TNG 5×19: The First Duty

Dilema militar para Wesley mostra o potencial de história ambientada na Academia

Sinopse

Data estelar: 45703.9

A caminho da Academia da Frota Estelar, na Terra, onde Picard deve fazer o discurso de formatura deste ano, a Enterprise é informada de um terrível acidente de voo envolvendo Wesley Crusher e sua esquadra. Todas as cinco naves envolvidas foram destruídas, mas quatro dos cinco cadetes conseguiram escapar em segurança, fazendo um transporte de emergência. O quinto membro da equipe, entretanto, Joshua Albert, foi morto.

Picard, Beverly Crusher e os demais pais dos cadetes envolvidos acompanham quando a almirante Brand, a superintendente da Academia, começa uma investigação, interrogando os quatro cadetes sobreviventes. Quando a almirante encontra discrepâncias entre seus depoimentos e o plano de voo previamente reportado, o líder da esquadra, Nicholas Locarno, decide se manifestar. Ele relutantemente diz ao painel de investigação que Albert entrou em pânico e perdeu o controle de sua nave durante a manobra, o que teria causado o acidente. O pai de Albert, um oficial da Frota Estelar, fica especialmente afetado pelo depoimento.

Como Wesley tinha contato direto com a tripulação da Enterprise, a almirante Brand permitiu que Picard e sua equipe fizessem sua própria investigação do acidente. Enquanto isso, Wesley encontra Locarno e os outros membros do Esquadrão Nova para discutir a audiência. Os três cadetes estão claramente incomodados com a atitude de seu líder de colocar a culpa em Albert quando na verdade não era sua culpa.

Locarno tenta convencê-los de que eles não estão mentindo ao omitir detalhes cruciais que explicariam o que realmente aconteceu, e de que eles precisam continuar com seu plano para salvar suas carreiras. Enfatizando a importância do trabalho de equipe, ele faz com que o esquadrão se una novamente. Mais tarde, quando a audiência é retomada, Wesley é questionado sobre os dados remanescentes de seu gravador de voo. Ele e seus colegas ficam chocados quando o painel apresenta evidências, obtidas de um satélite de observação, que claramente contradizem o testemunho do cadete. Entretanto, apesar de ter sido pego em uma mentira, o rapaz se recusa a explicar.

Abalado pelo que está acontecendo, Wesley sutilmente indica a Beverly que está mentindo. Ela compartilha seus sentimentos com Picard, e os dois se unem a Geordi e Data para tentar chegar a uma conclusão. Juntos, eles usam todos os dados recuperados e concluem que, em vez da formação que diziam estar usando, Wesley e seus colegas estavam trabalhando em uma manobra extremamente perigosa, proibida há mais de cem anos pela Frota Estelar.

Picard confronta Wesley e diz ao rapaz que ele e sua tripulação sabem que o esquadrão de Wes estava tentando uma manobra espetacular para realizar durante a cerimônia de fim de ano da Academia da Frota. Caso eles tivessem sido bem-sucedidos, Locarno se graduaria como uma lenda viva.

Infelizmente, sua falha custou a vida de Albert. Picard diz a Wesley que, se ele não disser a verdade, o próprio capitão o fará. Wesley aborda Locarno, mas ele insiste em que mantenham o depoimento, lembrando que Picard não tem prova concreta. Na audiência, entretanto, Wesley diz a verdade, incapaz de permitir que o pai de Albert saia acreditando que seu filho era um covarde. Locarno assume toda a culpa e é expulso, e o resto do esquadrão sai com uma punição mais leve – o cancelamento de seu ano escolar.

Comentários

Durante décadas se discutiu o potencial de uma série ambientada na Academia da Frota Estelar. “The First Duty” foi o primeiro episódio a provar que ao menos uma ou duas histórias feitas nessa ambientação podem dar muito pano para a manga. A trama é bastante simples e não envolve muita reflexão filosófica. A discussão se estabelece totalmente no plano moral, e é interessante perceber que se trata realmente de um dilema, e não de uma falsa problemática. É de fato muito delicado escolher entre seus amigos e a verdade. Tanto é complicado que, nos bastidores de Star Trek, a mesma discussão que Locarno e Wesley têm acabou acontecendo.

Ron Moore, um dos dois roteiristas do segmento, achava que Wesley deveria acabar protegendo seus amigos. Michael Piller, então chefe da equipe de roteiristas, achava que o dever final de Wesley seria sempre para com a verdade. Os dois discutiram, discutiram, discutiram, mas quando chegou a hora de decidir como concluir a história, Piller optou por exercer sua autoridade de chefia e ordenou Moore e Shankar a concluírem a história com a versão que vemos na tela.

Se isso não é suficiente para mostrar o grau de dificuldade desse dilema, então certamente a posição de Nick Locarno é. Em princípio, o telespectador tende a achar que o líder do esquadrão é um mero aproveitador, mas, quando ele assume toda a culpa, mostra que seu discurso não era nem um pouco falso. Trata-se apenas de uma orientação ética diferente.

