PIC 1×07: Nepenthe

O emocionante encontro entre Picard e velhos amigos da Enterprise

Sinopse

Três semanas atrás, Instituto Daystrom, Okinawa, Japão. Agnes Jurati está comendo quando é abordada pela comodoro Oh, da Segurança da Frota Estelar. A comodoro pergunta sobre os dois encontros recentes entre Jurati e Picard – o primeiro ali no Instituto, em que Picard mencionou ter interagido com uma forma de vida sintética, antes de falar sobre Bruce Maddox e seu trabalho com clonagem neuronal fractal. Depois desse encontro, Jurati transferiu mais de 300 gigabytes de dados do trabalho de Maddox para um PADD, presumivelmente para uso de Picard. Oh diz que Jurati não fez nada de errado e que Frota Estelar precisa de sua ajuda. Picard informou que pretendia sair da Terra para encontrar Maddox e Soji Asha, e Oh pede a Agnes que o acompanhe. Para explicar melhor, Oh faz um elo mental com Agnes, mostrando que haverá destruição em massa caso se permita a existência de sintéticos. Agnes fica tão aterrorizada que vomita. Oh entrega a Agnes um rastreador comestível e diz que ela precisará fazer um sacrifício terrível.

Três semanas depois, na La Sirena, Rios e Raffi tentam se desvencilhar de um raio trator do Artefato para que possam seguir Picard e Soji até o planeta Nepenthe, a dias de distância em dobra máxima. Agnes sugere que eles simplesmente peçam aos romulanos que os libertem, pois estão atrás de Soji, não deles.

Dentro do Artefato, Narissa aponta uma arma para Hugh, diante de uma fileira de xBs (ex-borgs), exigindo que ele revele o paradeiro de Picard e Soji. Como ele não responde, um guarda romulano mata um dos xBs. Ela insiste com Hugh, pois sabe que ele, Picard e Soji foram ao setor 11 do cubo borg, mas só Hugh retornou. Hugh apenas diz que eles sumiram, mas não diz para onde foram. Narissa então ordena aos guardas que matem todos os xBs.

Enquanto Hugh chora sobre os corpos, Narissa diz que odeia o cubo borg, mas não foi a condição de ex-borgs que os matou, e sim o fato de Hugh ter deixado Picard e Soji escaparem, arruinando anos de trabalho de agentes em centenas de sistemas estelares, e talvez condenando um trilhão de almas em metade da galáxia. Ela só não mata Hugh por ele ser cidadão da Federação e ser parte do tratado que criou o Projeto de Recuperação Borg. Ela se comunica com Narek, que está saindo com sua nave para perseguir a La Sirena. Depois, manda soltarem o raio trator da nave de Rios. Raffi percebe que é um truque, mas Rios acha que pode escapar deles.

Agnes pergunta sobre Elnor, que ainda está dentro do Artefato. Elnor encontra Hugh entre os xBs mortos, quando é chamado por Rios. Abalado com a morte dos xBs, Elnor decide ficar com Hugh, para evitar que aquilo aconteça de novo. La Sirena entra em velocidade de dobra, com a nave de Narek atrás dela.

Picard e Soji emergem do trajetor espacial em Nepenthe. Uma garota vestida de índio aponta arco e flecha para Picard. Com as mãos ao alto, ele diz que ela deveria mirar na cabeça dele, pois seu coração é de duritânio sólido. Soji parece preocupada, já que Picard disse que Nepenthe era um lugar seguro. Picard sorri e pergunta para a garota: “Estamos seguros, Kestra?”. Kestra baixa o arco e a flecha e Picard pergunta pelos pais da garota.

Kestra pergunta se Picard é pai ou avô de Soji, e a androide diz que não o conhece, apenas sabe que ele é amigo de seu pai. Kestra observa que Soji não acredita nele, e Soji responde que não acredita em ninguém. Quando Kestra pergunta quem é o pai de Soji, Picard responde que é Data. Kestra conclui que Soji é androide, e Soji fica abalada com a revelação, dizendo que tudo em sua vida é uma mentira – seus sonhos e sua irmã Dahj eram todos falsos. Picard afirma que Dahj era real, mas, infelizmente, foi morta pelos mesmos romulanos que agora querem matá-la.

