TNG 6×02: Realm of Fear

Episódio tenta falar de fobia e hipocondria, mas se perde numa trama bizarra

Sinopse

Data estelar: 46041.1

A Enterprise é enviada para investigar o paradeiro da USS Yosemite, nave de pesquisa enviada para estudar o fluxo de plasma em uma estrela binária. Tentativas de comunicação fracassam, e os sensores não conseguem vencer a interferência e determinar se há formas de vida a bordo.

Procurando uma alternativa, Picard decide enviar um grupo avançado via teletransporte. Riker convoca Worf, Crusher e Geordi, e o engenheiro, por sua vez, chama Reginald Barclay. Mesmo hesitante, o tenente é obrigado a ir.

O chefe de transporte O’Brien informa que o sistema só irá funcionar se os equipamentos de teletransporte da Enterprise e da Yosemite trabalharem juntos. Ele estabelece a conexão e o sincronismo sem dificuldade, mas alerta o grupo avançado de que o processo de teleporte só será possível com um de cada vez e levará o dobro do tempo normal. Todos concordam e são, um a um, transportados. Quando chega a vez de Barclay, ele não resiste à pressão e simplesmente abandona a sala de transporte. O grupo avançado segue com os trabalhos sem a ajuda do engenheiro.

A bordo da Yosemite, eles encontram apenas um corpo, totalmente queimado. Os outros tripulantes estão desaparecidos. Crusher não está certa sobre a causa da morte do tripulante encontrado e pede a Riker autorização para levar o corpo à Enterprise para autópsia. O primeiro oficial concorda.

Barclay vai procurar a conselheira Troi para tentar resolver seu medo do teleporte. Depois de uma conversa, Deanna o convence de que seu temor é absolutamente normal e ensina ao engenheiro uma técnica de relaxamento betazoide. Revigorado pela confiança, Barclay decide se juntar ao grupo avançado. Ao fim do trabalho, ao se teleportar de volta à Enterprise, ele passa por uma estranha experiência. No momento em que ele está se desfazendo, ele observa, no feixe de transporte, uma criatura estranha. Parecida com um verme gigante, ela torna-se cada vez mais ameaçadora e chega até a morder o braço esquerdo do engenheiro antes que ele se rematerialize na plataforma da Enterprise.

Barclay relata o ocorrido, e Geordi ordena que O’Brien faça uma revisão completa do sistema de teletransporte, mas ele não encontra problemas. Diante disso, todos começam a acreditar que tudo não passou de um produto da imaginação de Barclay. Inclusive ele passa a acreditar nisso, cada vez mais convencido de que possui uma doença chamada psicose do transporte, diagnosticada pela primeira vez em 2209 e sem tratamento conhecido.

Enquanto isso, Data e Geordi continuam analisando os fragmentos de um invólucro de vidro encontrados na Yosemite e concluem que o que aconteceu por lá foi uma explosão de plasma que teria sido transportado a bordo para análise. Eles pretendem reproduzir o experimento na Enterprise, desta vez com todo o cuidado para que o incidente catastrófico não se repita, envolvendo o vidro em um potente campo de força.

Em seus aposentos, Barclay decide que precisa saber se realmente está imaginando coisas ou se a experiência que ele vivenciou é real. Ele decide reproduzir seu teletransporte, pedindo ajuda ao chefe O’Brien. Depois de ordenar, Barclay é teleportado para a Yosemite e de volta à Enterprise, onde ele novamente tem um encontro com o verme gigante. Convencido de que não imaginou nada, ele convoca toda a tripulação sênior, no meio da madrugada.

Em uma reunião, ele relata suas experiência e a sensação que tem periodicamente em seu braço esquerdo. Picard decide investigar a fundo, ordenando mais análises do sistema. Crusher examina rapidamente o braço de Barclay e não vê nada de anormal, mas decide fazer exames mais detalhados na enfermaria.

Lá ela descobre que o braço de Barclay está apresentando as mesmas leituras que o corpo recolhido da Yosemite. Na engenharia, Data e Geordi transportam a bordo uma nova amostra do plasma, que explode assim que eles aplicam uma varredura de rotina. Felizmente a explosão é contida pelo campo de força. Observando o plasma, Geordi observa um estranho e complexo padrão biológico no plasma – há algo vivo lá, que teria causado os efeitos observados por Barclay. O engenheiro, entretanto, não sabe explicar o que viu no feixe de transporte – as bactérias a que Crusher e Geordi se referem certamente são bem menores que os vermes gigantes que ele observou.

Geordi e O’Brien acreditam que podem “sintonizar” o teletransporte e detectar as formas de vida se colocarem Barclay em suspensão no feixe por cerca de 40 segundos. Assim que o sistema fosse capaz de identificar as bactérias, poderia “limpá-las” do corpo do engenheiro e curá-lo.

