DS9 3×12: Past Tense, Part II

Bashir com reféns no Santuário

Apesar das boas caracterizações, a premissa técnica cobrou seu preço

Sinopse

Data estelar: Desconhecida

Assumindo a identidade de Gabriel Bell e a guarda dos reféns no centro de triagem do “Bairro Santuário – A” no ano de 2024 em São Francisco, Sisko (com a ajuda de Bashir) tem que controlar a situação, especialmente os voláteis “B.C” (um “Bruto” que matou o “verdadeiro” Gabriel Bell anteriormente) e Vin (um segurança do local que foi feito refém também). A Guarda Nacional já cercou as imediações e posicionou atiradores de elite nos prédios vizinhos e uma crescente tensão toma conta de todos. Do lado de fora Jadzia assiste ao noticiário e decide ir até o “santuário”. No futuro, Kira e O’Brien começam a fazer uma série de incursões ao passado para resgatar os oficiais perdidos, apesar de saberem que o seu suprimento de partículas cronitrônicas modificadas não vai durar muito.

Sisko convence Webb (um típico “homem de família” dentre os residentes) a entrar na internet e dar a sua versão da história. O acesso é rapidamente cortado e uma certa detetive Preston (a negociadora da polícia de São Francisco) pede para se encontrar pessoalmente com Webb e “Bell”. Quando do encontro, eles exigem o fechamento dos “santuários” e a reedição do “Ato Federal de Emprego”. Mais tarde, Preston retorna com a resposta do governador: “Bell”, Webb e os outros “residentes revoltosos” teriam suas acusações reduzidas se os reféns fossem libertados e nada mais (uma comissão seria instaurada para avaliar as condições de vida nos “santuários”, mas nada seria feito de imediato). Webb rejeita a oferta.

Webb e Sisko se passando por Bell falando com Preston

Dax consegue entrar no “santuário” pelos esgotos e se encontrar com “Bell” e Bashir no centro de triagem, apesar de ter o seu comunicador roubado por um “Lento” de nome Grady. Bashir a ajuda a recobrar o comunicador e volta para falar com Brynner, para permitir o acesso a internet via o “canal” do milionário para os residentes do “santuário”. Ele relutantemente acaba aceitando e com isso vários residentes (entre eles um certo Henry Garcia) contam a sua história para milhões de espectadores. Entretanto, o governador não se sensibiliza e, com os crescentes rumores que os reféns já estariam mortos (além de notícias de revoltas em outros “santuários” também), manda Preston dar ordem para a Guarda Nacional invadir o “Santuário”. Assim ela faz.

O’Brien e Kira encontram a época certa e contatam Dax via comunicador e os três vão se encontrar no ponto de descida (Bashir e Sisko já estavam cientes disso). Finalmente um esquadrão da S.W.A.T. entra à força no centro de triagem e “Bell” e os outros residentes tentam de toda maneira evitar que os reféns sejam feridos sob o fogo cerrado. “B.C.” e Webb e muitos outros morrem dentro do centro. Sisko leva um tiro no ombro, salvando a vida de Vin. O chefe da S.W.A.T. deixa Sisko e Bashir sob os cuidados de Vin e Bernardo. Vin, muito grato, deixa os dois partirem colocando seus cartões de identificação em dois dos muitos corpos (centenas deles) espalhados pelo “santuário”. Vin também promete que vai contar a todos sobre o ocorrido naquele dia.

Kira e O'Brien nos anos 70 encontrando hippies

No futuro a linha de tempo é restaurada e todos estão a bordo da Defiant. Bashir vai aos aposentos do comandante e mostra a ele uma foto de Sisko como Gabriel Bell nos registros históricos oficiais. O médico pergunta como os humanos do século 21 puderam deixar as coisas chegar a este ponto e Sisko diz que gostaria de ter uma resposta para isso.

Comentários

Ter que resolver a problemática trama temporal iniciada na parte anterior e trazer em seu bojo uma história de reféns bastante convencional prejudicam o episódio, mas o grande defeito do segmento chega no seu final em que é revelado que o futuro foi formalmente alterado com direito a uma foto de Sisko, como Gabriel Bell, no arquivo. Ainda que o episódio se sustente com excelentes caracterizações e atuações, ele é um claro “tombo” com relação à primeira parte. Mais detalhes, sem ter que ser atingido por um tiro da Guarda Nacional no processo, nas linhas abaixo.