Essa atitude traz a redenção para o personagem, mostrando-o com um viés muito mais imparcial do que costumamos ver por aí. Ponto para o roteiro, que,  aliás, é o grande forte deste segmento. Sem muita ação ou grandes jogos de câmera, o episódio se sustenta totalmente nos diálogos. De certa forma, em termos de evolução, ele é quase um negativo do episódio anterior, “Cause and Effect”, esse sim muito mais dependente da execução.

Apesar de o roteiro já dar uma tremenda mão, os atores vão muito bem. Talvez a única decepção seja o capitão vulcano, com aquele ar de falso espertão. Ao contrário de Spock, o ícone vulcano por excelência, Sotelk não consegue convencer a audiência de que ele de fato representa o melhor da sagacidade de sua espécie. Mas ele tenta, o que acaba ficando pouco convincente.

Os cadetes todos têm atuações brilhantes, inclusive Wesley Crusher, que mostra que, quando bem escrito, pode ser um excelente personagem. Wil Wheaton também tem a chance de mostrar um pouco de seu talento, coisa rara na série.

Outro momento absolutamente especial e vencedor é o reencontro de Picard com Boothby, o jardineiro da Academia. Embora acabemos aprendendo muito pouco sobre o passado do capitão com aquele senhor, a química entre os dois grandes atores, Stewart e o inesquecível e saudoso Ray Walston, é inacreditável. Quase tão impressionante quanto os toques de continuidade dados ao longo do episódio, como a fama de encrenqueiro do cadete Picard e sua apreciação pelo atletismo.

Do ponto de vista de execução, temos algumas coisas interessantes. As paisagens e cenários da Academia estão bastante desenvoltos, muito melhores que os do Comando da Frota, vistos em “Conspiracy”, do primeiro ano. É curioso notar que, em pleno século 24, a porta do alojamento de Wesley Crusher tenha uma maçaneta! Opção estética ou falha de produção?

Em termos de efeitos especiais, a sequência que talvez impressione mais seja a do gravador de voo da nave de Wesley. Embora não seja muito realista, é um uso impressionante dado a gráficos gerados por computador (CGI), algo que ainda não estava nem perto de atingir o grau de realismo que existe hoje. Mesmo assim, foi uma inovação interessante.

Uma trama bem amarrada, sem falhas de continuidade, drama de primeira qualidade, enfoque bem feito nos personagens e diálogos bem escritos fazem deste episódio um dos melhores da temporada e possivelmente de toda a série.

Avaliação

Citações

“The first duty of every Starfleet officer is to the truth, whether it’s scientific truth, or historical truth, or personal truth! It is the guiding principle on which Starfleet is based, and if you can’t find it within yourself to stand up and tell the truth about what happened, you don’t deserve to wear that uniform. I’m going to make this simple for you, Mr. Crusher; either you come forward and tell Admiral Brand what really took place, or I will.”
(O primeiro dever de todo oficial da Frota Estelar é com a verdade, seja verdade científica, ou verdade histórica, ou verdade pessoal! É o princípio guia sobre o qual a Frota Estelar foi erigida, e se você não pode encontrar em si mesmo a capacidade de se levantar e contar a verdade sobre o que aconteceu, você não merece vestir este uniforme. Eu vou tornar isso simples para você, sr. Crusher; ou você se voluntaria e conta à almirante Brand o que realmente aconteceu, ou eu o farei.)
Jean-Luc Picard a Wesley Crusher

