PIC 2×01: The Star Gazer

Segundo ano traz rostos conhecidos e promete muita ação e aprofundamento da psique de Picard

Sinopse

Um alerta de intruso a bordo da ponte e uma figura sinistra tenta se apoderar dos sistemas de uma nave da Frota Estelar. Para evitar isso, o almirante Picard ordena a ativação da sequência de autodestruição, ainda chocado com a reviravolta das últimas 48 horas.

Tudo começou no Château Picard, Terra, quando Jean-Luc e Laris supervisionavam mais uma colheita do vinhedo. Zhaban morreu há um ano e meio e uma relação mais próxima vem se desenvolvendo entre Laris e Picard. Um clima chega a pintar, mas ele hesita. A situação o remete a lembranças da infância, cercada de violência doméstica por parte do pai contra sua mãe, que, por sua vez, sempre o encorajou a olhar para as estrelas.

Picard na colheita

Enquanto isso, no espaço, a USS Avalon detecta a abertura de uma potente anomalia espacial. O fenômeno também é detectado a bordo da nave La Sirena, comandada agora por Sete de Nove, trabalhando com os Patrulheiros de Fenris. Seu único ajudante é Emmet, um holograma com a aparência de Chris Rios e que reúne as capacidade de todos os hologramas antes instalados na nave. Depois de neutralizar piratas que pretendiam roubar suprimentos armazenados a bordo, Sete encaminha a Sirena para a tal anomalia.

Na Terra, Picard, como chanceler da Academia, faz o discurso inaugural para os cadetes, festejando a entrada do primeiro romulano puro-sangue na instituição, Elnor. Picard presenteia o jovem com um livro de memórias de Spock, As Necessidades de Muitos e de Um, e sugere que Elnor “viva um pouco”. Ele também reencontra Raffi e descobre que ela, como instrutora da Academia, estará a bordo da mesma nave que Elnor, a Excelsior.

Picard dá livro de Spock a Elnor

Após a ocasião solene, Picard decide visitar sua velha amiga Guinan, que agora tem um bar no endereço 10 Forward Street, em Los Angeles. Ela o provoca a aceitar que ainda há tempo e espaço para romance em sua vida.

No espaço, a nova Stargazer, comandada por Cristóbal Rios (de volta à Frota Estelar), é designada como parte da força-tarefa responsável por estudar a anomalia. Mas, antes de ir até ela, ele parte para Raritan IV, no Quadrante Beta, onde Soji Asha e Agnes Jurati participam de um tour pela galáxia para estabelecer boas relações entre os sintéticos e as comunidades orgânicas da Federação. Elas estão em reunião com os deltanos, mas Rios quer a ajuda de Jurati para analisar a anomalia e ela, embriagada, parte com ele. Na chegada ao local do fenômeno, uma transmissão é detectada. A síntese da mensagem é um pedido de adesão à Federação, acompanhado por “ajude-nos, Picard”.

No vinhedo, Jean-Luc é visitado pela almirante Sally Whitley. Ela pede desculpas pela intromissão, mas quer a ajuda de Picard com a anomalia, em razão do conteúdo da transmissão. Ele, então, parte de nave auxiliar para se encontrar com a Stargazer. O almirante manda uma saudação e, então, uma nave em formato de diamante emerge da anomalia. Sete, a essa altura a bordo da nave federada, confirma tratar-se de uma nave borg.

Jurati, Picard, Rios e Sete na Stargazer

Uma frota de naves federadas, incluindo a Excelsior, chega para ajudar. Contudo, os borgs insistem que só negociarão com Picard e enviarão a bordo da Stargazer uma emissária, sua própria rainha. Sete defende um ataque. Picard hesita. Rios decide tentar impedir o transporte, mas a Rainha Borg se materializa na ponte — é bem diferente das que a Frota Estelar já havia encontrado. Ela diz querer paz, mas primeiro, “poder”. Tentáculos emergem e se conectam à nave. Ela está para tomar controle da frota federada inteira, o que leva Picard a ativar a sequência de autodestruição da Stargazer. Conforme a contagem regressiva se aproxima do final, a música francesa “Non, Je Ne Regrette Rien”, na voz de Edith Piaff, começa a tocar e a rainha diz “olhe para cima”, ecoando as palavras que a mãe de Picard lhe dizia quando ele era criança.