A estratégia dá certo, mas por longos segundos Barclay precisa enfrentar a angústia de estar face a face com os estranhos vermes do feixe de teletransporte. Incerto da natureza daquelas criaturas, o engenheiro, num ato de coragem, decide agarrar uma delas. Quando se materializa de volta, ele está abraçado a um dos tripulantes desaparecidos da Yosemite. Ele logo comunica que há mais a serem resgatados no feixe. Worf e um grupo de segurança se transportam e resgatam os “vermes” faltantes, trazendo os tripulantes perdidos de volta, sãos e salvos.

Ao que parece, aqueles tripulantes tentaram se salvar da mesma forma que Geordi e O’Brien pretendiam salvar Barclay, colocando-o no feixe de transporte e rastreando a contaminação. Só que no caso do pessoal da Yosemite, a estratégia não deu certo, e eles ficaram presos no feixe, onde pareciam se manifestar como os vermes observados por Barclay. Somente quando o engenheiro os agarrou eles puderam retornar.

Comentários

“Realm of Fear” se pauta pelas diretrizes básicas de bom drama trazidas para Star Trek pelo roteirista Michael Piller: procura se concentrar em um drama humano, algo com que a audiência possa se identificar; busca tornar aquele drama algo pertencente a um dos personagens da série e tenta imprimir a esse personagem, ao superar seu problema, um caráter de crescimento e desenvolvimento.

Já vimos a mesma receita antes em clássicos de A Nova Geração, como “Sins of the Father” (para Worf), “The Offspring” (para Data) ou “The Inner Light” (para Picard). Aqui a ideia é fazer algo pelo bom e velho recorrente Reginald Barclay.

É natural que ele tenha sido escolhido para algo assim. O problema que ele apresenta, o medo do teletransporte, é algo que não funcionaria com nenhum dos outros personagens, que já foram vistos se transportando inúmeras vezes. Além disso, a análise psicológica do episódio – a que mais fala ao telespectador – é sobre a fobia e a hipocondria do engenheiro. E esse é um traço de personalidade que não cairia bem com os quase perfeitos oficiais seniores da Enterprise. É, portanto, uma excelente pedida trazer um simpático (e problemático) recorrente como Barclay para dar uma mãozinha.

Até aí, só boas intenções: fazer um episódio sobre um tema do cotidiano das pessoas e sobre um personagem (mais ou menos) querido do público. Parecia perfeito, em princípio. O que se viu, entretanto, foi uma aberração.

Em primeiro lugar, a história não só é recheada por tecnobaboseira, como é sustentada por ela! É sempre interessante vermos roteiristas criativos, inventando formas de vida que desafiam a compreensão, mas é preciso manter alguma coerência e algum contato com a realidade, para que a história seja divertida. Aqui o osso foi duro de roer.

O maior problema de todo o episódio (e não o único) é o fato de o enredo tratar o feixe do transporte como uma outra dimensão, no qual coisas, pessoas e bactérias podem entrar e sair. O feixe do transporte é meramente o efeito especial luminoso que representa a desmaterialização de alguma coisa e sua rematerialização em outro lugar. Não podem, de fato, existir pessoas ou vermes gigantes “guardados” no feixe.

E, como diz o ditado, quem sai na chuva, é para se molhar. Décadas de produção de Star Trek já mostraram que usar o transporte para qualquer outra coisa que não o mero ato de transportar é pedir encrenca. O roteirista Brannon Braga pediu, recebeu. O uso do sistema para “curar” Barclay só não é pior que o engenheiro agarrando um verme que se transforma em tripulante depois de materializado. Alguém poderia me dizer qual o sentido que isso faz?

É o tipo da coisa que irrita o telespectador: ver que o escritor só o manipulou, colocando os vermes lá para pensarmos que o engenheiro estivesse sob ataque de algum monstro, quando na verdade não era nada disso. Se houvesse uma boa explicação para o fato de tripulantes perdidos se manifestarem como vermes gigantes em feixes de teletransporte, até daria para engolir, com o nariz tapado e tomando água por cima. Mas, do jeito que ficou, só dá para chorar mesmo.

Perdido na tecnobaboseira e em conceitos absurdos, está Barclay, que só sobrevive graças à interpretação sempre brilhante de Dwight Schultz. Pelo menos o aspecto do drama humano está bem guardado com ele. Nesse sentido, o roteiro equilibra bem o humor com os desafios que as fobias e a hipocondria representam. E é a única coisa que realmente se salva daqui.

O resto está todo fora de lugar. Troi, que costuma ir razoavelmente bem quando o assunto é Barclay, desta vez abusa de seu poder e dispensa o engenheiro de seu serviço, numa atitude no mínimo precipitada. E a ameaça cardassiana citada no começo é jogada ali só para, mais uma vez, despistar a audiência da verdadeira (e horrível) natureza da história.