Picard, Soji e Kestra chegam a uma bela casa no meio do bosque. Deanna Troi sai para a varanda e começa a podar plantas, quando ouve a voz da filha. Ergue os olhos e, com alegria, vê Picard se aproximando. Quando se abraçam, ela percebe que ele está em apuros e parece sentir também que ele está doente. Picard apresenta Soji a Troi.

Kestra grita, chamando o pai, William Riker, que está preparando comida na cozinha, ouvindo jazz. Quando ele ouve a filha dizer que é Jean-Luc Picard, ele pausa a música e, antes de confirmar a informação, vê Picard já dentro da casa. Contente, cumprimenta o almirante com um abraço caloroso. Logo percebe que Picard está se escondendo e dá um comando de voz para erguer os escudos da casa – uma precaução contra os kzinti. Picard também sugere acionar o sensor contra camuflagem, e Riker conclui que há romulanos envolvidos. Ele lembra que alertou Picard, durante a crise da supernova, que ele ficaria enrolado com romulanos pelo resto da vida, e também mencionou a quarta lei de Newton da termodinâmica: “Toda boa ação é punida.”

Troi chega e diz que Kestra foi levar Soji até o chuveiro e afirma que, embora Soji pareça humana, ela não conseguiu sentir os pensamentos da jovem. Picard diz que está perdido: quando saiu da Terra, tinha um plano, uma nave e até uma tripulação, mas agora não tinha mais nada, e Soji ainda estava em perigo. Riker sugere que ele precisa de um novo plano, e Troi diz que ele precisa tirar uma soneca, pois está exausto, e oferece o quarto do filho, Thad, enquanto Riker prepara pizza para o jantar – com tomate e manjericão da horta deles e linguiça de coelhocórnio caçado por Kestra.

Soji toma uma ducha no chuveiro, enquanto Kestra lhe faz perguntas: Sabe tocar violino? Gosta de Sherlock Holmes? Corre em alta velocidade, pula bem alto e consegue dobrar uma barra de aço só com as mãos? São todas coisas que Kestra sabe que Data conseguia fazer. Kestra explica que seus pais serviram com Data na Enterprise até a morte dele, e que Picard era o capitão – o maior capitão da história da Frota Estelar, segundo Riker. Soji duvida que Data possa ser seu pai, já que ela foi criada há apenas três anos, e pergunta por que Data faria um androide com muco e saliva. Kestra diz que Data sempre quis ser mais humano. Ele era forte e inteligente, mas queria sonhar, contar piadas e aprender a dançar. Pergunta se Soji sabe fazer essas coisas, e Soji, quase chorando, responde que, até Kestra mencionar a palavra “androide”, ela ainda se agarrava à ideia de ser humana. Kestra diz para Soji não chorar, pois ela é incrível.

No quarto de Thad, Troi mostra uma foto de Picard, de uniforme da Frota Estelar, com o filho ainda bebê no colo. Ela diz que Thad faria 18 anos na semana que passou, e que Kestra ainda sentia falta dele. Troi diz a Picard que ele pode ficar ali quanto quiser, mas só tem medo de que algo de ruim aconteça a Kestra. Picard promete ir embora assim que tiver um plano.

Na La Sirena, Rios e Raffi detectam a nave de Narek em perseguição. Rios acha que é uma nave “cabeça de cobra”, rápida e com muito armamento. Ele tenta despistá-la, e Jurati, alterada, pergunta se precisam mesmo ir a Nepenthe. O que ela quer é retornar à Terra, pois Picard pode cuidar de si mesmo e outra pessoa, não ela, pode encontrar Soji. Raffi percebe que Agnes está em pânico e diz que vai cuidar dela.

Em Nepenthe, Riker prepara o forno para a pizza no quintal. Picard se aproxima e se diz preocupado com Rios, que ainda não entrou em contato. Riker pergunta o que está ocorrendo, mas Picard diz que não quer envolvê-lo. Riker comenta que o solo de Nepenthe é muito fértil e tem poderes regenerativos. Kestra e Soji aparecem, conversando em “viveen”, língua inventada por Thad. Kestra diz que Soji memorizou as 300 páginas do dicionário de viveen em dois minutos. Soji vê a pizza e faz um movimento de cabeça semelhante ao que Data fazia.

