Riker enfrenta dilema pessoal e Picard é subjugado pelos borgs em cliffhanger épico
Sinopse
Data estelar: 43989.1
A Enterprise visita Jouret IV, após receber um pedido de socorro, mas descobre que a a colônia New Providence foi simplesmente arrancada da superfície, deixando uma cratera em seu lugar. O almirante Hanson, acompanhado da comandante Shelby, vem a bordo para investigar o caso, e há a suspeita de que os borgs sejam responsáveis. A ambiciosa oficial coordena a resposta da Frota Estelar à ameaça borg, mas ela também tem ou outro objetivo: assumir o posto de Riker na Enterprise, já que ele recebeu mais uma oferta de comando, desta vez da USS Melbourne.
O conflito incomoda Riker. Shelby se antecipa a ele, contrariando ordens, ao comandar um grupo avançado ao planeta. As leituras confirmam: foram de fato os borgs. De volta à Enterprise, Riker tenta enquadrá-la, mas sem sucesso. Ela não perde uma oportunidade de se projetar sobre ele — até mesmo no pôquer. Riker, por sua vez, hesita em deixar seu posto de primeiro oficial para assumir a capitania. Até mesmo Picard tenta convencê-lo a aceitar.
O almirante parte para discutir a repercussão do caso com o Comando da Frota Estelar, e a Enterprise acaba encontrando um cubo borg. Os alienígenas querem que Picard se entregue, por motivos desconhecidos. Ele naturalmente se recusa, e a única escapatória para a nave foi se esconder na nebulosa Paulson. Os borgs usam cargas para tentar fazer a Enterprise sair, enquanto a tripulação discute opções. Shelby propõe a separação do disco, é rechaçada por Riker e leva a ideia diretamente ao capitão. Picard concorda que não é a hora, mas o momento pode chegar. Na engenharia, La Forge e Wesley trabalham para tornar o escudo defletor uma arma poderosa.
Encurralada, a Enterprise sai da nebulosa e é atacada pelos borgs, que abordam a nave e raptam Picard. Riker assume o comando, e o cubo parte em alta dobra para o Setor 001, onde fica a Terra. Shelby comanda um grupo avançado para tentar parar a nave borg e resgatar Picard. Mas ele foi transformado em um borg: um porta-voz chamado Locutus.
O resgate fracassa, mas as ações do grupo avançado pelo menos tiram a nave borg de dobra. Sem opção e sem tempo, Riker ordena o acionamento do escudo defletor, como a única arma capaz de destruir os inimigos…
Comentários
“The Best of Both Worlds” entra facilmente em qualquer lista dos melhores episódios de A Nova Geração, se não for o melhor de todos eles. Trata-se de uma combinação explosiva e potente de aventura, drama, altíssimos riscos e desenvolvimento de personagem, sobretudo para Picard e Riker. São os melhores traços de Michael Piller, num dos roteiros mais inspirados dele em toda a franquia.
Picard passa por um momento transformador, ao ser convertido em Locutus e subvertido em um autômato traidor. E o fato de o episódio terminar em um cliffhanger, com desfecho em aberto, não só é aqui uma grande novidade para Star Trek, como também coloca em risco claro um dos elementos mais importantes da série: o próprio capitão da Enterprise.
Os fãs passaram meses, entre o fim da terceira temporada e o início da quarta, sem saber se Patrick Stewart voltaria à série ou mesmo se Locutus poderia ser retransformado em Picard, após o que aconteceu aqui. Isso jamais havia sido tentado antes na saga e inaugurou uma longa tradição de cliffhangers entre temporadas — nem sempre com tanta potência e dramaticidade.
Os eventos ocorridos com o capitão aqui terão repercussões a longo prazo, não só nos episódios seguintes, mas também no filme Jornada nas Estrelas: Primeiro Contato e na série Picard, sempre induzindo interpretações potentes de Patrick Stewart. Contudo, se analisarmos apenas “The Best of Both Worlds” pelos seus 45 minutos, este é um episódio na verdade focado em Will Riker.