Uma melhor resolução para a presente história seria uma confirmação no final de que Sisko era Bell o tempo todo. Em vez disso temos uma “semibrincadeira” que deixa a descoberto (de forma absolutamente desnecessária) certos pontos da história. Pontos em que surge a dúvida se uma alteração da linha do tempo estava se dando ou não (um erro absolutamente primário do roteiro). O mais engraçado é que não fica nem claro em que momento que a foto de Sisko (como Bell) foi tirada.

Title Card Deep Space Nine "Past Tense, part II"

Bashir ajudando Lee (talvez salvando a sua vida) é uma coisa menor, uma vez que Sisko já havia dito que todos os reféns sobrevivem. Entretanto, é interessante notar que Sisko não fez objeção alguma, ao contrário da primeira parte, quando Bashir se ofereceu para ajudar Danny Webb.

Ignorando o final, não fica difícil assumir que todos os personagens envolvidos assim o estiveram sempre. Sisko disse que os residentes tiveram acesso à rede e sem a ajuda de alguém externo isso nunca teria sido possível (e a utilização da própria Dax para o fazer o trabalho na rede seria insatisfatória –ela é uma cientista, não uma mágica). É natural aceitar também que Sisko conhecia os acontecimentos por alto, mas não tinha absoluta certeza de todos os detalhes finos do conflito, uma vez que o governo da época deve ter feito de tudo para ocultar os acontecimentos e os nomes das pessoas envolvidas (o que obviamente não serviu para encobrir o ocorrido, mas provavelmente serviu para tornar um pouco “nublado” o incidente –talvez a principal fonte de informação tenha sido o próprio Vin, o único com real coragem dentre todos os reféns).

Bashir e Lee no Santuário

É interessante a maneira com que Sisko se “transformou em Bell”, por vezes confundindo a humanidade dos séculos 24 e 21, em seus aspectos mais básicos, um tema importante do episódio. O delicado equilíbrio entre Sisko, “B.C” e Vin foi bastante interessante também, tornando a situação dentro do centro de triagem bastante vivida. Bashir funcionou bem como um fiel escudeiro de Sisko e teve uma das melhores cenas de todo episódio com Lee. Dax foi sempre mais esperta e fez Brynner de gato e sapato (ainda que para uma boa causa sempre).

O ângulo do resgate por parte de Kira e O’Brien foi obviamente um ponto fraco do episódio, as cenas no passado não foram tão divertidas assim (para dizer o mínimo) e o padrão de busca parece excessivamente tolo com o chefe “chutando” uma nova época, mesmo já tendo disponíveis informações de visitas anteriores (o disfarce da bandagem no nariz de Kira foi meio esquisito também). Por outro lado, foi feita com o “transporte de volta” a melhor coisa possível em vista do nível de “tecnobaboseira” já atingido, resolvendo o problema da trava e da ativação de retorno.

Sisko como Bell, Bashir, Webb e B.C.

Brynner se mostrou um fraco que no final fez a coisa certa (fica a dúvida sobre o que aconteceu com ele depois disto –provavelmente ele foi preso, mas fatalmente deu a volta por cima com a mudança da opinião pública), Lee se mostrou muito frágil só querendo sumir da vista de todos (é o que ela deve ter feito depois do conflito), Bernardo não tinha muita noção do que estava acontecendo e só pensava em ir para casa (e deve ter continuado sua vida exatamente como antes), Webb foi a presença do espírito humano em grande estilo (pena não ter sido feito melhor uso dele como mártir, mas a sua despedida do filho foi no ponto, dramaticamente falando), “B.C” deu o melhor de si (seu chapéu) para Danny e esperou pelo fim (é notável com ele foi modificando a sua atitude lentamente ao longo do episódio) e finalmente Vin, o mais amargo de todos e que acabou enxergando que algo incrível acabara de acontecer. Os demais personagens convidados foram também interessantes e esse foi um grande ponto a favor do episódio.