A Stargazer se autodestrói em uma grande explosão, mas Picard se vê de volta a seu château com um céu diferente, como se houvesse um escudo planetário na Terra. Laris não está por perto e agora ele tem um androide chamado Harvey como mordomo. Chocado, Jean-Luc se pergunta o que está acontecendo. Eis que surge Q, relembrando o que havia dito a Picard da última vez em que se encontraram: “O julgamento nunca termina”. Ao ser questionado sobre o que estava acontecendo, Q apenas diz “Bem-vindo ao ponto final do caminho não trilhado”.

Comentários

A segunda temporada de Star Trek: Picard inicia-se de forma episódica, incluindo tanto a sua relação com a predecessora como com o segmento que a sucederá na semana seguinte. Não temos nem ao menos um “Anteriormente em…”, seguido de um resumo no início do segmento, e somos diretamente lançados em uma bela cena de ação, a bordo de uma nave da Frota Estelar que está sendo invadida por uma figura sinistra. Não sabemos de quem ou do que se trata, apenas que Picard, Sete, Rios e Jurati estão a bordo daquela nave e no meio de toda aquela confusão. Isso nos remete a episódios de outras séries da franquia, quando o contexto apenas é contado a posteriori para o telespectador.

Esse recurso, por mais manjado que seja, ajuda o público a sentir-se engajado na história. Afinal, sabemos que algo tão urgente a ponto de fazer Jean-Luc Picard decidir-se pela autodestruição de uma nave só pode advir de um cenário impossível de ser vencido. Além disso, ao jogar-nos direto no enredo a ser contado no arco de história do novo ano, evita-se a sensação de um mero epílogo da temporada anterior em que seríamos reapresentados aos personagens e contextualizados espaço-temporalmente na Federação do início do século 25, o que poderia gastar muito tempo de tela sem nos introduzir ao que o segundo ano nos proporcionará ao longo de dez episódios.

Alerta de intruso

Após a sequência inicial repleta de adrenalina, somos levados novamente ao bucólico Château Picard, onde o velho e solitário almirante vive cercado apenas das pessoas que trabalham com ele no vinhedo, incluindo a romulana Laris, com quem ele tem uma conversa sobre o fim da colheita. Nesta cena, além de sermos situados temporalmente e sabermos da morte de Zhaban, vemos serem revelados diretamente pela romulana seus sentimentos pelo patrão. E ele não consegue deixar de ser quem é e, mesmo que num plano emocional ele possa retribuir a afeição de Laris, não consegue fazer isso de forma prática. E, nessa recusa, ecoa o questionamento da romulana: Picard, esse homem que por tanto tempo viveu entre as estrelas, estava procurando/explorando ou fugindo de um lado de si mesmo que nunca permitiu viver plenamente?

Essas palavras de Laris fazem emergir uma memória dolorosa de infância, que, posteriormente, ele não revela nem mesmo a Guinan: quando menino, Jean-Luc presenciou cenas de violência doméstica entre os pais. Esse é o tipo de experiência que pode traumatizar uma pessoa pelo resto de sua vida, moldando a forma como ela a encara e as decisões que toma. Esse ponto é extremamente efetivo neste segmento (esperemos que continue sendo bem utilizado ao longo da temporada), pois algo tão impactante sobre esse personagem tão conhecido é apenas compartilhado com o público. Se, em A Nova Geração, a abordagem de Picard como um personagem arquetípico cabe muito bem e a justificativa do dever e das responsabilidades para com a Frota Estelar e a Federação são satisfatórias para sua opção de não investir na vida pessoal, nesta série isso já não cabe. Aqui, vamos sendo apresentados a um lado cada vez mais humano do protagonista que conhecemos há décadas, nos aproximamos cada vez mais dele e mergulhamos em sua psique.

Jean-Luc e Yvette Picard

Mais uma vez, como ocorre ao longo de toda a sua história, Jornada nas Estrelas dialoga com a realidade. Num mundo em que ainda hoje relacionamentos abusivos, violência contra a mulher e tantos outros problemas familiares graves permanecem, é ainda necessário tratar desses temas. E não cabem questionamentos do tipo “mas uma mulher de fins do século 23 e início do 24 aceitaria continuar em um relacionamento assim?”, pois sabemos que as respostas nunca são simples de serem dadas, além de ser um tipo de questionamento que, no fim das contas, não ajuda a resolver um problema real e apenas estigmatiza as pessoas que sofrem com esse tipo de situação. Além disso, impactam profundamente as crianças frutos desses relacionamentos, que carregam para sempre as marcas deixadas, assim como o almirante Picard.

