DS9 3×03: The House of Quark

Ron Moore faz milagre e cria uma boa história com ferengis e klingons

Sinopse

Data estelar: Desconhecida

Os negócios vão mal para o bar do Quark, com a ameaça do Dominion. O único cliente da noite que sobrou é um klingon bêbado, de nome Kozak. Kozak quer colocar a sua conta “no pendura” e Quark obviamente não concorda com isso. Ele não gosta da recusa do ferengi em lhe dar crédito e saca sua faca. A luta entre os dois é breve e Kozak acaba caindo “de maduro” na sua própria lâmina e morrendo. Logo chegam Bashir e Odo para investigar o ocorrido e uma multidão começa a se formar do lado de fora do Quark´s, motivada por uma curiosidade mórbida em saber mais da morte do klingon.

Quark percebe uma oportunidade de ouro para aumentar os seus lucros e começa a contar (e interpretar) uma história em que ele venceu o klingon em combate. Apesar de Odo avisar que podem surgir parentes do morto na estação para procurar por vingança, Quark não liga, pois diz sempre poder contar a verdade se tal fato acontecer e se inocentar, e se proclama: “Quark, o carrasco dos klingons!”

Keiko informa a O’Brien que fechou permanentemente a sua escola por falta de alunos — o Dominion está realmente assustando todo mundo e o pessoal da estação está partindo em massa, daí o problema. O’Brien sente a sua esposa muito triste e que ela está em negação quanto a isso: não ter nenhuma função na DS9, muito menos ser uma botânica, a sua verdadeira profissão.

Logo em seguida, um klingon (de nome D’Ghor, dizendo ser irmão de Kozak) toma Quark de assalto e diz que veio à procura da verdade, que o assustado barman lhe dá sem pestanejar. Entretanto, o klingon indica que, se ele morreu em um combate com honra, não haveria motivos para vingança. Quark concorda e continua com sua farsa.

O’Brien planeja um jantar surpresa para Keiko, que parece aliviar a angústia dela por um tempo, mas, quando ele sai pra trabalhar na manhã seguinte, sente que nada mudou de verdade.

Em compensação, os negócios vão bem para Quark, com toda essa história de “carrasco klingon”. Eis que surge, no Quark’s, em uma noite após o fechamento da casa, uma klingon (Grilka, a viúva de Kozak) que também quer saber a verdade, o que ela rapidamente descobre e, em seguida, rapta Quark.

Em Kronos (mundo natal klingon), Tumek (braço direito de Grilka) conta a Quark que a mentira dele custou caro a Grilka. Se Kozak tivesse morrido em um acidente, o Alto Conselho poderia ter oferecido uma licença especial para ela tocar a sua casa por si própria, mas como ele “morreu de forma honrada em combate”, isso não poderá acontecer e, sem herdeiros machos, a Casa de Kozak irá à ruína e sua propriedade será tomada pela Casa de D’Ghor (que é na realidade um inimigo de longa data da Casa de Kozak e que já testemunhou perante o Alto Conselho Klingon sobre a “história” de Quark).

Grilka joga uma cartada arriscada dentro da lei klingon, que permite que aquele que matar um klingon em combate honrado pode tomar a sua viúva e sua casa. Grilka casa com Quark em uma cerimônia instantânea.

Na DS9, O’Brien pede permissão a Sisko para transformar um hangar de carga em um arboreto para Keiko cuidar e (espera ele) se sentir útil e feliz.

Grilka apresenta Quark ao Alto Conselho, para surpresa de todos. D’Ghor quer tomar todos os ativos da Casa de Kozak. Gowron fica em dúvida com essa confusão, diz que vai precisar de um tempo para pensar e formaliza a Casa de Kozak como a Casa de Quark por ora. O’Brien e Bashir conversam e o doutor diz que o arboreto vai ser apenas um paliativo e que Keiko nunca vai ser feliz se não puder ser uma botânica de novo.

Quark, percebendo que Grilka não tem mais nada na manga, se oferece para rever os registros financeiros de “sua casa”. Quark descobre imediatamente que D’Ghor vem atacando financeiramente e de modo sistemático a Casa de Kozak e agora também ficou como cobrador de todas a dívidas de jogo do falecido klingon. Quark apresenta seus achados para o Alto Conselho Klingon. D’Ghor nega tudo e traz evidência (o próprio Rom) de que Quark não matou Kozak e que este morreu em um acidente. D’Ghor demanda vingança em combate pessoal, pelas “calúnias” levantadas por Quark.