Quando as duas vão embora, Riker começa a adivinhar, corretamente, a situação de Picard: ele está preocupado com camuflagem, e isto significa romulanos; está preocupado com a segurança deles, o que significa Tal Shiar; eles estão atrás de Soji, não de Picard; e, pelo movimento da cabeça, Soji é androide e descende de Data. Riker diz que Picard está sendo arrogante ao decidir quem pode correr perigo ou não, que essa atitude pode funcionar numa nave estelar, mas agora ele está lidando com uma adolescente – mais ou menos – e pode não estar preparado para isso. Picard admite que provavelmente não está.

Na horta, Soji diz que nunca comeu nada que não fosse feito num sintetizador, e Troi lhe dá um tomate para experimentar. Soji diz que o tomate é tão real e que coisas reais são tão melhores. Troi percebe que Soji está se referindo a si própria e então revela que seu filho morreu de uma doença rara, neurosclerose mandáxica, causada por um vírus baseado em silício. A doença seria curável se fosse possível fazer a cultura das células infectadas numa matriz positrônica ativa, mas, quando Thad adoeceu, não havia essas matrizes, por causa da proibição dos sintéticos. Troi conclui que o que é real nem sempre é o melhor.

Soji percebe que Troi já sabe que ela é androide e explica que sabe muito pouco: os romulanos estão atrás dela e parecem muito interessados em saber em que planeta ela foi feita. Ela conta a Troi sobre Narek, que parecia estar apaixonado por ela, mas só queria obter informações e depois tentou matá-la. Soji diz que não confia em mais ninguém – não confia em Troi, Kestra ou Picard, e que tudo pode ser apenas mais uma invenção, um jogo, como sua infância e seus pais.

Picard ouve a conversa e faz um comentário irônico, dizendo: “Você tem razão. Tudo isto é uma trama requintada. No seu lugar, não confiaria em nós.” Contrariada, Soji se retira, dando um empurrão em Picard. Troi diz que Picard mereceu o empurrão, por não levar em consideração os sentimentos de Soji: enquanto ele achava absurda a ideia de que tudo ali fosse uma simulação, para Soji seria apenas a repetição do que ela já viveu. Sua capacidade de confiar foi um erro de programação. Ela foi manipulada, torturada, sua consciência foi violada. Troi diz que ele precisa ser Jean-Luc Picard: compassivo, paciente, curioso. E insiste para que ele aceite a ajuda deles, fingindo que a mesa do jantar será a mesa de reuniões da Enterprise.

No cubo borg, Hugh e Elnor dirigem-se rapidamente à cela da rainha borg. Hugh diz que há imenso poder ali, e ele usará esse poder para defender os xBs. Diz que vai tomar o cubo dos romulanos para sempre. Mas Narissa aparece, dizendo que Hugh estava tramando uma insurreição, e isso lhe dava um motivo para matá-lo. Elnor pega a sua espada para defender Hugh. Narissa se declara do Zhat Vash e o reconhece como Qowat Milat e diz que a luta entre eles deve ser sem armas. Elnor guarda a espada e eles começam a lutar, mas Narissa saca duas pequenas facas e rapidamente atira uma delas contra o pescoço de Hugh. Elnor vai socorrê-lo, retira a faca do pescoço de Hugh e a atira contra Narissa, mas ela se teletransporta a tempo de escapar. Agonizando, Hugh explica que o cubo borg só pode ser ativado por um xB. Antes de morrer, diz que foi um tolo cheio de esperança por um instante e agradece a Elnor por isso.

Na La Sirena, Raffi replica uma fatia de bolo no sintetizador para Agnes. Ela chora, e Raffi tenta acalmá-la. Rios avisa que a nave romulana os encontrou de novo. Ao ouvir isso, Agnes vomita.

