Deep Space Nine
Temporada 2

Análise do episódio por
Luiz Castanheira



 









 

MANCHETE DO EPISÓDIO
Melhor episódio da temporada mostra
estação nos tempos da ocupação

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Sinopse:

Data Estelar: 47282.5.


Em Bajor, numa casa sem energia para iluminação, a Bajoriana Pallra, viúva do Bajoriano Vatrik, contrata Quark para recuperar uma caixa guardada na antiga loja do casal em Deep Space Nine. 

Quark obtém a caixa, com o auxílio de Rom, mas não resiste à curiosidade e acaba abrindo-a, descobrindo uma lista com oito nomes Bajorianos. Pallra havia enviado um capanga, de nome Trazko, para ficar
de olho em Quark e, como o Ferengi não pode viver para revelar os nomes da lista, Trazko atira nele à queima-roupa e leva a caixa consigo. 

Enquanto Bashir tenta salvar a vida de Quark, Rom acaba confessando a Odo sobre a caixa e a lista. Quando Odo ouve que eles encontraram a caixa na antiga loja de Vatrik, cujo homicídio (ocorrido cinco anos atrás) Odo nunca solucionou, sua mente volta no tempo até o dia da morte de Vatrik e de como, no seu primeiro encontro com gul Dukat, o Cardassiano o convocou para investigar a morte do Bajoriano. No curso desta investigação (no passado), Pallra aponta uma Bajoriana, que ela jura que estava tendo um caso com seu marido. Seu nome: Kira Nerys.

A mente de Odo volta ao presente e Rom acaba se lembrando de um nome da lista: "algo parecido com Ches'so". Odo pede que Kira tente obter alguma informação sobre tal Bajoriano, e ele acaba por se lembrar que Kira naquela época negou ter matado Vatrik.

Odo vai a Bajor interrogar Pallra e ela nega saber qualquer coisa sobre tal lista e não dá nenhuma explicação razoável sobre a recente quitação da sua conta de energia. Kira traz informação sobre "Ches'sarro" e diz que ele foi morto na noite passada. Odo acha que Pallra foi responsável e se sente culpado.

Ele se lembra do seu primeiro encontro com Quark e de como ele conseguiu tirar do Ferengi a informação de que este havia aceito suborno de Kira pra fornecer um álibi a ela, exatamente na noite em que Vatrik foi morto. 

Através de suas investigações (no presente), envolvendo os registros das comunicações e movimentações financeiras de Pallra, Odo consegue reconstruir a lista e conclui que Pallra está chantageando os Bajorianos com nomes na lista, pois todos eram colaboradores no tempo da ocupação Cardassiana.

Ele se lembra de como Kira admitiu que, na noite do assassinato de Vatrik, estava sabotando, sob o comando da resistência Bajoriana, uma das instalações de mineração da estação, um crime punível com a morte. Odo diz a Dukat simplesmente que ela não matou Vatrik.

Quando Trazko retorna à estação para tentar novamente matar Quark na enfermaria, Odo o prende e, com as muitas conexões entre ele e Pallra, coloca os dois "atrás das grades".

De volta ao escritório do comissário, Odo diz a Kira que agora sabe que foi ela que matou Vatrik. Ela confessa que Vatrik a surpreendeu enquanto ela procurava a lista na loja do Bajoriano, a sua verdadeira missão para a resistência. Vatrik também era um colaborador que servia de ligação direta entre Dukat e os demais colaboradores. 

Odo e Kira permanecem em silêncio pensando se o relacionamento entre eles poderá permanecer o mesmo daqui pra frente.

 

Comentários:


Após duas semanas em baixa, DS9 volta com tudo: "Necessary Evil" é um verdadeiro clássico!

Trazido ao mundo pela mesma dupla responsável por "Duet", na temporada passada, James L. Conway e Peter Allan Fields, "Necessary Evil" é o melhor episódio desta segunda temporada e um dos melhores episódios de toda a série. É também, sem maiores dúvidas, o melhor representante de "Trek Noir" da história de Jornada.

Poucas coisas trouxeram tanta curiosidade aos fãs desta série quanto os acontecimentos da época em que os Cardassianos ocupavam Bajor, e DS9 era uma instalação de mineração chamada de Terok Nor, comandada por gul Dukat. Neste episódio, "matamos a fome" com relação ao tema, descobrindo fatos que nos ajudam a entender melhor certos personagens e a dinâmica entre eles.

