TNG 4×04: Suddenly Human

História mostra conflito entre herança genética e condicionamento cultural

Sinopse

Data estelar: 44143.7

A Enterprise descobre uma nave talariana à deriva no espaço, com cinco adolescentes inconscientes, sendo um deles humano. Criado desde pequeno como um talariano e conhecido como Jono, o garoto na verdade é Jeremiah Rossa, desaparecido há uma década, desde quando seus pais morreram em um ataque talariano à colônia em que viviam.

Jono também é o filho adotivo de um capitão talariano, Endar, que resolveu criá-lo após a morte de seu próprio filho. Quando a avó do garoto, a almirante Connaught Rossa, da Frota Estelar, pede a Picard que traga o garoto de volta à Terra, Endar ameaça entrar em guerra com a Federação.

O garoto ainda mostra claros sinais de ferimentos passados, um possível sinal de abuso físico por parte de Endar. O capitão alienígena, por sua vez, diz que suas cicatrizes foram causadas pelas brincadeiras normais da infância talariana.

Picard então tem de escolher se arrisca um conflito com os talarianos ou devolve Jono para seu pai adotivo. Após sofrer um atentado por parte de Jono, que deseja apenas se ver livre do conflito (esperando ser morto por tentar matar o capitão), Picard percebe que deve dar prioridade à vontade do menino, que culturalmente já é muito mais talariano do que humano. Jono então volta para Endar, evitando o conflito interestelar.

Comentários

“Suddenly Human” discute uma velha questão: a primazia e a competição quando se confrontam pais naturais e pais adotivos. A abordagem feita pelo episódio é muito rica, trabalhando a polêmica em vários níveis de profundidade na interpretação, levando em conta diferentes perspectivas. Em particular, saltam aos olhos as diferenças culturais e o fato de que não há uma resposta indubitavelmente correta, diante de uma grande tragédia familiar.

O episódio consegue combinar perfeitamente um roteiro bem escrito com uma história bem amarrada e os questionamentos filosóficos tão comuns a Jornada nas Estrelas. Foi essa química – que faltou nas primeiras temporadas de A Nova Geração – a força motriz que colocou a série como um grande sucesso de público e crítica.

Em um nível mais direto, a grande questão debatida é: quem tem mais direito à criança, o pai adotivo ou os familiares com laços de sangue, levando em conta que a criança foi adotada sem a autorização ou o conhecimento da família natural? Mas a discussão mais sutil do episódio fica por conta de um pensamento muito mais filosófico: o que faz de um ser humano realmente humano? Quanto de nós é natural da espécie e o quanto é mera programação cultural?

A resposta vem através do personagem Jono. Apesar de humano por natureza, ele era muito mais talariano do que terráqueo, em muitos sentidos. E embora fosse profundamente marcado pelo trauma de infância que vitimou sua família humana (bem como pelos conflitos emocionais que emergem de sua própria natureza), a única cultura que de fato ele conheceu era a talariana.

O drama é tão intenso que a única solução que ele encontra, ao se dividir entre a redescoberta de sua humanidade e o senso de lealdade e amor por seu pai adotivo, é cometer um atentado contra Picard – partindo novamente da perspectiva talariana de que isso o levaria a ser executado. Foi uma forma “honrosa” de suicídio, diante do dilema impossível que se colocava diante dele.

Pegando carona nessa história, o episódio também mostra a dificuldade do bom e velho capitão da Enterprise em atuar como figura paterna, o que rende interessantes e divertidos diálogos com a conselheira Troi. A situação não é inédita em Jornada nas Estrelas: o capitão James Kirk passaria por aperto semelhante no episódio da Série Clássica “Charlie X”.

A despeito das limitações de um clássico bottle show, filmado praticamente inteiro dentro da Enterprise (salvo pela cena inicial do resgate), “Suddenly Human” se revela o que o título sugere: um drama humano de primeira grandeza.