A situação ficcional descrita aqui, “reféns com uma eminente entrada de um esquadrão de elite, levando a inúmeras mortes” (TM), normalmente fica mais confortável com o orçamento de um filme de cinema. Aqui tal problema fica claro. E em particular não é oferecida nenhuma perspectiva da situação fora do centro de triagem, ficando até difícil opinar se de fato o plano da Guarda Nacional fora correto ou não (para a dada ordem do governador). A esperada “cena dos corpos” também foi bastante pobre, devido ao anúncio antecipado de “centenas de mortes”. Levando em conta tais limitações, a direção de Frakes foi bastante sólida, ainda que a cena envolvendo o encontro de Dax e Grady pudesse ter sido visualmente mais interessante e as cenas da “busca temporal” de Kira e O’Brien merecessem também um maior esmero. A fotografia de West permaneceu como o maior trunfo técnico deste episódio em duas partes.

Massacre no Santuário pela invasão da Guarda Nacional

Foi um episódio de Brooks em uma situação de extrema tensão, o cenário preferido do ator. A cena com Dick Miller (Vin) em que ele explode em cima do segurança é excelente, principalmente pelo misto de frustração e raiva que o ator transmite. A interpretação de El Fadil foi ótima e Farrell também não desapontou. Os demais regulares foram largamente figurativos.

O grande trunfo do episódio ficou no belo elenco de personagens regulares, cada qual dando uma contribuição específica e valiosa no que foi pedido. É um caso raro, quando os produtores acertam com um número tão grande de atores. O destaque continua com Bill Smitrovich. A idéia de trazer Howard a bordo também foi genial, além de dar alguma espécie de face aos “Lentos” (só faltou ele oferecer Tranya a Dax).

Dax e B.C. no santuário

Por que eles estavam pedindo para o governador reeditar um “Ato Federal”? Por que os oficiais da tropa de choque não identificaram Vin e Bernardo antes de entregarem a situação do centro de triagem nas mãos deles (eles deixaram indiretamente dois “criminosos” escapar com tal decisão, mesmo Vin e Bernardo sendo quem eles estavam dizendo quem eram)? Não dava para Jadzia trocar de roupa para entrar no esgoto?

O pessoal da pós-produção está merecendo mesmo um puxão de orelha. Na primeira parte do episódio eles não colocaram nenhum satélite ou qualquer estrutura artificial em órbita da Terra. Nesta, eles colocam a Defiant em dobra rumando para DS9, sem maiores explicações. Que fim terá levado aquela convenção sobre o quadrante Gama na Terra?

Defiant e a Terra

“Past Tense, Part II” sofre muito com os problemas do capenga dispositivo de trama de viagem no tempo (da primeira parte) que colocou a história em movimento em primeiro lugar e de um patético final que tende a empobrecer o que veio antes. Belas caracterizações, um grande elenco convidado e uma desesperada atuação de Avery Brooks (como Gabriel Bell) são os grandes trunfos do episódio, além da total ausência de uma resposta fácil a problemas sociais de tal magnitude. Uma boa hora de Deep Space Nine.

Avaliação

Citações

“Probably raining in Tasmania anyway.”
(Provavelmente está chovendo na Tasmânia de qualquer modo.)
B.C.

“Personally, I’m thinkin’ Tasmania.”
(Pessoalmente, eu pensava na Tasmânia.)
B.C.

“There are ten thousand people living in here.”
“Well, let them get their own hostages!”
(Há dez mil pessoas vivendo aqui.)
(Bem, eles que peguem seus próprios reféns!)
Sisko e B.C.

“I really think we should kill this guy.”
(Eu realmente acho que deveríamos matar esse cara.)
B.C.

“Nice tackle, Bell. You ever play any football?”
“Baseball, actually.”
“Really? I’d hate to be a catcher and see you barreling towards home plate.”
(Boa pancada, Bell. Você joga futebol americano?)
(Beisebol, na verdade.)
(Sério? Odiaria ser um catcher e ver você correndo na direção da última base.)
Sisko e B.C.

“It’s not your fault things are the way they are.”
“Everybody tells themselves that, and nothing ever changes.”
(Não é culpa sua que as coisas ruins sejam do jeito que são.)
(Todo mundo se diz isso, e nada muda nunca.)
Bashir e Lee