Do ponto de vista técnico, o diretor Cliff Bole tem a honra de dirigir algumas tomadas inovadoras, como a sensação de teletransporte em primeira pessoa, mas não há muito mais a se destacar. Nos efeitos visuais, aquele sistema binário não passa de uma reciclagem (ou, no máximo, de uma retocada) de material visto em “Evolution”, do terceiro ano. E os vermes que Barclay vê no feixe parecem saídos de um filme B de ficção. Terrível.

No fim das contas, “Realm of Fear” não é uma experiência tão traumática para a audiência quanto é para Barclay. Mas por pouca diferença…

Avaliação

Citações

“Reg, transporting really is the safest way to travel.”
(Reg, o transporte é realmente o jeito mais seguro de viajar.)
Geordi La Forge

Trivia

  • Brannon Braga gostou de escrever este episódio. “Certamente foi um dos meus episódio mais pessoais. As pessoas por aqui dizem que eu sou o Barclay. Eu odeio voar e é daí que veio a ideia. Se eu vivesse no século 24, eu teria medo de me transportar, então gostei de explorar algumas das neuroses mais profundas que Barclay tinha.”
  • Fã de Além da Imaginação, Braga escreveu o roteiro como uma homenagem a “Nightmare at 20,000 Feet”, episódio clássico com William Shatner em que um passageiro vê uma criatura do lado de fora da aeronave, mas ninguém acredita nele. Braga trocou “uma coisa na asa” por “uma coisa no transporte”.
  • O escritor também gostou muito do título, que soava como um da Série Clássica.
  • Michael Piller, o showrunner de saída, comentou: “Eu sempre gosto dos episódios do Barclay. Acho que é um medo perfeitamente válido a explorar, seja uma fobia de aranhas ou de ser molecularmente desmontado e depois remontado. Como espectadores de Star Trek, damos isso de barato, mas por que alguém não deveria ter medo de entrar num teletransporte?” Piller buscou reduzir as alusões a Além da Imaginação. “Senti fortemente que precisávamos afastar o episódio daquilo, e acho que tivemos sucesso.”
  • O planeta Zayra IV foi batizado em homenagem à associada da produção Zayra Cabot.
  • As criaturas foram projetadas por Dan Curry, supervisor de efeitos visuais, e construídas pelo modelista Carey Howe. Curry, coberto num traje verde, fez o manuseio das criaturas.
  • A cena espacial da gigante vermelha com a anã branca no setor Igo foi produzida originalmente para “Evolution” e voltaria a ser usada como um fenômeno estelar similar no sistema Topin, em “Preemptive Strike”.
  • As insígnias de patente de O’Brien aqui são trocadas de tenente (dois pips) para chefe (um pip preto). Isso foi feito para reforçar o ponto de que Barclay é oficial superior de O’Brien. Em Deep Space Nine, ele manteria esse padrão de oficial não comissionado.
  • Uma breve cena de Barclay pegando um copo d’água do replicador foi tirado de “The Vengeance Factor”, e o reflexo do uniforme de Riker é visível no interior do aparelho.
  • Quando Barclay pergunta se já aconteceu a La Forge algo estranho durante o transporte, ele diz que não – aparentemente se esquecendo do que rolou durante o episódio “The Next Phase”, da temporada anterior…
  • Jeri Taylor ficou intrigada com a resposta da audiência a este episódio. “Muitas pessoas não reagiram bem a ele e não sei por quê. Pensei que era uma ideia maravilhosa. Achei que Brannon escreveu um roteiro ótimo.” Ela achou que talvez tenham ido fundo demais nas explicações, em contraposição ao que haviam feito em “Time’s Arrow, Part II”.
  • Brannon Braga avaliou assim: “Os três primeiros atos são divertidos e aí a tecnologia entra no caminho. (…) Imaginei um episódio mais assustador, em que as criaturas do transporte eram um pouco mais assustadoras, mas essa era uma exigência grande para o pessoal dos efeitos. ‘Faça amorfos, mas assustadores’. O que isso quer dizer? É fácil de escrever, mas difícil de visualizar. Eu só queria que vocês se sentissem assustados com esse cara e vocês realmente nunca se sentiram.”

Ficha Técnica

Escrito por Brannon Braga
Dirigido por Cliff Bole

Exibido em 28 de setembro de 1992

Título em português: “Domínio do Medo”

Elenco

Patrick Stewart como Jean-Luc Picard
Jonathan Frakes como William Thomas Riker
Brent Spiner como Data
LeVar Burton como Geordi La Forge
Michael Dorn como Worf
Marina Sirtis como Deanna Troi
Gates McFadden como Beverly Crusher

Elenco convidado

Colm Meaney como Miles O’Brien
Patti Yasutake como Alyssa Ogawa
Dwight Schultz como Reginald Barclay
Renata Scott como almirante
Thomas Belgrey como tripulante
Majel Barrett como voz do computador

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Edição de Maria Lucia Rácz
Revisão de Susana Alexandria

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