ENT 1×02: Fight or Flight

Explorar ou não explorar o espaço? Eis a aterrorizante questão para Sato

Sinopse

Data: 6 de maio de 2151

A Enterprise segue em sua missão de exploração. Enquanto Jonathan Archer e sua tripulação estão ansiosos para encontrar novas espécies alienígenas, o oficial de armamentos Malcolm Reed está aflito para corrigir a calibragem da mira dos torpedos, que já se mostrou defeituosa no recente confronto da nave com os sulibans.

Desde a devolução do klingon Klaang ao seu mundo natal, a única forma de vida com quem a Enterprise travou contato foi “Sluggo”, apelido dado a uma lesma alienígena que a alferes Hoshi Sato adotou como bichinho de estimação. Entretanto, nem isso vai indo bem; o animal não se adaptou à nova vida a bordo e está morrendo aos poucos.

Hoshi observando Sluggo

Hoshi está se sentindo tão incomodada na Enterprise quanto Sluggo. Ela está insegura sobre sua vocação para uma missão exploratória no espaço profundo. Seus problemas começam nos níveis mais elementares: a alferes está com dificuldades para dormir pelo fato de seus alojamentos ficarem do lado contrário ao que ela estava acostumada. “As estrelas estão indo para o lado errado”, foi o que ela disse, ao protestar junto a Archer. O capitão autoriza que ela troque de alojamento com o alferes Porter, uma vez que os dois já estavam de acordo.

Logo após Malcolm Reed realizar mais um teste, malsucedido, com seus torpedos, quase atingindo um deles na própria Enterprise, T’Pol detecta em seus sensores a presença de uma nave alienígena à deriva perto dali. Archer, mais ansioso do que nunca para um contato, resolve investigar. Após uma tentativa de comunicação, o capitão decide abordar a nave, para ver se há algo errado. T’Pol protesta, dizendo que a abordagem poderia ser vista pelos alienígenas como uma invasão de sua privacidade.

Nave alienígena descoberta pela Enterprise

Mesmo assim, Archer decide seguir em frente e convoca Hoshi Sato e Malcolm Reed para acompanhá-lo ao cargueiro à deriva. Chegando lá, os três encontram um cenário desolador: enquanto uma bomba instalada recentemente processa o que parecem ser fluidos biológicos, 15 cadáveres estão pendurados sob o teto. Hoshi entra em estado de choque com a visão aterrorizante, e Archer decide retornar à Enterprise.

Supondo que os alienígenas que assassinaram aqueles tripulantes pudessem voltar em breve para buscar os fluidos que estão sendo armazenados pela bomba, Archer decide abandonar a área, embora relutante. Durante o jantar, com T’Pol e Tucker, o capitão se mostra extremamente desconfortável com a atitude covarde de simplesmente abandonar a nave lá, sem tentar descobrir o que aconteceu ou avisar outros da espécie que havia sido cruelmente assassinada.

alienígenas mortos Enterprise 1x02 Fight or Flight

Em razão disso, Archer decide voltar à nave para investigar o que está acontecendo e deixar ao menos um sinal automático para que outros venham para resgatá-la. Incumbida de decifrar a língua alienígena e preparar a mensagem, Hoshi Sato mais uma vez faz parte do grupo de abordagem. Junto dela e do capitão, também estão o dr. Phlox e o engenheiro Tucker. Reed ficou a bordo para continuar trabalhando na calibragem da mira dos torpedos.

Examinando um dos cadáveres, Phlox descobre que os alienígenas montaram aquele sistema hidráulico para extrair triglobulina de seus corpos — uma substância que tem vários usos, que vão desde vacinas até afrodisíacos. O médico também lamenta informar que a fisiologia humana possui uma substância muito parecida. Enquanto isso, Hoshi consegue criar a mensagem e deixar o transmissor do cargueiro emitindo-a no automático.

