Guia de Episodios ENT 01 x 008. Breaking the Ice

Segmento trabalha bem relações entre
Vulcanos e humanos, via T’Pol e Tucker

Publicado originalmente por Salvador Nogueira

Nota do TB: 3.0 / 4.0

Sinopse:

 A Enterprise recebe uma comunicação da Terra, vinda de uma escola na Irlanda. Alunos do primário enviaram aos tripulantes alguns desenhos que eles fizeram inspirados pela exploração espacial, juntamente com algumas perguntas. Enquanto isso, Archer decide interromper o curso da nave para estudar um cometa, o maior já visto por humanos ou Vulcanos.

T’Pol informa que o interior do cometa possui de eisilium, uma substância rara de interesse para pesquisadores mas que nunca pôde ser obtida em grandes quantidades. O material está muito fundo no interior do objeto, de modo que o único modo de coletar amostras é enviando um grupo ao local para fazer escavações. Archer designa Malcolm Reed e Travis Mayweather para levar um shuttlepod até a superfície do cometa e conduzir as escavações.

Enquanto os oficiais se preparam para partir, uma nave Vulcana se aproxima da Enterprise. Archer abre comunicações com os alienígenas, para saber qual é o objetivo deles ali. Quem responde é o capitão Vanik, da nave Ti’Mur. Ele informa que os Vulcanos estão ali apenas para observar o estudo conduzido pela Enterprise no cometa.

Incomodado pela presença dos Vulcanos, Archer pergunta a T’Pol qual pdoeria ser a verdadeira razão para eles estarem ali. A primeiro-oficial diz que possivelmente não há segundas intenções por trás das atitudes Vulcanas, mas Tucker descobre que a própria T’Pol recebeu uma transmissão criptografada da Ti’Mur.

O engenheiro revela a descoberta a Archer. O capitão pede que Hoshi Sato decodifique a mensagem. Enquanto isso, a tripulação sênior da Enterprise (com exceção de Reed e Mayweather, que estão no cometa, e T’Pol, em seus aposentos) se reúne na ponte para responder à mensagem enviada da escola irlandesa da Terra.

Depois disso, Tucker recebe a mensagem decodificada enviada a T’Pol. Hoshi não se sentiu bem na posição de ler o conteúdo, e entregou a Tucker o texto original, ainda em Vulcano. O engenheiro alimentou o banco de dados línguistico da nave para obter uma tradução. Sua descoberta era de que se tratava de uma carta, de natureza pessoal, enviada pelos pais do noivo de T’Pol.

Ele descobriu que a primeiro-oficial deveria estar partindo para Vulcano para se casar, mas havia pedido um adiamento da cerimônia, para poder continuar servindo na Enterprise. Os pais de seu noivo, Kas, se sentiram ofendidos e se recusaram a adiar a cerimônia. Pela tradição Vulcana, T’Pol deveria voltar a seu planeta natal, se casar e passar ao menos um ano ao lado de seu marido. A primeiro-oficial enfrenta então um dilema: deixar ou não deixar a Enterprise.

Tucker revela a Archer que a carta tinha um conteúdo pessoal. O engenheiro se mostra desconcertado de ter invadido a privacidade da Vulcana, mas seu capitão recomenda que ele esqueça tudo, já que não havia passado de um engano. Tucker, entretanto, não se sente bem com isso e decide que precisa contar a T’Pol o que aconteceu. Ele o faz, despertando um certo ressentimento por parte dela.

Enquanto isso, Archer convida Vanik para um jantar a bordo da Enterprise, na esperança de que possa agir cordialmente e convencer o Vulcano a deixar logo a área. O contato entre o Vulcano e os humanos é, para dizer o mínimo, áspero, criando mais hostilidade em vez de apaziguar os ânimos. Vanik volta para sua nave, mas a Ti’Mur permanece nas redondezas.

Na superfície do cometa, Reed e Mayweather plantam um explosivo para abrir o local da escavação. A explosão abre um buraco no solo, como previsto, mas oferece um efeito colateral indesejado –induz o cometa a uma nova rotação. O ponto em que os oficiais estavam (no pólo e longe da luz direta da estrela) entrará no campo de iluminação em breve. Como resultado, a superfície sofrerá rachaduras, ameaçando a sobrevivência da dupla.