Ele, escudando-se no dever, parte no dia seguinte para fazer seu discurso na bela Academia da Frota Estelar. Entre os cadetes, temos Elnor, o primeiro romulano puro-sangue a usar aquele uniforme; entre os instrutores, temos Raffi Musiker. Podemos ver o quanto o questionamento e a declaração de Laris ainda impactam Picard quando, após citar o tempo como a grande barreira final e citar seus antepassados exploradores, Picard escolhe as palavras de sua mãe como grande incentivo aos jovens aspirantes a uma carreira na Frota Estelar: “Olhem para cima e vejam o que tem lá fora”. Ele não menciona exatamente tudo o que a mãe havia lhe dito, pois esse incentivo a olhar, buscar, viver entre as estrelas também tinha a recomendação de o menino imaginar-se o mais longe possível dos sons da violência doméstica, de modo a não perturbá-lo mais. Dessa forma, nós, público, entendemos ainda melhor essa tendência do personagem em escudar-se em sua carreira na Frota Estelar, ao passo que os demais personagens ignoram esse ponto.

Picard discursa na Academia

Após uma breve troca de palavras com Raffi, na qual ela o compara com Sete por causa da autossuficiência e da tendência de ambos a afastarem as pessoas que os amam, ele decide fazer uma visita à sua antiga confidente Guinan. A bartender, no entanto, não alivia Jean-Luc do que o perturba e, parafraseando a própria fala dele no discurso aos cadetes, ela sugere que a grande barreira final para o almirante seria justamente a de viver e entregar-se a um grande amor e que ainda havia tempo para isso. Neste momento, temos uma referência aos relacionamentos anteriores de Picard que presenciamos: para o público, relacionamentos “profundos, mas de um episódio”; para eles, relações breves; para todos, relações que trouxeram poucas consequências para a vida dele. Mesmo instigado pela sua maior conselheira pessoal a revelar seus motivos para esse tipo de postura, Picard novamente se cala e volta para casa.

Como se pode ver, uma grande temática deste segundo ano é a segunda chance, é a de aproveitá-la para realizar aquilo que ficou pendente. E isso é visto também nos demais personagens: Rios está reincorporado à Frota Estelar, agora como capitão e tendo seu próprio comando; Raffi é instrutora da Academia da Frota; Elnor é cadete dessa instituição e um símbolo de um início de mudança de relações entre romulanos e Federação; Jurati foi absolvida do assassinato do antigo mentor e amante Bruce Maddox por insanidade temporária causada por intervenção alienígena (o elo mental da comodoro Oh na temporada anterior); Picard agora já voltou a ter bom relacionamento com a Frota, sendo chanceler da Academia. Já Sete se juntou novamente aos Patrulheiros de Fenris, levando consigo a La Sirena e o holograma Emmet.

Picard e Guinan

Um grande símbolo de segunda chance é a reconstruída USS Stargazer, sob o comando de Rios. Em uma bela tomada externa, conhecemos seu design, que tanto nos remete à sua antiga encarnação quanto nos faz ver o trabalho de reconstrução feito. Em seu interior, temos a atualização dos LCARS, seus corredores nos remetem tanto a naves estelares que vimos no século 24 que conhecemos até então quanto trazem certa harmonia com o que estamos acostumados a ver atualmente no design interior de naves estelares da franquia; além disso, tanto a ponte quanto a sala de observação são belíssimas. É essa nave, justamente, que é enviada para a missão de estudar uma estranha anomalia encontrada pela USS Avalon, além de ser o grande ponto de reencontro da maior parte do elenco principal da série: Rios recruta Jurati para o ajudar a pesquisar aquele fenômeno, eles encontram Sete a bordo da La Sirena nos arredores e, por fim, ao decifrarem uma transmissão vinda da anomalia, Picard vem a bordo, “encerrando um ciclo”. Com todos eles na nave, A USS Excelsior, trazendo Raffi e Elnor, junta-se à frota designada para auxiliar a Stargazer na missão.