Archer, T'Pol e Tucker jantando

Logo depois, uma outra nave alienígena se aproxima. O padrão tecnológico dela é o mesmo das tubulações instaladas no cargueiro — os assassinos estão de volta. Archer e seu grupo voltam às pressas para a Enterprise, mas não a tempo de conseguir fugir. A Enterprise passa a ser atacada pelos alienígenas, depois que eles fazem um rastreio da nave e descobrem que os humanos possuem um equivalente da triglobulina.

Com tecnologia francamente superior, os alienígenas tornam inútil qualquer tentativa de reação. Eles possuem armas de partículas e raios tratores, o que está muito além das capacidades da NX-01. A Enterprise já está para ser abordada, e Archer ordena que Reed distribua armas para todos, na tentativa de conter o ataque dentro da nave. Mas antes que esse curso de ação possa ter prosseguimento, uma outra nave alienígena se aproxima.

Axanar

Ao abrir um canal de comunicação, Archer constata que são da mesma espécie que foi assassinada a bordo do cargueiro. O capitão ordena que Hoshi Sato transmita uma mensagem, via tradutor universal, dizendo que a Enterprise não foi responsável pelas mortes, e sim os alienígenas da nave que estava para abordá-los. As tentativas de tradução automática falham, e a comunicação só funciona quando a alferes Sato, pessoalmente, fala com os alienígenas. Eles decidem ajudar a Enterprise, atacando a outra nave, que é destruída no processo.

A Enterprise estabelece boas relações com a espécie recém-contatada, os axanares. Segundo Archer, eles têm vida média de 400 anos e são andróginos. Após o contato diplomático, a nave retoma seu curso de exploração rumo ao desconhecido, mas não sem antes fazer uma parada para deixar Sluggo em um ambiente no qual ele tenha maior chance de sobreviver.

Comentários

“Fight or Flight” abre muito bem a temporada regular de Enterprise, injetando o tão falado sangue novo de que a franquia precisava. Por quê? Muito simples: a história nele contida não poderia ter sido adaptada para nenhuma das outras séries de Jornada nas Estrelas.

Dois elementos empurram a trama à frente: primeiro, a enorme deficiência técnica da Enterprise, que, além de não possuir várias das tecnologias que a fariam imbatível nos séculos seguintes, não consegue fazer funcionar direito o que ela tem. Segundo, a total falta de experiência e a ansiedade da tripulação para encontrar o “desconhecido”, mesmo que isso signifique enfrentar riscos.

title card Enterprise 1x02 Fight or Flight

Além disso, dois outros ingredientes presentes mostram que a série, apesar de ter episódios fechados, apresena certa continuidade. Vamos aqui não só referências a “Broken Bow”, com uma menção aos sulibans, como também a continuação direta de algo visto só perifericamente no episódio-piloto: a total inabilidade de acertar o alvo no disparo de torpedos.

Em “Broken Bow”, quando do confronto da Enterprise com as naves sulibans, vemos a NX-01 disparar vários torpedos mas não acertar nenhum dos alvos inimigos. Aqui, já no começo do episódio, vemos Malcolm Reed trabalhar furiosamente para corrigir a calibragem de mira dos torpedos. Essa deficiência mostra sua valia mais adiante no episódio, quando a nave faz um teste real das modificações e quase é atingida por um torpedo que ela mesma lançou no processo. A cena é extremamente bem executada e serve para mostrar o quão despreparada está a Enterprise para uma missão arriscada no espaço profundo.

Malcolm Reed calibrando torpedos da Enterprise

Não menos despreparados estão seus tripulantes. Hoshi Sato, que é certamente a mais insegura da equipe, ganha um episódio focado principalmente nela — a questão que ela precisa resolver é: seu lugar é no espaço, ao lado do capitão Archer, desvendando novas culturas e línguas alienígenas, ou ela deveria voltar à Terra e permanecer como professora universitária?

Neste sentido, a personagem faz uma ponte direta com a audiência, uma vez que o público geral está tão despreparado para viver as aventuras da Enterprise quanto a própria oficial de comunicações, o que facilita muito seu desenvolvimento. E Linda Park não deixa por menos, dando vida à personagem com mestria.