Na Enterprise, T’Pol, por recomendação do dr. Phlox, decide chamar Tucker para conversar, na tentativa de resolver seu dilema. Ela insiste que seu dever maior é para com sua cultura, enquanto o engenheiro acha que ela deveria fazer o que achar melhor para ela. Os dois acabam se desentendendo mais uma vez, mas T’Pol acaba tocada pelas palavras de Tucker.

Enquanto isso, Reed e Mayweather se apressam para deixar o cometa. O piloto sofre uma contusão, o que dificulta a evacuação rápida dos dois. O chão começa a se quebrar, com a incidência da luz sobre ele, e o shuttlepod, já com os dois dentro, acaba caindo 18 metros por uma rachadura, ficando incapacitado de sair por seus próprios meios. A Enterprise vai ao resgate, tentando erguer o pod com um cabo, mas fracassa. T’Pol revela a Archer que em breve aquela região estará novamente escura, e a rachadura era se fechar com o pod dentro.

Vanik contata a Enterprise e oferece ajuda. Com o raio trator de sua nave, seria fácil tirar o pod de lá, mas Archer diz que tem tudo sob controle. Com o tempo se esgotando, T’Pol e Tucker acabam convencendo o capitão de que será no melhor interesse de sua tripulação e das relações entre Vulcanos e humanos que ele aceite a oferta de Vanik. Assim, o pod com Reed e Mayweather é resgatado. Com o fim da expedição, a Ti’Mur decide deixar a área, mas T’Pol pede que ela leve uma mensagem a Vulcano, dizendo que ela decidiu permanecer a bordo da Enterprise.

 

Comentários:

“Breaking the Ice” é um excelente episódio de desenvolvimento de personagens, como há muito não se via em Jornada nas Estrelas. Pela primeira vez o relacionamento entre T’Pol e Tucker, tenso desde o início da série, recebe a atenção devida, e o resultado não deixa a desejar.

T’Pol se mostra aqui em condição de fragilidade –claramente seu convívio com humanos está afetando sua maneira de ver o mundo. Fossem outros tempos, a Vulcana não hesitaria em voltar a seu planeta para o casamento, mas a absorção dos conceitos de livre arbítrio dos indisciplinados seres da Terra mostrou que talvez seja possível adotar outro modo de vida.

Também vemos a diferença entre T’Pol e os outros Vulcanos quando temos a chance de observar ela e Vanik juntos, jantando com Archer e Tucker. Vanik é o Vulcano padrão de Enterprise até aqui –pouco afeito à humanidade e a seus métodos, grosseiro e totalmente descortês. Entretanto, ele mostra que não é um inimigo para os humanos, apenas que não tem muito interesse neles ou vontade de conhecê-los.

A caracterização de Vanik pode ser mais um tiro n’água em uma série que aparentemente trata os Vulcanos quase como vilões, em vez de mocinhos, como nos acostumamos a ver nos séculos posteriores. Entretanto, nada pode estar mais longe da verdade. A caracterização dos Vulcanos em Enterprise está bem compatível com o que deveria ser. Vejamos: em primeiro lugar, abandonemos o maniqueísmo. Nenhuma espécie é boa ou ruim por definição. Cada uma age de acordo com sua filosofia e seus interesses.

Os Vulcanos têm por norma contatar civilizações quando elas atingem a capacidade de dobra espacial –justamente para evitar que eles sofram prematuramente com conflitos espaciais. Essa atitude paternal pode muitas vezes ser confundida com “sabotagem”, uma vez que os Vulcanos fazem uma tremenda força para não ajudar ninguém a desenvolver sua tecnologia mais rápido que o normal. Se dependesse deles, os humanos ainda estariam confinados ao próprio Sistema Solar no século 22.

Mas se eles estão tão interessados com a segurança de outras espécies, por que então tratam a humanidade tão mal, como se fossem inimigos? Na verdade, a posição Vulcana parece ser muito mais hostil do que é na realidade. O problema é que a maioria dos Vulcanos simplesmente não sabe como agir de acordo com as normas de bom comportamento humanas. Seres acostumados à lógica e à falta de emoções não precisam agir se preocupando em não ferir sentimentos ou o orgulho alheios.

Vanik ecoa muito bem a filosofia e a psique Vulcanas, sendo totalmente hostil e antipático, mas ainda assim prestativo e pacífico. No fundo, a mensagem que está sendo passada é a de que tanto Vulcanos como humanos terão de aprender muito até poderem conviver em harmonia. E é esse mesmo conflito que é representado em microescala por T’Pol e Tucker, a bordo da Enterprise.