O ferengi, temendo pela sua vida, deixa a casa de Grilka, para a decepção da klingon, mas uma conversa com seu irmão sobre “respeito” o deixa pensativo.

No dia seguinte, Quark aparece para o combate com uma bat’leth em punho. Entretanto, logo no início da contenda, ele joga a arma de lado e se ajoelha e diz que não existe honra em permitir um combate entre um klingon e um ferengi. Não é uma luta; é uma execução. D’Ghor não liga a mínima e já se prepara para decapitar Quark, mas Gowron intervém e diz agora acreditar nas acusações de Quark e ordena um banimento para D’Ghor, que sai em desgraça. Gowron faz o melhor de todo esse circo, dando uma licença especial para Grilka poder comandar a própria casa. Agradecida, ela concede o divórcio a Quark e lhe dá um beijo de despedida.

De volta à estação, O’Brien toma uma decisão difícil e consegue uma vaga em uma missão de exploração agrobiológica em Bajor para Keiko (que vai poder levar Molly com ela, em uma missão que pode durar até seis meses). Enquanto os O’Brien se beijam, Rom pede que Quark conte novamente a história do seu combate com D’Ghor e, mesmo fingindo não ser lá grande coisa, Quark não pode deixar de pensar no respeito que ele conquistou aos olhos do seu irmão.

Comentários

O bizarro encontro entre os ferengis e os klingons consegue atingir resultados até satisfatórios (ainda que não fuja em momento algum da categoria do “fofinho e inofensivo”) e seu desenrolar consegue até mesmo injetar um pouco de fibra na pessoa de Quark. O episódio ainda traz O’Brien (o “homem comum” de Deep Space Nine), em uma pequena, doce e honesta história sobre o seu crônico problema conjugal (que chega a uma importante resolução aqui). Saibam mais detalhes, sem precisar matar um klingon e desposar a viúva do falecido no processo, nas linhas abaixo.

Ainda que a menção aos eventos de “The Search” seja um pouco tímida no episódio, as reações da população da estação frente à ameaça do Dominion fazem bastante sentido e levam ao declínio dos lucros de Quark e ao fechamento da escola de Keiko. Esse é o único elemento (além de ambas tratarem de temas familiares) que as duas histórias apresentadas no curso do segmento têm em comum.

A menor, mais séria e mais bem-sucedida das duas histórias do episódio é aquela que envolve o casal O’Brien, cujos  problemas conjugais têm raízes claras para a audiência desde o piloto da série (“The Emissary”): Keiko abriu mão de sua profissão para viver com o marido (promovido e transferido) na Deep Space Nine. Tal problema é trazido claramente à tona e tratado de uma forma sensível e sincera.

As maneiras diferentes como Sisko e Bashir tentam ajudar O’Brien são totalmente condizentes com a relação que o chefe tem com cada um deles, e o fato de Bashir ser mais efetivo só reforça essa ideia. Foi também bastante interessante (e irônico) ver justo Bashir dando conselhos maritais para O’Brien, especialmente à luz do que foi discutido pelos dois em “The Armageddon Game”. A decisão final de O’Brien faz sentido em termos de razão e emoção. Quanto a essa história (entre Keiko e O’Brien), somente a pequena cena residual envolvendo Kira e Dax salta aos olhos como realmente fraca. Tivemos uma ótima “despedida” para Keiko (e Molly).

Um encontro entre os ferengis e os klingons tinha tudo para se tornar um fracasso colossal. Felizmente, foi trilhado um caminho moderado em que fica bem entendido desde o início que a maior piada é simplesmente colocar os dois diametralmente opostos modos de vida lado a lado e ver o que acontece (e o roteiro faz um bom trabalho em justificar tal encontro a maior parte do tempo).

Fortaleceu o episódio termos elementos a bordo que apontam para um importante (e sério) evento: duas grandes casas rivais, uma figura nobre e extremamente leal a Grilka (Tumek), toda a estrutura de poder klingon (o “grande salão klingon”, o Alto Conselho e o chanceler Gowron) e mesmo o banimento de D’Ghor no final.