Hoshi assustada

Hoshi é muitíssimo bem utilizada aqui, e suas reações servem bastante para refletir o tom de toda a tripulação e, ao mesmo tempo, nos contar mais sobre a personalidade da própria alferes. Nota dez até aqui para o desenvolvimento de personagens. Além de Hoshi Sato, o capitão Archer recebe um tratamento especial, refletindo a nobreza de sentimentos humanos em sua forma mais crua. Archer age com uma moralidade e uma coragem próximas de seus sucessores dos séculos 23 e 24, mas ainda não com a astúcia e a experiência deles. O resultado é um capitão que não é maior que a vida, como os demais, mas que é capaz de cometer erros, e dos grandes.

Archer com alienígena morto

Não fosse pela aparição de uma outra nave axanar e pelo sucesso de Hoshi Sato explicando a situação aos alienígenas, a tripulação da Enterprise já teria virado suco de triglobulina em sua segunda missão — tudo graças a Archer. Por conta dessas decisões corretas mas inconsequentes do capitão, T’Pol serve como um bom contraponto. Com sua experiência vulcana e sua profunda lógica, ela sempre aponta o caminho mais seguro. Óbvio que os ilógicos e desconfiados humanos do século 22 não têm por hábito seguir seus conselhos, o que faz do relacionamento entre ela e o capitão dos mais revigorantes.

Ao contrário do que temiam alguns, T’Pol ainda não está totalmente integrada à tripulação. Muito ao contrário, Archer e sua equipe costumam ver sua primeiro oficial como uma pedra no caminho de sua missão de exploração. Mesmo assim, o capitão não é bobo e procura sempre ouvir o que a vulcana tem a dizer.

T'Pol e Archer conversando

O doutor Phlox aparece em uma situação paradoxal neste episódio: sua atuação é um misto de Guinan (da Nova Geração) com Neelix (de Voyager). Embora os trejeitos do alienígena estejam ainda um tanto quanto apatetados, lembrando o talaxiano, suas tiradas são infinitamente mais inteligentes, algumas vezes lembrando as sacadas sensacionais da el-auriana bartender da Enterprise-D. Especialmente interessantes são os momentos em que Phlox traça o paralelo entre as dificuldades de Hoshi a bordo e de seu bichinho Sluggo, ou ainda quando o médico demonstra sua alegria ao estar numa nave que mais parece um laboratório fechado para ele estudar o comportamento humano. O diálogo dele com Tucker no refeitório é dos mais curiosos. O personagem, nesse momento, anda pela fronteira entre o fascinante e o ridículo.

Travis Mayweather passa batido nesse episódio, do mesmo modo que em “Broken Bow”. O personagem, até aqui, poderia ser muito bem o “tripulante #2”, que ninguém iria notar a diferença.

Reed e sua mania de explodir coisas continua despertando o interesse, assim como a ironia de Tucker. Aliás, aqui temos mais um insight da personalidade do engenheiro, que se mostra mais um explorador do que um cientista. Ele certamente nunca trocaria uma licença pela leitura de um manual técnico, como o sr. Scott costumava fazer na Série Original.

Tucker e Phlox almoçando

Vale dizer que, apesar do excelente desenvolvimento da premissa da série e da caracterização de seus personagens principais (à exceção de Mayweather), “Fight or Flight” está longe de ser um episódio perfeito. A solução da história é totalmente clichê, com Sato superando sua insegurança e desatando a falar com o axanar para comunicar as intenções pacíficas da Enterprise, e a destruição da nave alienígena inimiga é totalmente artificial. Seria muito mais conveniente se os misteriosos assassinos simplesmente batessem em retirada em vez de serem destruídos por uma força aparentemente inferior.

Além disso, o episódio demora um pouco a pegar ritmo. Mesmo assim, é um bom sinal, que demonstra que os roteiristas estão tentando embasar suas histórias muito mais em diálogos do que na ação desenfreada e recheada de tecnobaboseira. Faltou só acertar a medida certa entre ritmo, diálogo e ação para termos um episódio vencedor.