Trivia

  • Foi de Michael Piller a idéia de estabelecer a situação envolvendo os reféns somente ao final da primeira parte e partir para um episódio em duas partes, de forma a desenvolver melhor o drama e amortizar melhor os custos.
  • Behr diz que investiu uma boa parcela de esforço no personagem “B.C.” e que não citar o fato de que ele matou o verdadeiro Gabriel Bell na primeira parte foi proposital. Na cabeça de Behr, “B.C.” era um mecânico que a estada no “santuário” transformou em um homem assustador e imprevisível. Behr também ficou definitivamente fascinado pelo “chapéu” de “B.C”, o que o episódio mostra claramente.
  • O diretor Jonathan Frakes ganhou a cadeira de diretor no filme Primeiro Contato com este episódio (“Cause and Effect”, da quinta temporada de A Nova Geração, também estava na fita enviada aos executivos da Paramount). O diretor fez força pela escalação de Clint Howard para fazer o “Lento” que confunde Dax com uma alienígena. Howard (irmão do diretor Ron Howard, recentemente Oscarizado pelo filme Uma Mente Brilhante –que, aliás, vive colocando o irmão em suas produções) viveu o personagem Balok no episódio “The Corbomite Maneuver”, da primeira temporada da Série Clássica. Behr queria o roqueiro Iggy Pop para o papel, mas ele não estava disponível na época. Behr acabaria realizando o desejo que ele alimentava desde os seus anos na série Fame em “The Magnificent Ferengi”, da sexta temporada, em que Pop vive um Vorta.
  • Não tivemos Iggy Pop, mas tivemos uma boa dose de Rock com “Hey Joe” de Jimmy Hendrix ao fundo, quando Kira e O’Brien desembarcam nos anos 60. Frakes gostou do jeitão contemporâneo do episódio e elogiou Avery Brooks, especialmente pela cena que ele (como Sisko) explode em cima do personagem de Dick Miller, Vin, e literalmente o esfrega na parede. Entretanto, ele ficou decepcionado com o resultado final das seqüências de Kira e O’Brien nos anos 30 e 60.
  • Nana Visitor teve um hilário problema durante as filmagens em que ela pegou a bandagem que Kira utilizou para disfarçar o seu nariz Bajoriano e jogou fora. Pra espanto dela, não havia outro e eles tiveram que literalmente catar o curativo em lixeiras.
  • Na cena em que Kira e O’Brien visitam os anos 30, existe um cartaz do anúncio de uma luta de boxe na parede que é uma réplica de um que aparece no episódio “The City on the Edge of Forever”, da primeira temporada da Série Clássica. Já na visita aos anos 60 tivemos um cartaz psicodélico com referências aos “Berman’s Rainbow Dreamers” e ao “Behr Theatre”, uma clara brincadeira com os produtores-executivos Rick Berman e Ira Steven Behr.
  • Efeitos do impacto de tiros com sangue e armas de fogo com festim foram utilizados (algo raro na série). Foi utilizada uma transparência real da Nasa para fazer as tomadas da Defiant orbitando a terra. O ator Siddig El Fadiil encarou o episódio como um “rito de passagem” para o personagem de Bashir.
  • Sobre um dos seus momentos favoritos da série, o mentor de DS9, Ira Steven Behr, diz aproximadamente o seguinte: “Em 1995, Forrest Gump foi o filme ‘para cima’ do ano. Na realidade de Hollywood, Gump, o deficiente mental vivido por Tom Hanks, era um multimilionário. Bem, sem querer criticar os filmes ‘para cima’, na nossa realidade Gump seria um potencial morador de um destes ‘santuários’. Eu só achei que seria importante mostrar o outro lado da questão também.”

Ficha Técnica

História de Ira Steven Behr & Robert Hewitt Wolfe
Roteiro de Ira Steven Behr & René Echevarria
Dirigido por Jonathan Frakes

Exibido em 9 de janeiro de 1995

Título em português: “Passado Imperfeito, Parte II”

Elenco

Avery Brooks como Benjamin Lafayette Sisko
René Auberjonois como Odo
Nana Visitor como Kira Nerys
Colm Meaney como Miles Edward O’Brien
Siddig El Fadil como Julian Subatoi Bashir
Armin Shimerman como Quark
Terry Farrell como Jadzia Dax
Cirroc Lofton como Jake Sisko

Elenco convidado

Jim Metzler como Chris Brynner
Frank Military como Bittle “B.C.” Colrich
Dick Miller como Vin
Deborah van Valkenburgh como Detetive Preston
Al Rodrigo como Bernardo
Clint Howard como Grady
Richard Lee Jackson como Danny Webb
Tina Lifford como Lee
Bill Smitrovich como Michael Webb
Mitch David Carter como o líder da S.W.A.T.
Daniel Zacapa como Henry Garcia

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Edição de Mariana Gamberger

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