Kozak foi patético (felizmente, isso fazia parte da premissa do episódio — levantar a questão da “honra klingon” sendo mais uma ferramenta de marketing para os estrangeiros, do que qualquer outra coisa) e mal atuado (isso nunca faz parte de premissa nenhuma). D’Ghor foi definitivamente o elo fraco, um vilão absolutamente bidimensional sem a menor qualidade redentora, e a atuação de Carrasco não ajudou em nada também (em mãos mais capazes uma escolha mais cômica poderia funcionar dentro do contexto do segmento, o personagem como apresentado foi simplesmente “um saco” de se assistir do começo ao fim). A extrema transparência de D’Ghor, que, sem pestanejar, iria executar Quark ao final, foi a pior coisa dessa parte da história (e “uma fácil saída” para os produtores, devo reconhecer).

Faltou Grilka dentre os klingons. Uma boa coisa do roteiro foi não mostrar (um grande clichê para “histórias com viúvas”, por sinal) Grilka se lamentando pelos seus anos com Kozak, implicitamente difíceis, ou mesmo por sua perda, implicitamente um alívio. Ela parece acreditar realmente no conceito da sociedade klingon e só querer seguir com sua vida sem mágoa ou ressentimento (uma noção positiva e interessante). O final, em que Gowron dá permissão para ela cuidar de sua própria casa, parece entender e passar esta noção. Ela vai liderar uma casa que aparentemente ela já vinha liderando há muito tempo (se considerarmos a “ficha corrida” do defunto).

Não foi suficiente que Quark tivesse derrotado D’Ghor na “arena ferengi”, ele precisava também fazê-lo na “arena klingon”. Ele o fez, sim, mas não pelo combate (que equivaleria a um suicídio), mas com um apelo à “honra” que aquele local (teoricamente) deveria representar. Ele não deu uma solução fácil para Gowron e o resto do conselho, que vivia de um líder de uma grande casa matando um outro, mas os fez pensar no que realmente estava em jogo ali (além do transparente D’Ghor ter dado uma “força” no final, para que Gowron tomasse tal decisão, é claro). Rom foi um fiel escudeiro e um bom irmão para Quark (o que foi o suficiente para os propósitos do episódio).

Les Landau é usualmente um diretor com um toque suave, tanto no trato da câmera quanto no dos personagens, o que casa muito bem com o presente episódio. O diretor parece incentivar o trabalho dos atores ao fundo das tomadas, o que pode ser visto com clareza nas reações da multidão quando Quark conta pela primeira vez a sua história no bar. Foi uma ótima ideia começar e terminar o episódio com cenas gêmeas, com Rom e Quark no bar. É sempre um prazer reencontrar o cenário do “grande salão klingon”. Talvez a única real patinada de direção tenha sido a forma como a tristeza de Keiko foi capturada no início, olhando paras as suas plantas nos seus aposentos. Foi meio grosseiro.

Shimerman trabalhou muito bem com Kay Adams (existe uma coisa bem fluida entre os dois) e com Grodénchik, a primeira vez que Quark conta a história foi interessante e a cena final do combate foi o seu ponto alto.

Meaney também foi muito bem. Os jantares e o projeto do arboreto poderiam soar extremamente chauvinistas em mãos menos capazes. Meaney nos faz acreditar integralmente na sinceridade do personagem o tempo todo. Um grande bônus vai para a expressão de absoluta descrença de El Fadil quando Quark conta a sua história pela primeira vez. Os demais regulares só cumpriram tabela.

Kay Adams mostrou bastante carisma e boa química com Shimerman (além de não demonstrar nenhum pudor em cenas mais “esquisitas” como a do “casamento”, com direito a uma rápida faca na garganta do “noivo” e a do divórcio — a “cena da mão na coxa” foi ótima). Ruskin, além de ter “a voz”, trouxe também uma bela atuação. O’Reilly foi uma boa presença, com seus olhos infinitamente abertos e uma atitude ponderada. Grodénchik segurou o seu lado mais histriônico esta semana e definitivamente foi mais interessante de assistir. Chao honrou o pagamento e Carrasco e Bennett foram simplesmente péssimos.

Acredito que o ritual realizado por Grilka corresponda à “versão Las Vegas” da cerimônia de casamento klingon. Em “You Are Cordially Invited”, da sexta temporada, vamos ver um real casamento klingon (entre Worf e Jadzia Dax), com uma cerimônia extremamente complexa.