No momento em que descobrimos que a transmissão vem de uma nave borg, um dilema se impõe: deve-se atender ao pedido de ajuda e adesão à Federação, ou deve-se atacar a enorme nave em formato de diamante, pois conhecemos previamente o modus operandi daquela espécie? Numa (nostálgica para nós) reunião na sala de observação da nave, temos os dois pontos de vista sendo defendidos por Jurati (diplomacia) e Sete (ataque) para o capitão Rios e o almirante Picard. Este, como tendo a patente mais alta, é quem deve tomar a decisão. Para Jurati, atender os borgs e iniciar relações diplomáticas com eles poderia levar a uma poderosa aliança futura. Já para Sete, assimilada quando criança, tendo vivido boa parte da vida como uma borg, este é um risco alto demais.

Anomalia

Sobre o ponto de vista de nossa ex-borg favorita, há um elemento interessante: ao vir a bordo, ela notou a desconfiança e o preconceito dos tripulantes da nave em relação a ela, por seu passado e seus implantes que não puderam ser totalmente removidos. Ainda que na temporada anterior tenha sido resolvida a questão do banimento dos sintéticos, não podemos dizer o mesmo em relação aos borgs. Todos os enfrentamentos entre borgs e Federação ao longo dos anos ainda fazem aflorar sentimentos há muito arraigados, mesmo numa sociedade do século 25 que aprendeu a conviver com as diferenças. O fato de não ter se integrado à Frota, a aversão que sente direcionada a si pelos implantes que ainda tem que sustentar, a morte dos pais por mãos borgs, sua participação na assimilação e destruição de raças inteiras, tudo isso culminando em sua autossuficiência e consequente dificuldade em permitir entregar-se aos sentimentos por Raffi — os seus sofrimentos foram causados pelos borgs. Dessa forma, não esperaríamos uma opinião diferente de Sete. Ao mesmo tempo, já poderíamos antecipar o pensamento antagônico de Jurati, sendo ela uma mulher que se sente mais à vontade entre seres sintéticos.

Nesse ponto, é interessante observarmos também os nossos próprios sentimentos de fãs. Em Discovery, atualmente, temos uma espécie desconhecida (10-C) muito mais avançada tecnologicamente e que está causando um grande estrago em nossa galáxia. Por ser desconhecida, conseguimos mais facilmente nos colocar no lugar de Michael Burnham de buscar um primeiro contato e diplomacia. Muitos de nós condenam o plano de Ruon Tarka e Book de atacar os 10-C primeiro, antes que mais gente morra. Ao passo que, nesta anomalia na segunda temporada de Picard, reencontramos uma espécie com que já lidamos e cujo modus operandi destrutivo conhecemos bem. Então, temos a tendência de concordar com Sete, de nos frustrarmos com a sugestão de Jurati e até mesmo de considerar a atitude da Federação de sempre buscar a diplomacia algo um tanto ingênuo em determinadas situações.

Rios, Jurati, Picard e Sete em reunião

No entanto, ainda evocando o momento atual de Discovery, devemos também nos questionar ao pensar dessa forma. O próprio episódio nos traz alguns elementos que podem apontar que talvez esses borgs mereçam uma segunda chance: a nave tem um formato diferente (de diamante, e não de um cubo), a rainha tem uma aparência e atitude (ela atira para tontear e não para matar os tripulantes da Stargazer) distintas daquelas que conhecíamos anteriormente. Portanto, faz sentido optarem primeiramente pela sugestão de Jurati de tentar a diplomacia e sentar para conversar com os borgs.

Com a invasão da rainha borg e o processo de assimilação da nave e da frota presente como um todo, contudo, a única solução que pode ser aventada é a autodestruição da nave. Voltamos, assim, ao início do episódio, em um cenário sem vitória possível. A não ser que tenhamos à mão um personagem superpoderoso que possa oferecer uma segunda chance mesmo em condições tão desfavoráveis e que tenha uma longa relação com o protagonista desta série. Nesse contexto, o retorno de Q mostra-se orgânico e sua opção por trazer Picard de volta à vida em uma realidade aparentemente alternativa (ou, como ele chama, “o final do caminho não trilhado”) para dar continuidade ao “julgamento que nunca termina” não funciona apenas como um ótimo fanservice, mas também como um elemento narrativo coerente com o cenário criado. Agora, se o que Q nos servirá é apenas mais um jogo ou algo mais sério, apenas os próximos episódios nos dirão.