Em Nepenthe, Riker serve a pizza a todos os que já estão à mesa: Soji, Kestra e Troi. Picard chega logo depois, dizendo que ainda não conseguiu contato com Rios e, se ele não aparecer, vai precisar de outra nave. Riker diz que talvez encontre uma no espaçoporto em Infinity Lake. Kestra sugere a nave Inside Straight, do capitão Crandall, que conhece tudo, de Q’OnoS à Fenda de Tyken. Riker, porém, diz que tanto Rupert Crandall quanto sua nave estão em mau estado e pergunta a Picard onde ele iria com a nave. Soji é quem responde: para casa, seu planeta natal. Picard diz que vai levá-la, pois ela foi feita a partir dos restos mortais de Data, que deu sua vida para salvar a dele. Mas o motivo principal de sua missão de levá-la até lá é que agora ele se sente vivo e ninguém vai impedi-lo. Soji descreve o que viu quando estava com Narek no Zhal Makh: duas luas vermelhas e um céu cheio de raios. O seu lar. Riker sugere que Maddox deve ter ido para esse planeta logo após o banimento dos sintéticos, pois ninguém o achou por 14 anos. Troi complementa dizendo que ele deve ter retomado seu trabalho de criação de vidas sintéticas – e, julgando pelo que os romulanos fizeram a Dahj e a Soji, o planeta deve estar em perigo. Riker sugere que Picard contate a Frota Estelar, e Picard concorda, mas antes precisa descobrir onde fica esse planeta. Kestra, que estava mexendo em seu pequeno PADD, tem a resposta: o planeta fica no setor Vayt, do Sistema Ghulion. Não tem nome, apenas um número. A informação veio do capitão Crandall.

Na La Sirena, Rios conversa com Agnes e diz desconfiar que Raffi esteja com algum rastreador, pois a nave romulana os encontra toda vez que Rios a despista. Agnes diz que ela própria pode estar portando um rastreador, não Raffi, mas Rios não acredita, já que Agnes não saiu da La Sirena desde que partiram da Terra. Raffi interrompe a conversa dos dois, informando que a nave romulana voltou. Rios vai para a ponte e Agnes fica sozinha. No sintetizador, replica uma hypospray com hidreto de norânio e injeta em si mesma. Rapidamente cai e começa a ter convulsão e espumar pela boca. O médico holográfico é ativado. Em sua nave, Narek perde o sinal do rastreador de Agnes. O médico holográfico chama Rios à enfermaria, informando que Agnes está em coma. Rios corre até lá.

No artefato, Elnor se esconde e descobre um cartão dos Fenris Rangers pendurado sob uma mesa. Ele aciona o SOS, chamando os Patrulheiros.

Em Nepenthe, Picard e Riker caminham pelo bosque e Picard diz que Rios está chegando com a La Sirena. Riker observa que Picard estava preocupado com a tripulação e pergunta como eles são. Picard diz que é uma tripulação heterogênea e só fizeram drama desde que saíram da Terra – bem diferente da tripulação da Enterprise. Eles se sentam à beira de um lago. Riker informa que ainda está na reserva ativa, mas só voltaria ao espaço por um bom motivo. Diz a Picard que ele não deveria ter se aposentado, e Picard admite que ele tem razão – e agradece por Riker não ter tentado dissuadi-lo de sua missão com Soji.

Kestra desenha o rosto de Soji, enquanto a androide dorme. Ela acorda e Kestra diz que sentirá sua falta. Diz também que sabe que algo de muito ruim aconteceu a Soji, e que algo muito ruim aconteceu com ela também, e foram seus pais que a ajudaram. Então, Kestra sugere que Soji, por não ter pais, deixe que Picard cuide dela. Os dois poderiam cuidar um do outro. Soji diz que vai pensar.

Fora da casa, Picard se despede de Riker e Troi, e Kestra dá uma bússola quebrada de presente para Soji e lhe dá um abraço de despedida. Rios teletransporta Picard e Soji para a nave La Sirena.

