas – isso antes de “I Borg”.

O grande mérito deste episódio brilhante escrito por René Echevarria é mostrar que há vida além da camada “coletiva” dos borgs – e ele mostra isso não só para a tripulação da Enterprise, como também para a audiência. Desconectando um borg da Coletividade, ele nos choca ao revelar que os zilhões de assassinos sanguinários não passam de vítimas, tão aprisionadas e massacradas quanto os inimigos dos borgs.

Para Picard e Guinan, dois que odeiam os borgs por definição, o efeito dessa descoberta é devastador. A produtora Jeri Taylor certa feita disse que os borgs nunca mais poderiam ser olhados do mesmo modo depois de “I Borg”. E estava certa.

Embora episódios tenham sido feitos posteriormente levando Picard de volta à estaca zero com relação ao seu relacionamento com os borgs (vide o filme Jornada nas Estrelas: Primeiro Contato), este segmento é sem dúvida o que melhor expressa a angústia que existe nele – em que o desejo de vingança é muito maior que o discernimento para dar uma chance para desmistificar o inimigo como o mal encarnado (ou robotizado, como queira).

O episódio oferece mais uma chance de Beverly Crusher mostrar sua força de caráter e sua personalidade forte. La Forge também sai ganhando, e muito, aqui, ao ser o que primeiro estabelece um relacionamento de amizade com o recém-batizado Hugh. Mas o show fica por conta do trio Whoopi Goldberg (Guinan), Patrick Stewart (Picard) e Jonathan del Arco (Hugh).

A cena em que Guinan e Picard estão lutando esgrima é sensacional, pois a el-auriana mostra, de sua forma tipicamente inteligente e impactante, todo o seu repúdio à atitude (tomada a contragosto por Picard) de deixar o borg ser trazido a bordo. “Você sentiu pena de mim. Veja aonde isso o levou”, disse ela, dando o tom do episódio. Em resumo, a dúvida que passa pela cabeça dos tripulantes da Enterprise conforme o episódio se desenrola é: “Seriam os borgs dignos de pena?”

E a resposta que ele oferece é das mais intrigantes, salvando a pele desses grandes vilões: “Num plano coletivo, não. Num plano individual, sim.” Aprendemos aqui que os borgs não podem, por mais que seja conveniente pensar assim, ser vistos como uma única entidade. Uma vez desconectado da rede, um borg é capaz de sentimentos humanos tão nobres quanto os de um humanoide 100% biológico. (É um achado importante que reverberaria com grande potência sobretudo em Voyager, a partir da quarta temporada, com a introdução da personagem Sete de Nove.)

Além disso, há tensão de sobra por aqui. É especialmente interessante vermos nossos amigos de sempre como os “vilões”. Por mais odiosos que os inimigos sejam, nada justifica uma extinção em massa. O Picard genocida de “I Borg” está longe de ser o capitão ético, moral e justo que costumamos ver. É interessante vê-lo reverter à sua nobreza original com um tratamento de choque. A mesma coisa vale para Guinan.

Em resumo, um episódio impecável, que vale a pena ser visto e revisto à exaustão, trazendo sensibilidade e inteligência ao tratamento desses inimigos ferozes, mas tão difíceis de retratar de maneira inventiva. Se há alguma crítica cabível, ela vai ao cenário do planeta onde Hugh é resgatado, que, se passava na época em que o segmento foi exibido, nos antigos televisores de raios catódicos, infelizmente se revela pouco convincente em telas digitais, na remasterização do episódio em alta definição.