O contato entre os dois –representando a contraposição dos modos de pensar Vulcano e humano– é muito fértil, e o resultado final, com T’Pol adotando a “coisa humana a ser feita” e abandonando seu casamento, mostra muito bem que os Vulcanos também têm o que aprender com a humanidade. Para quem viu até agora na série T’Pol dando um monte de bolas dentro e Archer, representando a humanidade, cometendo um monte de erros, o desfecho dessa situação é bastante positivo.

Não que Archer e seus comandados não voltem a cometer das suas bobagens aqui –quase dois tripulantes são mortos por imperícia e, depois, por orgulho de seu capitão. Sorte que, como diz Archer, “sempre há uma nave Vulcana por perto” para ajudar.

O lado “ação” desse episódio fica limitado ao que acontece no cometa. Embora o foco maior da história fique para os relacionamentos a bordo da nave, a porção dedicada à situação de Reed e Mayweather ajudou a adicionar um pouco de agito (e efeitos especiais) ao episódio. Apesar de ser incômodo ver dois tripulantes caminhando sobre um cometa como se a gravidade fosse a da Terra, de resto, os elementos científicos são muito bem tratados, adicionando à verossimilhança da série.

Aliás, por falar em verossimilhança, muito interessante e divertida a cena em que os tripulantes respondem a perguntas enviadas por estudantes. A sequência é muito boa por vários motivos. Além de lembrar a uma potencial nova audiência sobre a premissa da série, serve também para relembrar aos telespectadores que este programa está cobrindo o meio tempo entre a exploração espacial atual e a feita por Kirk, Spock e McCoy. Vale lembrar que é bastante comum astronautas hoje em dia, tanto no ônibus espacial quanto na Estação Espacial Internacional (ISS), responderem a perguntas enviadas por alunos. Uma bela homenagem ao programa espacial atual.

Já a queda do shuttlepod pela rachadura do cometa, apesar de bem feita, causa um déja vù, depois de termos visto cena semelhante em “Terra Nova”. Se uma das duas cenas tivesse que ser deletada da história de Jornada, seria muito melhor excluir a de “Terra Nova”, que não teve propósito algum. Em“Breaking the Ice” o incidente faz muito mais sentido e dá muito mais emoção ao segmento. Pena que não tenha sido uma novidade.

No tocante aos personagens regulares, Phlox teve uma curta mas relevante aparição, Sato teve uma ligeiramente mais discreta e menos importante e Reed, embora tenha tido a chance de explodir um cometa, não marcou forte presença. Mas também não comprometeu. O ponto fraco do elenco continua sendo Mayweather –apesar de ter tido a chance de participar ativamente da missão, o pobre piloto continua mais inexpressivo e idiota do que nunca. Além de ir a um cometa para construir um boneco de neve, o alferes ainda fez o favor de se ferir (e olhem que, por sua natureza “espacial”, ele deveria ser o mais adaptado a um ambiente de baixa gravidade) e colocar as vidas dele e de Reed no processo. O personagem está seriamente ameaçado, e um episódio que o enfoque decentemente é urgentemente necessário.

No fim das contas, “Breaking the Ice” consegue costurar e relacionar várias histórias diferentes, representando vários planos de realidade. O nome do episódio reflete bem a tarefa realizada. “Quebrar o gelo” refere-se não só à óbvia exploração do interior do cometa, mas também das relações entre T’Pol e Tucker e, num plano mais amplo, entre Vulcanos e humanos. Nesse último ponto, só faltou alguma referência, por menor que fosse, ao episódio anterior, “The Andorian Incident”, que sem dúvida deveria ser um marco nas relações interplanetárias entre Terra, Vulcano e Andoria.

 

Citações:

Archer – “You’re up for a little comet walk?”
(“Vocês estão a fim de uma pequena caminhada por um cometa?”)

Vanik – “You are a long way from Earth, captain. Are you lost?”
(“Você está bem longe da Terra, capitão. Está perdido?”)