Envoltos em uma atmosfera que lembra algo entre histórias policiais antigas e o mais puro horror gótico, os personagens se vêem imersos em uma trama extremamente complexa, com um número interminável de pequenos e ricos detalhes, que "teimam" em continuar surgindo mesmo em sucessivas assistidas, sem dúvida qualidades de uma história destinada a vencer o teste do tempo, que ao final emociona por tratar com propriedade, sinceridade e de forma incisiva temas (relacionados entre si) como: "acontecimentos marcantes compartilhados", "confiança implícita" e "admiração, que se torna adoração". 

A caracterização de Quark (passada e presente) é a melhor apresentada até aqui para o personagem: suave, confiante, ele deveria ser sempre caracterizado assim, não como um simples alívio cômico.

É incrível como Rom pôde ser usado (sem nenhuma modificação) dentro da sua caracterização de idiota, ser REALMENTE hilário e não prejudicar a trama do episódio, pelo contrário, ajudá-la a avançar. Um prodígio de todos os envolvidos!

Sisko também teve uma boa cena em que ele ajuda Odo a praticar a tática do "policial bom/policial mau" com Rom.

A versão passada de Dukat não é nada diferente da versão presente e meus comentários feitos em "Cardassians" continuam valendo. Aqui novamente ele planeja salvar o próprio rabo, fingindo (provavelmente até para si próprio) estar fazendo alguma coisa nobre. A presença de Dukat em Terok Nor tem um palpável poder.

Acho que a mentira de Kira funcionou tão bem porque era, em grande parte, verdade. Kira encontrou, nas mais desumanas e adversas circunstâncias possíveis, o "homem mais decente que já conhecera" e teve que mentir pra ele pra não ser executada. 

Desde o instante em que Rom diz onde encontrou a caixa, percebemos a REAL importância do caso Vatrik, e das circunstâncias que o envolveram, na vida de Odo. Naquela passagem, ele foi chamado pela primeira vez de "comissário" e teve seu primeiro encontro com Dukat, que serviu de ponto de partida para o relacionamento entre os dois, o mesmo para Quark e Kira. É extremamente importante perceber como Odo mudou no curso da investigação do caso Vatrik. Quando Dukat o convocou inicialmente, ele era uma pessoa frágil, insegura, não conseguia olhar ninguém nos olhos. Porém, à medida que a investigação prosseguia ele ganhava mais confiança, indicando claramente de onde veio o Odo do presente. aquela investigação o ajudou a estabelecer quem ele é no Universo --através da sua função em Terok Nor e depois em DS9.

Também é apresentada neste episódio a total capacidade de seus inúmeros atributos: seus muitos talentos investigatórios, suas agudas observações da condição humana (especialmente em três maravilhosos "voice-overs"), sua incapacidade em julgar as pessoas e seu ASSUMIDO papel de forasteiro ("outsider") e defensor da justiça. Ele encontrou, em circunstâncias extremas, "a mulher mais decente que já conhecera" e por um erro de julgamento pessoal não a mandou para execução. Imaginem se as coisas tivessem sido um pouco diferentes e se ele tivesse resolvido o caso Vatrik naquela época. Provavelmente ele teria passado os últimos cinco anos visitando, em uma certa data, uma certa sepultura em alguma parte de Bajor e se lamentando por ser quem ele é. 

A cena final entre Kira e Odo é uma das minhas favoritas de toda a história de Jornada!

A direção de James L. Conway é simplesmente sobrenatural (sem falar nos cenários de Herman Zimmerman e na fotografia de Marvin Hush) por conseguir transformar DS9 --REALMENTE-- na Terok Nor daquela época (sem dúvida um marco na história de Jornada). O trabalho de Conway é verdadeiramente artístico por utilizar os cortes passado/presente de uma forma TOTALMENTE ligada tematicamente. Tais cortes são feitos de uma forma tão fluida e natural que o espectador se sente LITERALMENTE mergulhando na história.

A construção de paralelos entre as duas épocas é magistral, indo o destaque para o contraponto entre as crianças brincando no Promenade no presente, com as crianças, atrás da cerca, esperando pelo retorno dos seus pais das minas, no passado. Isto sem contar com uma direção de atores totalmente ACIMA DA MÉDIA. 

Dentre os atores regulares, todos estiveram perfeitos, em especial Nana Visitor e ainda mais Rene Auberjonois, que foi capaz de construir duas diferentes e igualmente matadoras caracterizações para as duas versões de seu personagem e introduzir incontáveis nuances e detalhes (às vezes, mesmo sem diálogo) nestas duas caracterizações. BRAVO!!!

Alaimo é Dukat, Dukat é Alaimo. Alaimo é mais dono do personagem do que os produtores e roteiristas da série. Grodénchik esteve melhor do que o usual. Moffat se saiu muito melhor aqui do que em "The Game", seu personagem aqui não era NADA trivial. MacKenzie não comprometeu. 

