TNG 3×18: Allegiance

Uma exploração inteligente do personagem de Picard e do conceito de liderança

Sinopse

Data estelar: 43714.1

Picard é sequestrado da Enterprise e substituído por uma réplica. Enquanto o original acorda e se vê numa espécie de detenção, o farsante assume o comando da nave e ordena um desvio para um pulsar bem conhecido no aglomerado Lonka.

O capitão está preso com outros dois abduzidos, uma cadete boliana, Mitena Haro, e um mizariano, Kova Tholl. Logo aparece um quarto prisioneiro, o chalnoth Esoqq. Membro de uma raça anarquista e violenta, ele desconfia de todos, e Picard assume a responsabilidade de tentar investigar por que eles quatro foram sequestrados.

Na Enterprise, o farsante tem comportamentos bastante estranhos: acompanha o jogo de pôquer da tripulação, pergunta a Troi sobre a confiança da equipe nele e flerta com a doutora Crusher em um jantar romântico. Enquanto isso, a nave adia seu encontro com a USS Hood e se aproxima do pulsar, sem nenhum motivo aparente.

Na cela, um novo problema surge: a única fonte de alimentação disponível é tóxica para Esoqq. É preciso achar um meio de sair dali, e Picard consegue convencer todos a cooperarem para abrir uma porta. No esforço, são atingidos por um raio paralisante, o que aumenta a desconfiança mútua. Mitena parte em defesa de Picard e revela saber mais do que uma cadete saberia. O capitão nota, mas não fala nada. Mais uma vez ele agrega todos para abrirem a porta. Quando conseguem, há outra parede atrás dela.

Picard conclui que estão sendo usados em um experimento de laboratório, e que Mitena é a captora, disfarçada. Ela então se revela e se converte em um trio de alienígenas. Eles explicam que estavam estudando os conceitos de lealdade e obediência, já que sua espécie, em que todos são exatamente iguais, não os têm. Com o experimento exposto, os alienígenas decidem devolver os cativos de volta a seus lugares.

Na Enterprise, as ordens do farsante colocam a nave e a tripulação em perigo iminente, aproximando-se demais do pulsar, e Riker promove um motim. Quando o verdadeiro Picard é devolvido, uma simples troca de olhares faz com que a equipe da ponte prepare-se para deter os alienígenas em um campo de força. Eles ficam perturbados com a experiência, e Picard sugere que eles pensem duas vezes antes de capturar alguém de novo.

Comentários

“Allegiance” é um esforço muito interessante de explorar o que significa liderança, e como se trata de característica conquistada, e não simplesmente cedida. De um lado vemos o Picard verdadeiro se sobressaindo entre um grupo de alienígenas desconfiados e indefesos, assumindo o comando do grupo de forma natural. De outro, o farsante, apesar de ter todas as lembranças e referências corretas, vai aos poucos perdendo sua capacidade de comandar a Enterprise, ao testar a lealdade cega da tripulação a ponto de colocá-la em perigo.

Poderia ser só um high-concept alegórico pouco inspirando, não fosse a centralidade em Picard, com uma atuação inspirada de Patrick Stewart, e a manutenção do mistério. O que é interessante, porque ele começa de forma totalmente transparente: nos primeiros minutos, já sabemos que Picard foi abduzido e substituído por um impostor a bordo da Enterprise.

De certa maneira, a partir daí, temos duas tramas, A e B, com a mesma temática, a despeito dos ângulos diferentes, e com o mesmo protagonista, embora um seja o Picard real e o outro um farsante com conhecimento total do original. Podemos nos perguntar quão crível é que alguém com todas as informações sobre o Picard original não consiga enganar sua tripulação por mais tempo, mas neste caso isso nem faz sentido: o esforço dos alienígenas é justamente para testar os efeitos das mudanças de comportamento do “capitão” sobre sua tripulação, como forma de sondar o conceito de liderança.

O mesmo se faz no “labirinto de laboratório”, uma prisão em que pessoas com relações muito diferentes com a liderança (um submisso, um anárquico, um comandante e uma subalterna) possam expressar a dinâmica que surge dessa combinação em um ambiente controlado. Convenhamos: os alienígenas não eram lá muito éticos, mas o experimento em si é bem bolado e é o que nos mantém entretidos nesse pedaço da história.

Na Enterprise, a diversão se dá mais pelas nuances trazidas pelos atores a seus personagens, diante da situação inusitada. As cenas entre Picard e Beverly, em particular, tanto no jantar como no fechamento do episódio, são deliciosas, e é muito bom ver como Patrick Stewart e Gates McFadden conseguem comunicar com tão pouco, em termos de expressões faciais e olhares.

No fim, graças ao bom uso dos personagens, temos um episódio que surpreendentemente escapa de ser enfadonho, apesar de depender somente da ambientação da Enterprise e do limitado cenário do “laboratório”. Ajuda nisso também a boa direção de Winrich Kolbe, e terminamos com um segmento que acaba mantendo o bom nível da terceira temporada, bem equilibrado entre tema, trama e protagonistas.