E nunca houve, antes ou depois, melhor exploração do personagem. O conflito dele em deixar ou não a Enterprise para assumir outra nave (no que já é a terceira vez que a Frota Estelar lhe oferece um comando) é muito bem trabalhado nos diálogos, quando ele conversa com Troi e Picard, e acaba ganhando um reforço extra com a introdução da comandante Shelby, uma oficial ambiciosa, competente e proativa muito bem interpretada por Elizabeth Dennehy. O conflito constante entre Riker e Shelby ajuda a manter a tensão durante a primeira metade do episódio, que vive mais de reuniões que de ação.
A segunda metade, após o encontro com os borgs, é eletrizante, reforçada por excelentes sequências de efeitos visuais e uma trilha sonora composta por Ron Jones que está entre as mais marcantes de toda a série. Os borgs em si estão muito parecidos com os que vimos em “Q Who”, da segunda temporada, bem como o que vemos do interior da nave borg (com cenários claustrofóbicos e pequenos, que o diretor Cliff Bole filma muito bem para dar dinâmica à tentativa de resgate de Picard, no fim do episódio). Como os valores de produção para eles já eram altos na segunda temporada, a apresentação aqui não ficou com nada a dever ao que de melhor se podia fazer em televisão em 1990.
Os borgs, por sua vez, são muito bem utilizados. Seu caráter coletivo, impessoal, torna difícil escrever suas participações como vilões convencionais. Michael Piller resolve o problema usando-os com parcimônia. Passamos a maior parte do tempo falando deles, em vez de vê-los. E quando eles finalmente surgem, não desapontam, oferecendo o maior perigo já enfrentado pela Enterprise na série. Um grande episódio, que combina em uma tacada só o que de melhor A Nova Geração é capaz de oferecer, tanto em drama pessoal como em narrativa épica.
Avaliação
Citações
“This is… just another page in history, isn’t it? Will this be the end of our civilization? Turn the page.”
(Essa é… apenas outra página da história, não é? Será este o fim de nossa civilização? Vire a página.)
Picard a Guinan, antes de enfrentar os borgs
“I am Locutus… of Borg. Resistance… is futile. Your life, as it has been… is over. From this time forward… you will service… us.”
“Mister Worf… fire.”
(Eu sou Locutus… dos borgs. Resistir… é inútil. Sua vida, como tem sido… acabou. A partir deste momento… você irá servir… a nós.)
(Senhor Worf… fogo.)
Locutus e Riker
Trivia
- Michael Piller não sabia como esse episódio em duas partes ia terminar quando se sentou para escrever o segmento final da temporada. Ele sabia que seria um cliffhanger e precisava criar ansiedade para o retorno da série na temporada seguinte.
- Durante toda a terceira temporada, Piller e sua equipe tentaram trazer os borgs de volta, mas duelavam com a dificuldade de escrever uma história com uma espécie totalmente impessoal. Vários membros da sala de roteiristas sugeriram a criação de uma “abelha rainha” para agir como porta-voz, mas Piller resistiu. “Para mim, havia algo especial e assustador sobre os borgs que sua falta de personalidade trazia. Para uma série que vive de e se especializa em personagens, ser desafiado e potencialmente destruído por um vilão impessoal parecia, para mim, um tipo especial de ameaça. Mas quando começamos a falar sobre o cliffhanger e os borgs, realmente discutimos sobre quem seria a abelha rainha.”
- Foi então que Piller teve o estalo: isso poderia ser resolvido se Picard fosse assimilado. “Tudo se encaixou no lugar. Eu disse: ‘Já sei. Picard será a abelha rainha’.”
- Numa versão inicial da história, Picard e Data seriam combinados em uma única unidade borg. Piller explicou por que isso caiu. “Alguém perguntou: ‘Por que eles fariam isso?’ E não tínhamos uma boa resposta, então derrubamos a ideia.”
- Para preencher o resto da trama, Piller buscou manter o drama humano entrelaçado com o espetáculo. Como resultado, o personagem central da história mudou de Picard para Riker. “Nós não tínhamos ideia de que seria realmente uma história do Riker quando começamos. Eu bolei a ideia de termos a personagem Shelby vindo a bordo para desafiar Riker. Isso parecia jogar com as emoções de Riker e o conflito sobre aceitar ou não o posto, e isso se compõe com a questão de se ele era bom o suficiente ou não para pegar o assento central.”