E que tal a ambigüidade sobre o assassinato de Ches'saro? Será que ele foi de fato morto pela viúva de Vatrik (como concluiu Odo) ou será que ele foi morto por alguém da resistência (daquela época) que soube dos acontecimentos recentes quando Kira fez a sua pesquisa? 

O único real problema do episódio é a falta de uma imediata conseqüência para o relacionamento entre Odo e Kira, devido aos acontecimentos do episódio, o que eu vou debitar, como usual, na conta da série como um todo. Existe uma fala de Odo em "The Collaborator", mais à frente nesta temporada, que PODE ser interpretada como um comentário sobre os acontecimentos deste episódio. Mais tarde, na quinta temporada da série, em "Things Past", temos uma revisita (sob um certo ponto-de-vista) aos temas deste episódio, só que com as posições de Kira e Odo invertidas. É esperar pra ver.

"Necessary Evil" é "DS9 clássico" que faz por Odo o que "Duet" fez por Kira na temporada passada e faz dos dois (até aqui) os personagens mais complexos e humanos desta série.




Citações

Odo - "My own very adequate memory not being good enough for Starfleet, I am pleased to put my voice to this official record of this day. Everything's under control. End log."
("Não sendo minha adequada memória boa o suficiente para a Frota Estelar, estou feliz em colocar minha voz neste registro oficial deste dia. Tudo está sob controle. Fim do diário.")

Dukat - "Have you ever seen a dead man before?"
("Você já viu um homem morto antes?")
Odo - "Yes --in your mines."
("Sim --em suas minas.")

Odo - "Are these kinds of thoughts appropriate for a Starfleet log? I don't care."
("Esses tipos de pensamento são apropriados para um diário da Frota Estelar? Eu não ligo.")



Trivia:

int.jpg (476 bytes) Presença de Rom e Dukat.

int.jpg (476 bytes) Katherine Moffat participou do episódio "The Game", da quinta temporada da Nova Geração

int.jpg (476 bytes) O cinegrafista Marvin Hush se baseou no clássico Noir de "The Third Man" para construir o visual do episódio.

int.jpg (476 bytes) Peter Allan Fields, que escreveu vários episódios da série "Columbo", deixou uma pequena citação ao seu antigo trabalho no final da conversa entre Odo e Pallra. Odo já está indo embora, após várias perguntas, e ele pára, se vira e diz: "One more thing...".

int.jpg (476 bytes) Armin Shimerman fez uma pequena homenagem a Humphrey Bogart na cena de abertura.

int.jpg (476 bytes) Os "voice-overs" (narração sem a fala em cena) de Odo foram considerados tão fora do formato de Jornada na época, que necessitaram de uma autorização especial de Rick Berman para serem incluídos.

int.jpg (476 bytes) Dan Curry (especialista em efeitos visuais e artes marciais da série) novamente, como em "Babel", da última temporada, ofereceu a sua face, agora para a foto de Ches'saro.

int.jpg (476 bytes) Odo deixou os cuidados do Doutor Mora (ver o episódio "The Alternate", mais a frente nesta temporada) em 2363 e em 2365 foi convocado por gul Dukat, então comandante de Terok Nor, para investigar o assassinato do Bajoriano Vatrik. Após este evento ele assumiu o posto de chefe de segurança da estação. A partir de 2369 ele continuou na mesma função agora com a estação renomeada como Deep Space Nine, sob o comando do comandante Sisko.

int.jpg (476 bytes) O roteirista Peter Allan Fields (cujo trabalho usualmente tem alta qualidade) foi responsável direto por três dos melhores episódios de DS9: "Duet", "Necessary Evil" e "Crossover" (mais tarde, nesta segunda temporada). Foi também responsável pelo clássico episódio da quinta temporada da Nova Geração, ganhador do prêmio Hugo: "Inner Light". Fields se desligou amigavelmente da produção de DS9 após o término da segunda temporada, voltando a fazer algumas contribuições como free-lance mais tarde no decorrer da série.


Ficha técnica:

Escrito por Peter Allan Fields
Direção de James L. Conway

Exibido em 15/11/1993
Produção: 028

Elenco:

Avery Brooks como Benjamin Lafayette Sisko
René Auberjonois como Odo
Nana Visitor como Kira Nerys
Colm Meaney como Miles Edward O'Brien
Siddig El Fadil como Julian Subatoi Bashir
Armin Shimerman como Quark
Terry Farrell como Jadzia Dax
Cirroc Lofton como Jake Sisko

Elenco convidado:

Katherine Moffat como Vatrik Pallra 
Max Grodénchik como Rom 
Marc Alaimo como Gul Dukat 
Robert MacKenzie como Trazko

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