Avaliação

Citações

“Are you saying that you are willing to go to war over this boy?”
(Está dizendo que está disposto a ir à guerra por esse menino?)
“Would you not for your only son?”
(Você não iria por seu único filho?)
Picard e Endar

Trivia

  • Jeri Taylor se juntou à equipe de Jornada nas Estrelas neste episódio, recomendada pelo então produtor Lee Sheldon. Ela não tinha familiaridade com a saga e recebeu um “curso relâmpago” levando várias fitas VHS para casa todos os dias por várias semanas.
  • Taylor descreveu seu talento de escritora como “forte em personagens e relações pessoais e bem limitado em ficção científica”. Segundo ela, este episódio, “era totalmente sobre a relação entre Picard e esse adolescente, e eu, tendo filhos adolescentes, entendia isso muito bem. Então apenas preenchi o passado ali. E tirei uma seção inteira de tecnologia de um dos roteiros que eles haviam me dado e copiei isso. Então essa parte soou realmente bem.”
  • Originalmente, a raça alienígena do episódio seria a dos phrygianos. Foi Michael Okuda que sugeriu o uso de uma espécie mencionada antes, mas não vista. Os talarianos são citados como os construtores do cargueiro Batris, de “Heart of Glory”, da primeira temporada.
  • Embora este episódio tenha sido exibido como o quarto, ele foi o segundo a ser filmado.
  • Geordi La Forge aparece em apenas uma cena muito breve, que é na verdade material reciclado. Antes das filmagens de “The Best of Both Worlds, Part II”, LeVar Burton fez uma cirurgia e não pôde aparecer.
  • O alfabeto e logo talarianos já haviam sido vistos a bordo da Batris e voltam a aparecer aqui.
  • Quando o episódio foi ao ar, causou alguma controvérsia e foi acusado de apoiar abuso infantil. Michael Piller relembrou: “Recebemos algumas cartas bem furiosas por aquele episódio. Elas diziam: ‘Como você pode deixar uma criança abusada voltar às pessoas que a estão abusando?’ Nós realmente trouxemos a questão de abuso infantil porque era a coisa certa e natural a trazer no contexto da história. Há paralelos reais com histórias que acontecem no mundo de hoje sobre pais que lutam pela custódia e um diz que houve abuso. Em quem você acredita? Mas, principalmente, era uma história de choque cultural. Era uma história de alguém que era humano e havia sido criado em um ambiente totalmente alienígena. Ele ainda é humano? É sobre isso que era a história realmente.”
  • Rick Berman confirmou que o episódio não pretendia discutir abuso. “Quisemos apresentar o argumento de que a interpretação dos ossos quebrados era nada mais que ossos quebrados normais da infância, e que essas pessoas sofriam preconceito nessa direção. Não havia intenção de ser um episódio sobre abuso infantil. Tinha a ver com um garoto sendo trazido de uma cultura a outra e não se encaixando em nenhuma delas, e a inevitável necessidade de retornar ao mundo em que ele cresceu.”
  • Apesar das polêmicas, Piller elogiou o roteiro, mas achou que a execução deixou a desejar. “Acho que foi escrito maravilhosamente por Jeri Taylor e era forte o suficiente para contratá-la para a equipe. Eu fiquei desapontado com o episódio primariamente porque os alienígenas não eram suficientemente alienígenas. Senti que houve alguma falta de comunicação em algum nível. A ideia toda do episódio foi perdida porque essas criaturas alienígenas selvagens e diferentes acabaram sendo muito humanas.”
  • Vemos pela primeira vez um jogo de racquetball, que voltaria a aparecer em Deep Space Nine.

Ficha Técnica

História de Ralph Phillips
Roteiro de John Whelpley & Jeri Taylor
Dirigido por Gabrielle Beaumont

Exibido em 15 de outubro de 1990

Título em português: “Crise de Humanidade”

Elenco

Patrick Stewart como Jean-Luc Picard
Jonathan Frakes como William Thomas Riker
Brent Spiner como Data
LeVar Burton como Geordi La Forge
Michael Dorn como Worf
Marina Sirtis como Deanna Troi
Gates McFadden como Beverly Crusher
Wil Wheaton como Wesley Crusher

Elenco convidado

Sherman Howard como Endar
Chad Allen
como Jono/Jeremiah Rossa
Barbara Townsend
como Connaught Rossa

Enquete

TS Poll - Loading poll ...

Edição de Maria Lucia Rácz
Revisão de Susana Alexandria

Episódio anterior | Próximo episódio