Ciência se aproxima do motor de dobra em Star Trek

Com a publicação da Teoria da Relatividade em 1905, as ideias de viagem interestelar superlumínicas, ou seja, acima da velocidade da luz, ficaram no plano da impossibilidade física. Mas a literatura de ficção científica não deixou de fazer o homem sonhar com algo que pudesse contornar isso.

Buracos de minhoca, hiperespaço, dobra estelar foram algumas das formas que os escritores de scifi encontraram para definir uma viagem espacial a outras estrelas. A série “Skylark of Space” de 1928 (seguido dos quadrinhos de Buck Rogers) é considerado um dos primeiros romances de viagem interestelar onde descrevia espaçonaves impulsionadas pela conversão de matéria-energia. Já o novel de 1948 intitulado “Flight of the Starling” de Chester S. Geier mencionava a expressão “Star Drive”. O filme “Forbidden Planet”, de 1955, serviu de inspiração para criação de Star Trek, cuja nave usava um sistema “hiperdrive quanto-gravítico” para superar a velocidade da luz.

Em Star Trek, a tecnologia da viagem de dobra permite que as naves gerem “campos de dobra para formar uma bolha subespacial”, distorcendo o contínuo espaço-tempo local e movendo a nave a velocidades que poderiam exceder significativamente a velocidade da luz. Este dispositivo fictício torna possível toda a exploração e comércio interestelar nas séries da franquia.

O conceito de deformação do tecido espaço-tempo não é novidade para a ciência em relação a massa e gravidade, mas, por muito tempo, seu uso para uma viagem espacial foi considerado pelos cientistas apenas uma ficção científica, uma vez que não havia uma solução matemática das equações de campo de Einstein na relatividade geral, além do limite da velocidade da luz e o paradoxo temporal.

Em 1994, um físico mexicano, Miguel Alcubierre, apresentou um “truque” matemático onde descrevia a estrutura do espaço-tempo sendo distorcida, contraindo atrás da nave e expandindo a sua frente, fazendo a espaçonave literalmente surfar, sem nenhuma aceleração e sem entrar em conflito com a Teoria da Relatividade. O problema dessa teoria dar certo seria preciso uma grande quantidade de energia negativa e matéria exótica, numa massa maior que Júpiter. Além de ser uma quantidade gigantesca, estes elementos ainda não foram comprovados pelos cientistas, se é que um dia serão. O que deixa este tipo de viagem, na prática, inviável.

Mas novos estudos continuam sendo feitos e algumas soluções criativas foram sendo apresentadas.

Há poucos dias, contudo, o astrofísico Erik Lentz da Universidade de Göttingen propôs uma maneira de criar uma dessas “bolhas de dobra” a partir de fontes de energia positiva. Seu artigo está na nova edição da revista Classical and Quantum Gravity

Enquanto estudava propostas anteriores de warp drive, Lentz percebeu que havia configurações específicas de bolhas do espaço-tempo que haviam sido negligenciadas. Essas bolhas assumiram a forma de sólitons, ondas compactas que viajam a uma velocidade constante sem perder a forma (pense em uma única ondulação movendo-se continuamente em um lago calmo). Isto faria com que a forma de contrair e expandir de Alcubierre se tornasse uma forma de onda.

Os sólitons foram descobertos enquanto John Scott Russell (1808-1882) observava canais de água na Escócia, mas hoje os sólitons em ondas de luz e de elétrons se tornaram parte essencial de todas as pesquisas envolvendo a fotônica e as tecnologias quânticas.

O astrofísico usou as equações de Einstein para diferentes configurações de sóliton até encontrar uma que funcionasse com fontes de energia convencionais e sem a necessidade de qualquer matéria exótica.

Usando as equações de Einstein para configurações especiais de sólitons – onde a métrica do espaço-tempo rompe com a geometria vetorial e passa a obedecer a uma relação hiperbólica – Lentz descobriu que as geometrias espaço-temporais alteradas podem ser formadas de um modo que fontes de energia convencionais são suficientes para induzir a formação de uma onda.

Em termos mais simples, o novo método usa a própria estrutura de “tecido” do espaço-tempo, impulsionado na forma de uma onda – um sóliton – para fornecer uma solução para viagens mais rápidas que a luz, sem a necessidade de qualquer matéria ou energia exótica.

Além disso, as bolhas de dobra foram configuradas para conter uma região com forças de maré mínimas, de modo que a passagem do tempo dentro do sóliton coincide com o tempo externo. Isso significa que não haveria as complicações do chamado “paradoxo dos gêmeos”, em que um gêmeo viajando próximo à velocidade da luz envelheceria mais lentamente do que o outro gêmeo que permanecesse na Terra.

“Este trabalho afastou o problema da viagem mais rápido do que a luz da pesquisa teórica em física fundamental e aproximou-a da engenharia. A próxima etapa é descobrir como reduzir a quantidade astronômica de energia necessária para colocá-la na faixa das tecnologias atuais, como uma grande e moderna usina de fissão nuclear. Então poderemos falar sobre a construção dos primeiros protótipos,” disse Lentz.

A teoria de Lentz ainda não superou um dos maiores obstáculos da viagem de dobra: a imensa quantidade de energia necessária para deformar o espaço-tempo: “A energia necessária para este motor viajando à velocidade da luz, abrangendo uma espaçonave de 100 metros de raio, é da ordem de centenas de vezes a massa do planeta Júpiter. A economia de energia precisaria ser drástica, de aproximadamente 30 ordens de magnitude [3 x 1030], para ficar ao alcance dos modernos reatores de fissão nuclear,” explicou Lentz.

Isso não o desanimou, e o físico afirma que já está estudando métodos e mecanismos de economia de energia propostos por outros pesquisadores que poderiam ser usados em suas bolhas de dobra.

Ondas no espaço-tempo viabilizam viagens acima da velocidade da luz

Se essa nova descoberta for possível, significa que seriamos capazes de visitar Próxima Centauri, a 4,22 anos-luz de distância do nosso planeta, em menos de quatro anos.

Essa teoria já foi mostrada na série A Nova Geração no episódio New Ground, onde o Dr. Ja’Dar de Bilana III investigou as ondas de sóliton como uma possível alternativa ao warp drive. A USS Enterprise-D participou do primeiro teste de campo dessa tecnologia em 2368.

Embora o teste de utilizar a onda sóliton para viagem em dobra não tenha obtido sucesso na série, espero que este torne o sonho de viajar nas estrelas mais próximo da realidade.

Fonte: Inovação Tecnológica