Rainha Borg

Tecnicamente, o episódio de estreia da segunda temporada de Star Trek: Picard é muito bem-sucedido. Destaca-se a apresentação de Q, primeiramente com aparência que tinha em A Nova Geração (graças aos efeitos usados para o rejuvenescimento de atores) e, após ver o rosto envelhecido de Jean-Luc — adaptando-se ao “velho amigo” à base de seu charmoso estalar de dedos — um Q com a aparência atual de seu intérprete, John de Lancie. Visualmente, o retorno de veteranos como Michael e Denise Okuda e Doug Drexler na equipe do designer de produção Dave Blass mostra-se um imenso acerto. A apresentação de cenários, as tomadas externas das naves, o interior da Stargazer com seus LCARS atualizados e da Academia da Frota impressionam. Todos esses elementos servem apropriadamente para inserir a ação, os personagens e o espectador à identidade visual desta temporada, especificamente, e no século 25, de maneira mais geral.

Como qualquer produto audiovisual de qualidade, não apenas o que pode ser visto, mas também o que pode ser ouvido é de suma importância para a compreensão de quem o consome. Nesse sentido, as imagens estão muito bem complementadas pela edição de som e os efeitos sonoros, dando uma sensação de preenchimento do ambiente em que não há desconexão com a imagem ou mesmo com nossas expectativas. Ainda sobre a questão sonora, destacamos a escolha de duas músicas bem conhecidas: “The Time Is On My Side” (Irma Thomas) e “Non, Je Ne Regrette Rien” (Edith Piaf), pois não apenas se adequam por esse motivo, mas também por suas letras estarem diretamente relacionadas às temáticas abordadas no episódio e que presumivelmente permearão toda a temporada que este inicia.

Q e Picard

Um último ponto a se destacar é a atuação do elenco. Entre os atores principais, Michelle Hurd, Jeri Ryan e Santiago Cabrera sempre se destacam em suas cenas. Nosso protagonista, então, dispensa grandes análises de desempenho por sua reconhecida excelência artística. Os dois atores convidados, Whoopi Goldberg e John de Lancie, que retornam a seus icônicos personagens Guinan e Q, respectivamente, permanecem incríveis e demonstram manter grande entrosamento com Stewart, entregando grandes performances. Goldberg e de Lancie nem ao menos parecem que passaram tantos e tantos anos sem atuar fisicamente como esses personagens. Estes são aqueles de quem nos lembramos. Esperamos que possamos conhecer ainda mais sobre eles.

Ainda em termos de interpretação dramática, não se pode deixar de mencionar o incrível trabalho feito por Orla Brady como Laris. Em suas aparições ao longo do episódio, nós conseguimos perceber e nos envolver em todos os sentimentos pelos quais a romulana passa: a tristeza já não tão arrasadora pela morte de Zhaban; a admiração e o amor crescente por Picard; a decepção e resignação pela recusa do almirante; a dor pela partida dele rumo à anomalia sem ao menos uma despedida. Trata-se de um belíssimo desempenho de Brady, um belo jogo cênico ao lado de Patrick Stewart e uma grande lição do trabalho de ator para os espectadores.

Laris e Picard

Por fim, “The Star Gazer” é um excelente episódio de abertura de temporada, que mescla a ação que esperamos de uma série de ficção científica; elementos familiares ao universo trekker, como viagens no tempo/universo alternativo, anomalias espaço-temporais, borgs, personagens legados, naves federadas; e o mergulho emocional que passamos a esperar especificamente desta série da franquia. É um segmento que conta uma história com início, meio e fim em si mesmo, mas que também nos deixa um grande gancho para o próximo episódio, questionamentos para o decorrer da temporada e aquele gostinho de quero mais de um novo século que ainda não conhecíamos: o 25. Não podemos esquecer que é a penúltima temporada da série e ainda não sabemos o quanto ela se conectará com a próxima. No entanto, a julgar como sua abertura foi feita, não temos elementos suficientes para desconfianças excessivas de que a jornada pelo “caminho não trilhado” não será tão prazerosa quanto rever John de Lancie e Whoopi Goldberg em tela.