Archer – “There’s one from Molly McCook. ‘When you flush the toilet, where does it go?’ That sounds like an engineering question. So I’ll ask commander Charles Tcuker, our chief-engineer. (…) Trip?”
(“Aí vem uma de Molly McCook. ‘Quando vocês apertam a descarga, onde isso vai?’ Isso parece com uma questão de engenharia. Então perguntarei ao comandante Charles Tucker, nosso engenheiro-chefe. (…) Trip?”)
Tucker – “Pause it, will ya? (…) A poop question, sir? Can’t I talk about the warp reactor or the transporter?”
(“Pause, pode ser? (…) Uma pergunta de cocô, senhor? Não posso falar sobre o reator de dobra ou o transporte?”)

Tucker – “(…) Hold on. They’re gonna think I am the sanitation engineer.”
(“(…) Pare aí. Eles vão pensar que eu sou o engenheiro sanitário.”)
Archer – “You’re doing fine.”
(“Você está indo bem.”)

Tucker – “Did you ever do anything totally by mistake that you weren’t very proud of?”
(“Você já fez algo totalmente por engano de que não seja muito orgulhosa?”)
T’Pol – “No.”
(“Não.”)
Tucker – “Did you ever.. come across something that you thought was one thing, so you reacted in a certain way, but then it turned out to be something completely different…”
(“Você já… viu uma coisa que pensasse que era uma coisa, e então você reagiu de um certo modo, mas então acabou que era algo completamente diferente…”)
T’Pol – “Your point, commander?”
(“Onde quer chegar, comandante?”)
Tucker – “I found out about your message from the Vulcan ship.”
(“Eu descobri a mensagem que você recebeu da nave Vulcana.”)

Archer – “You know, for people who claim not to be explorers, you sure do get around…”
(“Sabe, para pessoas que dizem não ser exploradores, vocês certamente passeiam bastante…”)
Vanik – “I hope our presence here is not proving inconvenient.”
(“Espero que nossa presença aqui não esteja sendo inconveniente.”)
Archer – “On the contrary. It is nice to know, no matter how big the Universe is, there’s always a Vulcan ship nearby.”
(“Pelo contrário. É bom saber que, não importa quão grande seja o Universo, sempre há uma nave Vulcana por perto.”)

Tucker – “Sound to me like you already made up you mind. Why the hell did you ask me here?”
(“Parece para mim que você já se decidiu. Por que diabos me chamou aqui?”)
T’Pol – “It was a mistake. I apologize.”
(“Foi um engano. Eu peço desculpas.”)

Archer – “What was that all about?”
(“O que foi tudo isso?”)
Tucker – “It is personal.”
(“É pessoal.”)


Trivia:

int.jpg (476 bytes) Esse episódio lida com o noivado de T’Pol. A atriz que a interpreta, Jolene Blalock, comentou a situação mostrada no episódio. “Sim, ela é noiva. E está lidando com o que fazer, porque obviamente você não pode ter um relacionamento, emocional or não, em qualquer espécie, e ter um emprego numa nave estelar. E este é o dilema. Ela terá de lidar com isso. O casamento será adiado, T’Pol irá resolvê-lo, ou ela vai ficar com a nave, ou o quê?”

int.jpg (476 bytes) Andre Bormanis, que por anos foi consultor científico deJornada e agora conquistou uma posição entre os roteiristas da série, comentou o uso de ciência neste episódio. “Saímos do nosso curso para acertar com a ciência neste episódio, e isso realmente ajudou a história”, disse.

int.jpg (476 bytes) O episódio marcou a estréia de Maria Jacquemetton e Andre Jacquemetton como roteiristas de Enterprise. Além disso, apresentou o retorno de Dennis McCarthy ao comando musical da série. McCarthy já cria trilhas para Jornada há tempos (entre os destaques, ele criou a música-tema de Deep Space Nine e a trilha do filme “Generations”). Em Enterprise ele já havia musicado o piloto, “Broken Bow”, e o episódio “Strange New World”.

 

Ficha técnica:

Escrito por Maria Jacquemetton & Andre Jacquemetton
Direção de Terry Windell
Exibido em 07/11/2001
Produção: 008

Elenco:

Scott Bakula como Jonathan Archer
Jolene Blalock como T’Pol
John Billingsley como Phlox
Anthony Montgomery como Travis Mayweather
Connor Trinneer como Charlie ‘Trip’ Tucker III
Dominic Keating como Malcolm Reed
Linda Park como Hoshi Sato

Elenco convidado:

William Utay como capitão Vanik