Avaliação

Citações

“Resistance… is not futile?”
(Resistir… não é inútil?)
Hugh a Guinan

Trivia

  • Após o sucesso de “The Best of Both Worlds”, a equipe de roteiristas estava buscando um meio de trazer os borgs de volta, mas sofrendo para lidar com um inimigo tão perigoso que quase destruiu a humanidade no último encontro.
  • A ideia para o episódio surgiu durante um retiro que os roteiristas fizeram no outono de 1991. O roteirista René Echevarria relembra: “Tive esse lampejo de inspiração: e se você revertesse o modo como olhamos os borgs? E se houvesse uma história íntima sobre um deles? Como esse único borg seria – por si mesmo?”
  • O título do episódio é uma alusão ao livro de Isaac Asimov, Eu, Robô, que por sua vez era uma referência ao livro de Robert Graves, Eu, Cláudio. Também faz uma rima com cyborg. No crédito em tela, não há vírgula: “I Borg”. Contudo, no roteiro, ela estava lá.
  • Jeri Taylor deu uma polida não creditada no roteiro.
  • Picard fica chocado quando Hugh usa o pronome “eu”, ao fim do episódio. Ocorre que o personagem usa “eu” bem antes, casualmente, na conversa inicial que tem com Crusher e La Forge. Ele pergunta: “Eu tenho um nome?” Echevarria reconhece o erro embaraçoso e disse que chegou a pegar o problema durante as filmagens, mas quando contatou Jeri Taylor a respeito a cena em questão já havia sido gravada.
  • Este foi o primeiro episódio dirigido por Robert Lederman. Também foi o primeiro segmento com os borgs a não ter uma trilha musical de Ron Jones. Jay Chattaway faz a trilha, e voltaria aos borgs com o episódio duplo “Descent”.
  • As filmagens se deram entre 6 e 16 de março de 1992, nos galpões 8, 9 e 16 da Paramount.
  • O figurinista Robert Blackman e o chefe de maquiagem Michael Westmore trabalharam duro para elevar a qualidade do visual do borg, adicionando um holograma no dispositivo ocular de Hugh que se tornaria comum mais adiante.
  • Jeri Taylor comparou Hugh ao personagem do filme Edward Mãos de Tesoura, caracterização que influenciou a escalação do ator Jonathan Del Arco (escolhido após quase 30 intérpretes fazerem audição para o papel) e a direção de Robert Lederman.
  • Del Arco era fã da Série Clássica e foi um dos atores a disputar o papel de Wesley Crusher. Quando o personagem foi dado a Wil Wheaton, Jonathan ficou tão sentido que se recusou a ver A Nova Geração até ganhar um papel como astro convidado.
  • Para “calibrar” a atuação, Del Arco e Lederman criaram uma escala de evolução pessoal do personagem, de mais borg para mais indivíduo. O diretor podia simplesmente pedir um número de um a dez para guiar o ator na performance.
  • O aglomerado Argolis, onde Hugh é encontrado, seria visitado de novo pela Enterprise-D em “True Q” e pela Defiant em “Behind the Lines”, de Deep Space Nine.
  • Rick Berman elogiou efusivamente Echevarria e Lederman pelo episódio. “Do minuto que vi a história me apaixonei por ela. As relações dramáticas são tão vívidas. Guinan, que vem de um povo destruído pelos borgs, Picard, que foi brutalizado e violado pelos borgs – ambos são colocados em uma posição de preconceito. Geordi e a dra. Crusher estão numa posição de terem a mente aberta e no fim simpática a este jovem, e o resultado final é uma série maravilhosa de relacionamentos e cenas maravilhosas entre Guinan e o borg. A escrita foi maravilhosa e as atuações, ótimas.”
  • Jeri Taylor proclamou-o “um clássico”. Jonathan Del Arco descreveu o roteiro como um dos melhores que já havia lido. Para Michael Piller, foi o favorito da temporada e “tudo que eu quero que Star Trek seja”.
  • A história de Hugh teria continuação no episódio duplo “Descent” e, décadas mais tarde, na primeira temporada de Picard, sempre interpretado por Jonathan Del Arco. O ator, uruguaio de nascimento, também fez uma ponta em Jornada nas Estrelas: Generations, como o klingon que grita para as irmãs Duras que a camuflagem foi ativada.

Ficha Técnica

Escrito por René Echevarria
Dirigido por Robert Lederman

Exibido em 11 de maio de 1992

Título em português: “Eu Borg”

Elenco

Patrick Stewart como Jean-Luc Picard
Jonathan Frakes como William Thomas Riker
Brent Spiner como Data
LeVar Burton como Geordi La Forge
Michael Dorn como Worf
Marina Sirtis como Deanna Troi
Gates McFadden como Beverly Crusher

Elenco convidado

Jonathan Del Arco como Hugh
Whoopi Goldberg como Guinan

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Edição de Maria Lucia Rácz
Revisão de Susana Alexandria

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