Avaliação

Citações

“When I first came here I saw you as a man who chose the stars. And, after all this time, I’ve come to wonder, have you been seeking or running?”
(Quando vim para cá, eu o via como um homem que escolheu as estrelas. E, depois de todo esse tempo, eu passei a me perguntar: você estava buscando ou fugindo?)
Laris para Picard

But if we should shout at each other now and then, I want you to look up and imagine how tiny our voices are out there. So tiny you can’t even hear them. Look up the stars, Jean-Luc”
(Mas, se gritarmos um com o outro de vez em quando, eu quero que você olhe para cima e imagine como nossas vozes são pequenas lá fora. Tão pequenas que você não pode nem ouvi-las. Olhe para as estrelas, Jean-Luc.)
Yvette Picard para o jovem Jean-Luc

“We often refer to space as the final frontier. But the older I get, the more I come to believe that the true final frontier is time. In command, in life, what we do in crisis often weighs  upon less heavily than what we wish we had done, what could have been. Time offers many opportunities, but it rarely offers second chances”
(Nós costumamos nos referir ao espaço como a fronteira final. Mas, quanto mais velho eu fico, mais passo a acreditar que a verdadeira fronteira final é o tempo. No comando, como na vida, o que fazemos numa crise pesa sobre nós menos do que aquilo que poderíamos ter feito, do que podia ter sido. O tempo oferece muitas oportunidades, mas raramente oferece segundas chances.)
Picard para os cadetes da Academia da Frota

“I think the answers are not in the stars, and they never have been. Also, I suggest that we drink. Because I think there’s one final frontier to come.”
(Eu acho que as respostas não estão nas estrelas e nunca estiveram. E vou sugerir também que a gente beba. Porque eu acho que ainda há uma fronteira final que está por vir.)
Guinan para Picard

“Do you recall what I said to you when we parted ways? The trial never ends.”
“What the hell are you doing here?”
“You’ve been talking a lot about second chances. Well, my friend, welcome to the very end of the road not taken.”

(Você se lembra do que eu lhe disse quando nos despedimos? O julgamento nunca termina.)
(O que diabos você está fazendo aqui?)
(Você vem falando muito em segundas chances. Bom, meu amigo, bem-vindo ao verdadeiro final do caminho não trilhado.)
Q e Picard