Comentários

O showrunner e co-roteirista de “Nepenthe”, Michael Chabon, declarou que o segmento foi concebido como um respiro, um descanso. “Já temos todos os elementos em jogo a esta altura”, disse Chabon. “O mistério todo já está posto, em todas as suas particularidades – ainda não foi revelado, isso ainda vai acontecer”. Assim, antes dos três episódios finais, que trarão o desfecho da trama e prometem ter mais ação, “Nepenthe” é o “repouso do guerreiro” que antecede o ato final da temporada.

Picard foi buscar no planeta Nepenthe o apoio de velhos amigos em quem sabe que pode confiar: William Riker e Deanna Troi, respectivamente primeiro oficial e conselheira da nave Enterprise, quando Picard era capitão. Riker e Troi se casaram durante o filme Nêmesis e tiveram Picard como padrinho.

Marina Sirtis disse que não foi difícil voltar ao papel de Deanna Troi. Passou tantos anos interpretando a conselheira que, no set, foi só abrir a boca e quem começou a falar foi ela. Para Jonathan Frakes, a volta não foi tão tranquila. Após tantos anos atrás das câmeras como diretor (dirigiu, inclusive, os episódios 4 e 5 de Picard), ficou apreensivo quando recebeu o convite para reviver Riker, pois há muito tempo não atuava e temia ser “devorado” por Patrick Stewart e Marina Sirtis, que estavam mais afiados na atuação (ele tinha acabado de dirigir Stewart em Picard e Marina havia terminado uma temporada num teatro londrino). Pelo que se vê em tela, o medo do ator era infundado. A interação entre os três transparece verdade, carinho e respeito – como deve ser a relação entre velhos e verdadeiros amigos, que passaram tantos anos juntos.

O abraço entre o ex-borg Hugh e Picard, no episódio anterior, The Impossible Box, já tinha emocionado os fãs, mas ver o velho capitão (como ainda é chamado pelo casal) receber mais dois abraços calorosos, além do apoio incondicional dos velhos personagens de A Nova Geração, com certeza levou muitos fãs às lágrimas.

Riker e Troi foram viver em Nepenthe, cujo solo tem qualidades regenerativas, na tentativa de encontrar a cura para a doença do filho, Thad. A cura não foi possível, e Thad acabou falecendo, mas o casal decidiu adotar o planeta como lar, assim como o filho, que tinha nascido e vivido em naves estelares, o adotou como planeta natal.

O episódio tem muita nostalgia e emoção, mas também serve totalmente à trama, que segue na casa em meio a um bosque onde vive o casal e a filha adolescente Kestra. A casa, de certa maneira, representa a nave Enterprise, com seus escudos de proteção e a mesa de jantar transformada em sala de reuniões. O fã da Nova Geração com certeza se divertiu quando Riker disse “Shields up!”, frase que usava com frequência na antiga série.

Deanna Troi volta a ser a conselheira de Picard, ajudando a trazer de volta a psique de Picard – a pessoa compassiva, paciente e curiosa que ela conheceu. Ajuda-o a levar em conta os sentimentos de Soji – e não apenas os dele. Mais tarde, à mesa, todos contribuem com informações e ideias para o prosseguimento da missão: levar Soji até seu planeta natal – missão que Picard toma para si como um modo de voltar à vida, como ele mesmo declara a todos em volta da mesa, confirmando o que já tínhamos visto no primeiro capítulo, Remembrance.

Tanto Picard quanto Soji precisavam de apoio psicológico para seguir em frente, e os dois encontram esse apoio em Nepenthe. Enquanto Riker e Troi ajudam Picard a se adaptar à sua situação atual, como líder de uma missão (após 14 anos de reclusão em sua vinícola da França), Kestra faz o papel de irmã mais nova de Soji, ajudando-a a aceitar sua condição de androide. A personagem Kestra, aliás, exerce um papel importante no episódio: ela ajuda Soji a se aceitar como forma de vida sintética e a confiar em Picard; dá várias informações à nova audiência sobre o androide Data; é um dos pilares que mantêm Riker e Troi em pé, após a morte de Thad; e ainda contribui com uma informação crucial para o seguimento da missão – a localização do planeta onde Soji foi construída. Além disso, é uma luz de alegria em meio a tanta dor e sofrimento dos demais personagens. A atriz, Lulu Wilson, de 14 anos, já veterana de filmes de terror apesar da pouca idade, saiu-se muito bem como Kestra.