Trivia

  • A premissa dessa história foi desenvolvida por Ronald D. Moore durante um retiro mexicano realizado pela equipe de roteiristas durante o outono (boreal) de 1991. Ele a desenvolveu mais com seu amigo Naren Shankar, que havia sido estagiário da série na temporada passada. Os dois tinham interesse em história militar e queriam fazer um episódio na Academia, trazendo Wesley de volta à série. “Nosso foco era a noção de escolher entre seus amigos e seu dever”, disse Shankar.
  • Rick Berman de início se mostrou cético. Relembrou o showrunner Michael Piller: “Quando vendemos para o Rick, ele disse, isso não é Star Trek. Star Trek é sobre viajar pelo espaço e explorar novos planetas. Não é sobre voltar para a Terra. Ele está certo, claro, e ninguém vai discutir que ele não está, mas eu olhei para ele e disse: ‘Olha só, para mim parece que temos a oportunidade de fazer algo especial. Temos a chance de explorar uma questão que é super significativa para muitos jovens. Se você está envolvido em drogas ou mau comportamento adolescente ou crime, você pode saber que é a coisa errada e você tem a escolha de ser leal aos seus amigos ou fazer o que é honesto – essa é uma grande questão para explorarmos.’” Berman concordou, com uma condição meio estranha: que no máximo três cenários fossem usados.
  • Segundo Berman, nas versões iniciais da história, o crime de Wesley era ainda mais revoltante, e o acobertamento, muito mais óbvio. Ele disse: “Acho isso inaceitável. Wesley é Wesley. Ele é um dos nossos personagens e heróis e ele é capaz de lapsos de julgamento, capaz de tomar decisões numa base emocional em vez de pensar direito nelas, mas não é capaz de algumas das coisas mais severas que foram sugeridas. E ele não é capaz de um grande acobertamento, mentir para oficiais da Academia da Frota Estelar. Então nós basicamente reduzimos a dose, ainda mantendo-a crível e o crime que era sério e resultaria em uma punição.”
  • Moore e Piller tiveram um confronto sobre o desfecho, em que o primeiro achava que era importante que Wesley fosse fiel aos amigos, e o segundo, que o cadete escolhesse seu compromisso com a verdade. Incapazes de convencer um ao outro, Piller usou sua senioridade para impor sua visão. Mas o showrunner relembrou o debate como “uma das mais recompensadoras discussões na história da produção desta série”.
  • Moore disse que, se sua visão tivesse prevalecido, a história teria tido uma estrutura diferente, de modo que Wesley teria feito a escolha moral “correta”. Disse ele: “Ambas as histórias são válidas e interessantes, mas eu preferia uma história sobre um jovem disposto a se manter fiel a seus amigos do que um conto de moralidade sobre dizer a verdade. Não me entenda mal, eu gosto de ‘The First Duty’, e acho que funciona muito bem como ficou, eu apenas gostaria de ter contado uma história diferente.”
  • Nas versões iniciais, o personagem Nicholas Locarno não existia, e o tenente-comandante Albert tinha um papel mais importante na história.
  • “The First Duty” foi filmado entre 24 de janeiro e 3 de fevereiro de 1992, nos galpões 8, 9 e 16 da Paramount. As cenas em locação, filmadas no dia 27, ocorreram na Estação de Tratamento de Água Tillman.
  • Na pintura que ajuda a compor o cenário panorâmico da Academia, a bandeira aparece a meio mastro – um toque adicionado por Dan Curry.
  • Robert Duncan McNeill mais tarde viveria Tom Paris em Voyager, e os dois personagens têm história notavelmente similar. A razão: os produtores queriam de fato o mesmo personagem na série, mas não queriam pagar os direitos autorais por ele que caberiam aos roteiristas deste episódio.
  • Esta é a primeira aparição da Academia da Frota Estelar em uma série de Star Trek.
  • O ator Ray Walston, falecido em 2001, é conhecido do público como o personagem principal da série de 1960 Meu Marciano Favorito. Neste episódio o veterano ator interpreta Boothby, o jardineiro da Academia da Frota Estelar em São Francisco. Boothby já havia sido citado em dois episódios de A Nova Geração, “Final Mission” e “The Game”, mas nunca havia aparecido até este episódio. Ele voltaria a aparecer em dois episódios de Voyager, “In the Flesh” e “The Fight” (embora nas duas ocasiões ele não seja o verdadeiro Boothby).
  • O primeiro capitão vulcano de A Nova Geração também aparece aqui. É Satelk, interpretado por Richard Fancy.
  • Ro Laren não é a única bajoriana na Frota Estelar. Em “The First Duty” conhecemos a cadete Sito Jaxa, outra bajoriana tentando a sorte na carreira de oficial da Frota. Sito voltará a aparecer em um excelente episódio da sétima temporada, “Lower Decks”, onde terá grande importância para a trama.
  • Repare no logotipo da bandeira da Academia da Frota Estelar. Lá está escrito “San Francisco/MMCLXI”, ou seja, São Francisco/2161, o ano em que a Federação foi fundada. No logotipo pode ser encontrada também a frase em latim “Ex astra, scientia”, ou seja, “Das estrelas, conhecimento”. A frase foi baseada no slogan presente no logotipo da missão da Apollo 13 que dizia “Ex luna, scientia” (“Da Lua, conhecimento”).
  • “The First Duty” chegou a ser exibido várias vezes aos cadetes da Academia da Força Aérea dos EUA.

Ficha Técnica

Escrito por Ronald D. Moore & Naren Shankar
Dirigido por Paul Lynch

Exibido em 30 de março de 1992

Título em português: “O Primeiro Dever”

Elenco

Patrick Stewart como Jean-Luc Picard
Jonathan Frakes como William Thomas Riker
Brent Spiner como Data
LeVar Burton como Geordi La Forge
Michael Dorn como Worf
Marina Sirtis como Deanna Troi
Gates McFadden como Beverly Crusher

Elenco convidado

Ray Walston como Boothby
Robert Duncan McNeill como Nicholas Locarno
Ed Lauter como Albert
Richard Fancy como Satelk
Jacqueline Brookes como Brand
Wil Wheaton como Wesley Crusher
Walker Brandt como Hajar
Shannon Fill como Sito

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Edição de Maria Lucia Rácz
Revisão de Susana Alexandria

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