Trivia

  • Este é o primeiro episódio de Star Trek que se passa inteiramente no século 25. A data da safra impressa nas garrafas do Château Picard é 2401. Também é declarado que Zhaban está morto há um ano e meio.
  • O planeta onde Soji estava visitando os deltanos foi identificado como Raritan IV, e não seu mundo natal, Delta IV. Esta é a primeira aparição desta espécie desde Jornada nas Estrelas VI: A Terra Desconhecida. Essa é também a espécie de Ilia, em Jornada nas Estrelas: O Filme.
  • O número de registro da USS Stargazer do século 25 é NCC-82893, uma homenagem à Stargazer que foi o primeiro comando de Picard, NCC-2893, vista no episódio “The Battle”, de A Nova Geração. Várias imagens e referências também foram feitas à primeira Stargazer, incluindo a data em que ela entrou em serviço: 2326.
  • Muitas naves famosas da Frota Estelar, incluindo a já mencionada Stargazer, são vistas em gravuras de fundo onde os cadetes se transportam para suas novas naves, incluindo a USS Excelsior, a USS Leondegrance e a USS Enterprise-D.
  • As naves para as quais os cadetes foram designados também apresentam nomes notáveis: a supracitada USS Excelsior e a USS Grissom, de Jornada nas Estrelas III: À Procura de Spock, e a USS Hikaru Sulu, em homenagem ao piloto da Enterprise do século 23 e capitão da Excelsior.
  • Quatro naves estelares de Star Trek Online apareceram neste episódio: a classe Gagarin, uma versão atualizada da classe Shepard, nomeada a partir da USS Gagarin; a classe Reliant, uma versão atualizada da classe Miranda, e nomeada a partir da USS Reliant; a classe Ross, uma versão atualizada da classe Galaxy, e a classe Sutherland, uma versão atualizada da classe Nebula, nomeada a partir da USS Sutherland. O jogo Star Trek Online recebeu um agradecimento especial nos créditos finais do episódio.
  • Duas naves da classe Sovereign podem ser vistas neste episódio, marcando sua primeira aparição fora dos filmes, e a primeira nave dessa classe desde a Enterprise-E. A primeira aparição em ação ao vivo de naves da classe Luna também acontece neste episódio.
  • A sequência abreviada de autodestruição que Picard usa tem o código “zero zero zero destruir zero”, uma homenagem à USS Enterprise original, vista no episódio “Let That Be Your Last Battlefield”, da Série Clássica, e no filme Jornada nas Estrelas III: À Procura de Spock.
  • Q faz sua primeira aparição em um episódio live-action desde Q2, de Voyager. Anteriormente, ele apareceu no episódio “Veritas”, de Lower Decks.
  • A classe Ross é uma homenagem a Marry G. Ross, a primeira engenheira nativa americana conhecida.
  • A ampulheta nos créditos de abertura pode ser um aceno para Days of Our Lives, em que John de Lancie estrelou como o viajante do tempo, Eugene Bradford.
  • O título “The Star Gazer” tem um duplo significado, referindo-se tanto à USS Stargazer, bem como ao hábito infantil de Jean-Luc Picard de observar as estrelas.
  • Este é o terceiro episódio de Picard coescrito por Akiva Goldsman, que também coescreveu os dois episódios finais da primeira temporada.
  • Este é o primeiro episódio coescrito por Terry Matalas, que se juntou ao seriado na segunda temporada, como produtor executivo e showrunner. Esta não é sua primeira conexão com Star Trek: Matalas trabalhou para Brannon Braga, começando na sexta temporada de Voyager e continuando em Enterprise, em que ele tem crédito de história em dois episódios.
  • Esta é a segunda vez que Doug Aarniokoski dirige Picard. Ele também dirigiu quatro episódios de Discovery e um de Short Treks.
  • A sequência de títulos de abertura do seriado tem uma nova versão, assim como o tema musical do compositor Jeff Russo.
  • A música tocada durante a colheita no vinhedo de Picard é “Time Is on My Side”, de Irma Thomas. Já a música ouvida no final, quando a rainha borg fala com ele, é “Non, Je Ne Regrette Rien” (“Não, não me arrependo de nada”), de Edith Piaf.
  • Laris brinda Picard em romulano, traduzido em inglês como “Seize today, for we know nothing of tomorrow” (em português, “Aproveite o dia de hoje, pois não sabemos nada sobre o amanhã”), que é semelhante ao famoso aforismo latino carpe diem, popularizado pelo poeta romano Horácio. Essa é mais uma ligação inexplicável entre a Roma Antiga e essa raça alienígena.
  • Picard revela ter um ancestral que navegou com o explorador francês Jacques Cartier, do século 15, e um ancestral que mapeou o sistema solar, chamado René Picard, presumivelmente um homônimo de seu sobrinho.
  • A mãe de Picard o chama de seu “pequeno Magalhães”, referindo-se ao explorador português do século 15, Ferdinando Magalhães, que foi o primeiro a circunavegar a Terra.
  • Entre as bandeiras em exposição durante o discurso de Picard na Academia, estão a da Terra Unida, a do Estado Livre Romulano, a klingon, a telarita, a da Federação Unida de Planetas, a do Comando da Frota Estelar, a da Academia da Frota Estelar, as de Vulcano, Bajor e da Aliança Ferengi, juntamente com outras quatro, que não são facilmente identificáveis.
  • Picard dá a Elnor um livro de memórias de Spock intitulado The Many and the One, que também é o título de um livro sobre o estudo filosófico da lógica plural de Salvatore Florio e Øystein Linnebo, de 2021.
  • Picard ressalta que Elnor é o primeiro cadete totalmente romulano na Academia da Frota Estelar, possivelmente um aceno a Saavik (que se revelou meio romulana em uma cena não mostrada em Jornada nas Estrelas II: A Ira de Khan) e ao tripulante Simon Tarses (cujo avô paterno era romulano, e não vulcano, conforme revelado em “The Drumhead”, de A Nova Geração).
  • Picard diz a Raffi que está considerando atualizar o infame cenário sem vitória Kobayashi Maru, da Academia, revelado pela primeira vez em Jornada nas Estrelas II: A Ira de Khan. As temporadas mais recentes de ProdigyDiscovery tiveram episódios que citaram esse cenário.
  • Soji menciona que está preocupada com a possibilidade de ter de cantar um medley de canções folclóricas deltanas para manter os diplomatas entretidos. A atriz Isa Briones é uma cantora de sucesso da Broadway e cantou Blue Skies no final da primeira temporada da série.
  • Emmet, o holograma de Rios, informa à Sete que a anomalia estava emitindo radiações Hawking, que é provavelmente criada por buracos negros.
  • O bar da Guinan, localizado na 10 Forward Avenue, inclui painéis nas paredes que combinam com os do 10 Forward (Bar Panorâmico, na versão brasileira) original na USS Enterprise-D.
  • Antes de dizer “Make it so“, Rios diz “Dale“, que significa “Vá em frente”, em espanhol.
  • Entre os itens vistos no Château Picard, estavam os restos da tábua bajoriana que Benjamin Sisko quebrou no episódio “Reckoning”, de Deep Space Nine.
  • A primeira nave da Frota Estelar a detectar a anomalia foi a USS Avalon, que parece ser uma nave estelar da classe Luna, como a USS Titan do capitão Riker. Esta seria a primeira aparição em live-action de uma nave dessa classe.
  • A USS Excelsior, para a qual Elnor e Raffi são designados, parece ser a mesma do século 23. Já um outro cadete foi designado para uma USS Grissom, que teria que ser uma nova nave, pois a do século 23 foi destruída.
  • Ao falar que Picard deve se dirigir à Stargazer, a almirante Whitley lhe dá uma nova insígnia da Frota Estelar, possivelmente prática, pois a insígnia retrô dele da Academia pode não funcionar a bordo de uma nave estelar.
  • Terry Matalas menciona a sua área natal Raritan, Nova Jersey, em todas as suas obras. Além do planeta onde Soji e Jurati estão, Raritan IV, há também o Raritan National Laboratory, uma instalação de pesquisa fictícia de viagens no tempo na série de televisão 12 Macacos. A radiação temporal Adler-Lasky também faz referência a dois cientistas dessa série, Dr. Adler e Dr. Lasky.
  • Jean-Luc Picard serve como chanceler da Academia da Frota Estelar, um papel que lhe havia sido oferecido no episódio “Coming of Age”, de A Nova Geração.
  • As garrafas vistas no bar de Guinan incluem o clássico conhaque sauriano, o vinho de Risa, que é visto também em Raritan IV, e a garrafa Evian, em forma de lágrima, vista tanto na enfermaria do dr. Phlox quanto na sala de conferências da NX-01 de Enterprise.
  • Um grande letreiro de neon publicitário Arcanis Lager pendurado na parede do bar de Guinan é semelhante a um letreiro no bar de McCoy em Jornada nas Estrelas III: À Procura de Spock.
  • A almirante Sally Whitley, que visita Picard em sua casa, é interpretada pela atriz April Grace, que anteriormente viveu a operadora do teletransporte Maggie Hubbell da Enterprise-D em vários episódios de A Nova Geração.
  • As raças alienígenas que servem a bordo da Stargazer incluem vulcanos, trills e bajorianos.
  • O ator Alex Diehl retorna como Harvey, um androide. Ele atuou pela primeira vez como esse tipo de sintético na primeira temporada da série, na qual apareceu como F8, em “Maps and Legends”.
  • Uma recriação da placa de dedicação original da USS Stargazer, do episódio “The Battle”, de A Nova Geração, pode ser vista em exibição na sala de conferências da nova Stargazer.