Avaliação

Citações

“In any event, we now know of your race and we know how to imprison you. Bear that in mind. Now, get off my ship!”
(De todo modo, agora sabemos de sua raça e sabemos como aprisioná-los. Tenham isso em mente. Agora, deem o fora da minha nave!)
Picard

Trivia

  • Este episódio, bem como “The Offspring”, foi produzido em parte para economizar orçamento, depois da gastança com “Yesterday’s Enterprise”. Explicou o showrunner Michael Piller: “Sou grande fã de episódios intimistas, e esse foi um episódio bem simples do ponto de vista da produção, porque você precisava de apenas um cenário [novo].”
  • Piller também viu neste episódio uma chance de desenvolver o personagem de Picard. “Queríamos bolar coisas divertidas para Patrick, o ator, e Jean-Luc, o personagem, então nos saímos com essa ideia. Podem ter sido duas ideias reunidas numa só. Uma era Picard fica preso em uma situação sem saída, e um falso Picard assume seu lugar na Enterprise. Eu adorei o material na Enterprise, maravilhoso material de personagem, e Patrick estava maravilhoso. Eu achei que foi um episódio bom, sólido, e logo em seguida viria “Captain’s Holiday”, que, de novo, nasceu do fato de que queríamos dar ao capitão alguma caracterização.”
  • A música que o falso Picard canta no Bar Panorâmico com a tripulação se chama “Heart of Oak”.
  • Neste episódio descobrimos que os aposentos de Picard ficam no Deck 9, quarto 3601.
  • Vemos aqui pela segunda vez um boliano, depois do capitão Rixx em “Conspiracy”, da primeira temporada.
  • O traje de Esoqq depois seria adaptado para ser usado por Morn em Deep Space Nine.
  • Uma rápida cena em close em que Worf reage à transformação do falso Picard em um alienígena foi tirada de outro episódio, “The Survivors”.
  • O roteirista Ronald D. Moore comentou sobre este episódio: “Picard faz algumas coisas que só existiam na mente do Picard real. Vê-lo cantar no Bar Panorâmico deixou todo mundo animado. E a cena com Beverly em seus aposentos foi divertida. Eu gosto do fato que o destrinchamos mais e estamos realmente vendo o que faz esse cara funcionar.”
  • Este foi o episódio favorito de Winrich Kolbe, dentre os que ele dirigiu: “Eu gosto porque fizemos algo estilisticamente interessante na sala iluminada onde as quatro pessoas foram presas. Era um episódio do Patrick e eu sempre sei que, quando vai ser um episódio do Patrick, vai ser um episódio bom, porque ele é muito bom em tudo que faz… Gostei do visual dele e do que o Marvin Rush conseguiu fazer, e Richard James, o designer de cenários. O que você tem de considerar ao dirigir qualquer tipo de conceito de entretenimento é tempo e dinheiro. Estávamos tão atrasdos após os dois primeiros dias que basicamente toda a hierarquia da Paramount estava acampando no meu set. Então entramos no novo set, a câmara octogonal, e de repente estávamos decolando. Terminamos abaixo do orçamento e abaixo do tempo. Era um cenário excelente para se filmar, e eu podia colocar a câmera em qualquer lugar que eu queria.”
  • Kolbe também destacou o prazer de trabalhar neste episódio. “Eu gosto de “Allegiance” porque gostei de trabalhar com Patrick Stewart. Ele é um ator muito sutil. Eu me lembro de falar com Patrick na primeira vez em que ele começou a interpretar o clone. Eu disse, ‘Acho que preciso mais de você’. Ele pensou sobre o assunto e então me deu mais. Conforme ensaiamos a cena, olhamos um para o outro e soubemos que ele estava me dando demais. Então, apenas recuamos um pouco. Patrick é como Itzhak Perlman com um Stradivarius. Você tem de comparar o Stradivarius ao violino de Joe Schmuck. Para o olho destreinado, eles não são diferentes. Mas eles são diferentes, muito diferentes. Patrick interpretou o mocinho e o vilão tão proximamente às vezes, mas era diferente e era o certo.”
  • Este episódio foi indicado para um Emmy de Melhor Maquiagem em uma Série.

Ficha Técnica

Escrito por Richard Manning & Hans Beimler
Dirigido por Winrich Kolbe

Exibido em 26 de março de 1990

Título em português: “Lealdade e Obediência”

Elenco

Patrick Stewart como Jean-Luc Picard
Jonathan Frakes como William Thomas Riker
Brent Spiner como Data
LeVar Burton como Geordi La Forge
Michael Dorn como Worf
Marina Sirtis como Deanna Troi
Gates McFadden como Beverly Crusher
Wil Wheaton como Wesley Crusher

Elenco convidado

Stephen Markle como Kova Tholl
Reiner Schöne como Esoqq
Joycelyn O’Brien como Mitena Haro
Jerry Rector como primeiro alienígena
Jeff Rector como segundo alienígena

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Edição de Maria Lucia Rácz
Revisão de Susana Alexandria

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