- Outra razão que Piller listou para criar Shelby foi explorar melhor a motivação de Riker para ficar na Enterprise, já que essa era a terceira oferta de comando para ele. Claro, o real motivo era manter Jonathan Frakes no elenco, mas era preciso explorar isso do ponto de vista ficcional.
- Piller pretendia que esse final de temporada fosse sua última contribuição para A Nova Geração, já que ele tinha um contrato de um ano. E seu conflito pessoal sobre deixar ou não a série acabou refletido no dilema de Riker no episódio. “No fim da temporada, eu estava duelando com ficar ou sair. E isso apareceu no roteiro de ‘The Best of Both Worlds’”, disse. “Conforme eu escrevia, me vi na posição de Riker, que estava tentando decidir se queria sair da nave ou não. Muito do que aconteceu na primeira parte era o que estava acontecendo na minha cabeça. Riker falando com Troi sobre por que ele não saiu. Isso era realmente eu falando através do Riker.”
- Coube a Gene Roddenberry convencer Piller a ficar para o quarto ano, argumentando que agora a série realmente havia encontrado sua voz e iria decolar.
- A doutora Crusher foi incluída no grupo avançado que tenta resgatar Picard a pedido de Gates McFadden, que queria ter a chance de fazer cenas de ação com feiser.
- O ator George Murdock, que aqui faz o almirante Hanson, já havia aparecido em Jornada nas Estrelas V: A Última Fronteira, como “Deus”.
- A atriz Elizabeth Dennehy achou bem difícil fazer o papel de Shelby nessa primeira parte, devido ao excesso de falas técnicas da personagem. E, para Jonathan Frakes, “esse foi um dos melhores cliffhangers de todos os tempos”.
- O diretor Cliff Bole destacou que a Paramount concedeu um orçamento um pouco melhor para o episódio final da temporada. E, para ele, este e sua continuação foram os episódios que ele mais gostou, dentre todos que dirigiu na série. Segundo o produtor associado Peter Lauritson, este final de temporada teve cerca de oitenta tomadas de efeitos visuais.
- O diretor assistente Chip Chalmers lembra de um momento engraçado das filmagens, em que Patrick Stewart, vestido de Locutus, vai fazer sua cena final. Ele caminha para a câmera e diz: “Eu sou Locutus dos borgs. Você já considerou comprar um Pontiac?” Todo mundo caiu na risada.
- Michael Piller previu o impacto do episódio, ao dizer em memorando, antes da exibição, que ele “pode gerar uma publicidade decente se a Paramount souber explorar adequadamente”.
- Para Ronald D. Moore, este episodio marcou um novo patamar para A Nova Geração. “Nós já estávamos escrevendo novos episódios [para a quarta temporada] quando o finale da terceira temporada, ‘The Best of Both Worlds’, foi exibido, e aí tudo explodiu. Aquele episódio, o primeiro cliffhanger de Star Trek, tocou a audiência, e de repente todo mundo estava falando sobre A Nova Geração. Estávamos vendo clippings de imprensa de toda parte com repercussão e como foi louco ver Picard ser borguificado em Locutus, e com foi incrível Riker gritando “Fogo!” antes de o episódio acabar.”
- O episódio foi indicado para um Emmy de melhores efeitos visuais.
Ficha Técnica
Escrito por Michael Piller
Dirigido por Cliff Bole
Exibido em 18 de junho de 1990
Título em português: “O Melhor de Dois Mundos”
Elenco
Patrick Stewart como Jean-Luc Picard
Jonathan Frakes como William Thomas Riker
Brent Spiner como Data
LeVar Burton como Geordi La Forge
Michael Dorn como Worf
Marina Sirtis como Deanna Troi
Gates McFadden como Beverly Crusher
Wil Wheaton como Wesley Crusher
Elenco convidado
Whoopi Goldberg como Guinan
Colm Meaney como Miles O’Brien
Elizabeth Dennehy como Shelby
George Murdock como J.P. Hanson
Enquete
Edição de Maria Lucia Rácz
Revisão de Susana Alexandria