Ficha Técnica

Escrito por Akiva Goldsman & Terry Matalas
Dirigido por Doug Aarniokosky

Exibido em 3 de março de 2022

Título em português: “O Observador de Estrelas”

Elenco

Patrick Stewart como Jean-Luc Picard
Alison Pill como Agnes Jurati
Jeri Ryan como Sete de Nove
Michelle Hurd como Raffi Musiker
Evan Evagora como Elnor
Orla Brady como Laris
Isa Briones como Soji Asha
Santiago Cabrera como Cristóbal “Chris” Rios e Emmet

Elenco convidado

Whoopi Goldberg como Guinan
John de Lancie como Q
Madeline Wise como Yvette Picard
Menik Gooneratne como emissária alienígena
April Grace como Sally Whitley
Rich Ceraulo Ko como deltano bonitão
Kay Bass como voz do computador da La Serena
Alex Diehl como Harvey
Dylan Von Halle como Picard jovem
Richard Jin como Moshe
Floyd Anthony Johns Jr. como pirata 1
Swati Kapila como oficial condecorado
Geri-Nikole Love como Urtern
Adele Pomerenke como Kemi
Asushka Rani como Sing

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Trívias de Maria Lucia Rácz
Edição de Nívea Doria

Revisão de Roberta Manaa

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