Avaliação

Citações

“We were only off by three meters.”
“‘Only three meters.’ Three meters could mean the difference between hitting a weapons port or a warp core. Instead of disabling a vessel we’d end up destroying it, and probably ourselves in the process.”
(“Erramos por apenas três metros.”)
(“‘Apenas três metros.’ Três metros podem significar a diferença entre acertar uma escotilha de armas ou um núcleo de dobra. Em vez de desabilitar uma nave acabaríamos por destruí-la, e provavelmente a nós no processo.”)
Mayweather e Reed

“Be not mistaken, they are preparing to mate. Do you think they will mind if I watch?”
(“Não se engane, eles estão se preparando para acasalar. Você acha que eles se importariam se eu assistisse?”)
Phlox

“Maybe we should go have a look.”
“If you insist on allowing your curiosity dictate your actions…”
“We insist.”
(“Talvez devêssemos ir dar uma olhada.”)
(“Se você insiste em permitir que sua curiosidade dite suas ações…”)
(“Nós insistimos.”)
Tucker, T’Pol e Archer

“I am a translator. I didn’t come out here to see corpses hanging on hooks.”
(“Sou tradutora. Não vim ao espaço para ver cadáveres pendurados em ganchos.”)
Hoshi

“We have a code of behavior. And we try to obey it.”
“You may not believe this, but humans have a code of behavior too. It took a few thousand years, but I think we’re starting to get it right.”
(“Nós temos um código de comportamento. E tentamos obedecê-lo.”)
(“Você pode não acreditar, mas humanos também têm um código de comportamento. Levou alguns milhares de anos, mas acho que estamos começando a acertar.”)
T’Pol e Archer

“This isn’t exactly Spanish we’re dealing with here! I’d be lucky if I’m getting half the vocabulary right…”
(“Isso com que estamos lidando aqui não é exatamente espanhol! Eu teria sorte se peguei metade do vocabulário direito…”)
Hoshi

Trivia

  • A música do episódio ficou a cargo de Jay Chattaway.
  • Esse segmento marca a estreia dos uniformes de EVA de Enterprise (“Extra-Vehicular Activity”, ou Atividade Extra-Veicular), aquelas famosas roupas de astronauta.
  • “Fight or Flight” teve cerca de 9,1 milhões de telespectadores nos EUA, o que representou uma queda de audiência menor do que a que Voyager teve do primeiro para o segundo episódio.
  • Algumas pequenas refilmagens para esse episódio foram feitas várias semanas depois de sua filmagem original ser concluída.
  • Os alienígenas assassinados são os axanares, cidadãos do planeta de mesmo nome que James T. Kirk visitaria no século 23 (conforme relatado no episódio clássico “Whom Gods Destroy”). Foi provavelmente nessa viagem que ele ganhou a “Folha da Palma de Axanar” (o prêmio consta de eu currículo em “Court-Martial”) As máscaras dos axanares foram, como de costume, desenvolvidas por Michael Westmore.
  • Além da referência clássica aos axanares, o episódio também menciona os nausicaanos, nas palavras do doutor Phlox. Esses alienígenas só surgiram no universo de Jornada durante A Nova Geração, mas a data do primeiro contato dessa raça com humanos nunca foi estabelecida.

Ficha Técnica

Escrito por Rick Berman & Brannon Braga
Dirigido por Allan Kroeker

Exibido em 3 de outubro de 2001

Título em português: “Luta ou Fuga”

Elenco

Scott Bakula como Jonathan Archer
Jolene Blalock como T’Pol
John Billingsley como Phlox
Anthony Montgomery como Travis Mayweather
Connor Trinneer como Charlie ‘Trip’ Tucker III
Dominic Keating como Malcolm Reed
Linda Park como Hoshi Sato

Elenco convidado

Jeff Ricketts como capitão alienígena
Max Williams como tripulante 1 (não-creditado)
Brett Baker como tripulante 2 (não-creditado)
Efrain Riguerda como voz do tradutor

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Edição de Mariana Gamberger
Revisão de Susana Alexandria

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