Para os que acharam absurdo o encontro de Quark (e dos ferengis) com os klingons, se preparem para o encontro dos ferengis com os profetas em “Prophet Motive“, nesta mesma temporada.

Não sou da segurança da Frota Estelar, mas tivemos mais um rapto na estação esta semana. Por onde andará o tenente-comandante Eddington?

Uma sociedade que preza tanto a honra quanto a sociedade klingon, teria de ter uma “equipe forense de honra” (ou coisa parecida) para determinar o que acontece realmente em mortes como a de Kozak. Seria interessante ver tal “equipe” em operação aqui. Uma boa desculpa para a sua não utilização aqui também seria bem-vinda. Será a ausência de tal “equipe” mais um indício de que esta história de “honra klingon” é mais propaganda do que qualquer outra coisa, como o episódio sugere por várias vezes?

É difícil imaginar que não existam contadores klingons (apesar do velho clichê de “pasteurização das raças” em Jornada sempre querer dizer o contrário). Eles definitivamente devem sofrer um extremo preconceito, mesmo que teoricamente estejam tentando defender o Império e viver com honra ao seu modo e no seu trabalho. Vamos conhecer um advogado klingon em “The Rules of Engagement“, da quarta temporada da série.

“The House of Quark” é um bom episódio, que consegue fazer funcionar (em sua história principal) uma premissa extremamente arriscada: o encontro entre os ferengis e os klingons. Estabelecendo situações e deixando a comédia nascer dessas situações naturalmente (a maior parte do tempo), o episódio traz bom entretenimento, ainda que tenha a “consistência de um marshmellow derretido” (TM). Dito isso, o real destaque da semana vai para a pequena joia de história (secundária) envolvendo a família O’Brien, que chega a uma satisfatória conclusão aqui.

Avaliação

Citações

“When Morn leaves, it’s all over.”
(Quando o Morn sai, está tudo acabado.)
Quark

You can’t ask her to turn a profession into a hobby.
(Você não pode pedir que ela transforme uma profissão em um hobby.)
Bashir

Trivia

  • Após o seu primeiro roteiro em Deep Space Nine, “The Search, Part I“, Ron Moore já tem uma nova tarefa e agora em um assunto em que ele conhece como ninguém. De fato, após escrever “Sins of the Father” (clássico da terceira temporada de A Nova Geração), um verdadeiro divisor de águas para a espécie de Worf, Ron passou a ser referido pelos seus colegas de staff como o “guru dos klingons”.
  • A história do episódio foi sugerida pelo editor (montador) Tom Benko: “Quark mata um klingon em defesa própria, ganha fama de pistoleiro e tenta lucrar com tal situação”. Ron admite que o staff de A Nova Geração sempre tentou se afastar um pouco do humor em seu produto final e que ele sempre quis explorar um lado mais cômico envolvendo os klingons e agora (com a história de Benko) a chance parecia finalmente ter surgido. Benko teve uma experiência única em montar uma história cujo o conceito ele mesmo produziu.
  • Este episódio marca a “despedida de Keiko e Molly da estação”. Elas apareceriam apenas esporadicamente daqui pra frente. Isso abriu caminho para a carreira cinematográfica de Colm Meaney e para o aprofundamento da amizade entre Bashir e O’Brien, um dos maiores desejos de Ira Steven Behr.

Ficha Técnica

História de Tom Benko
Roteiro de Ronald D. Moore
Dirigido por Les Landau

Exibido em 10 de outubro de 1994

Título em português: “A Casa De Quark”

Elenco

Avery Brooks como Benjamin Lafayette Sisko
René Auberjonois como Odo
Nana Visitor como Kira Nerys
Colm Meaney como Miles Edward O’Brien
Siddig El Fadil como Julian Subatoi Bashir
Armin Shimerman como Quark
Terry Farrell como Jadzia Dax
Cirroc Lofton como Jake Sisko

Elenco convidado

Rosalind Chao como Keiko O’Brien
Mary Kay Adams como Grilka
Carlos Carrasco como D’Ghor
Max Grodénchik como Rom
Robert O’Reilly como Gowron
Joseph Ruskin como Tumek
John Lendale Bennett como Kozak

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Edição de Muryllo Von Grol
Revisão de Nívea Doria

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