Ao final do episódio, Picard e Soji saem renovados para a missão – não é à toa que o episódio (e o planeta) se chama “Nepenthe”, termo grego usado desde a Odisseia, de Homero, para designar um narcótico do esquecimento, que alivia a dor e a tristeza.

“Nepenthe” lembra muito “Family”, de A Nova Geração: nas duas ocasiões Picard vai a um lugar campestre buscar refúgio na família (com a morte do único irmão e do sobrinho, os amigos da Enterprise tornaram-se a sua família); nos dois lugares ele é recebido por uma criança; as duas crianças fazem comentários inadequados (René, sobrinho de Picard, diz que o pai o chama de “arrogante”, e Kestra solta, “na lata”, que Soji é androide); os dois episódios vêm na sequência de uma experiência de Picard com os borgs – “Family” vem logo após “The Best of Both Worlds”, em que ele é assimilado como Locutus, e “Nepenthe” vem em seguida a “The Impossible Box”, em que ele tem de enfrentar seus traumas num cubo borg.

A diferença é que “Family” se passa o tempo todo na Terra, no vinhedo na França, enquanto “Nepenthe” faz a opção – acertada – de mostrar o que se passa fora do planeta. E coisas importantes acontecem lá fora: o flashback do início revela, em parte, a motivação de Agnes para acompanhar Picard e matar Maddox. Mas sua consciência está falando mais alto e ela entra em coma para desativar o rastreador que engoliu, a fim de liberar a La Sirena da perseguição de Narek. É um ato que revela seu estado mental conturbado, provavelmente por culpa e arrependimento.

No Artefato, Elnor não consegue salvar Hugh da morte, vitimado por uma faca atirada pela vilã Narissa – esta uma personagem totalmente clichê (impiedosa, olhar maléfico, com roupa preta de couro etc), mas que diverte e é bem interpretada por Peyton List. A morte de Hugh foi um momento triste – e deu a impressão de ter sido prematura. Mesmo assim, há que se dar o devido crédito à equipe criativa: se sentimos a morte de Hugh, é porque ao seu personagem deu-se o devido tempo para ser bem construído e ganhar a empatia do público.

Personagem mais deslocado da série, Elnor, parece ter saído de um conto de aventura medieval, ou de um romance capa-e-espada (como “Os Três Mosqueteiros”, livro que Picard dá a ele de presente no episódio Absolute Candor), direto para o espaço, no século 24. O anacronismo do ingênuo Elnor, porém, é precisamente o que o torna atraente e simpático. Ele parece estar ali para nos lembrar de que Picard, apesar de toda a sua carga de temas sérios e adultos – como dor, sofrimento e morte –, é uma série de entretenimento.

O episódio levanta alguns temas interessantes, como solidariedade e confiança. Gestos solidários e desinteressados – como os de Kestra com Soji e Raffi com Agnes – criam laços de confiança que fazem emergir o lado bom das pessoas.

O contraponto entre o real e o imaginário também é um tema abordado. É interessante o paralelo entre as vidas imaginárias de Thad e Soji. O garoto criou um mundo imaginário, Ardani – e 12 línguas diferentes! –, que acabou se concretizando no planeta Nepenthe; e o passado de Soji, também imaginário, começa e se tornar real à medida em que ela começa a criar laços afetivos (Picard pode vir a ser seu “pai”, como Kestra sugeriu) e ruma para o planeta onde foi criada – seu planeta natal, como também observou Kestra.

E, claro, os temas da velhice, do sentimento de inutilidade, da decrepitude do corpo e da morte acompanham sempre o protagonista Picard, nesta última fase de sua vida.

Picard tem muitos elementos de um drama psicológico, em que a jornada dos personagens é mais interior do que exterior. Mas esta jornada também envolve muito movimento de um ponto a outro, como num road movie – o que faz o espectador aguardar, ansioso, pelo próximo destino do velho almirante.

Avaliação

Citações

“Let me show you what will happen if synthetic life is allowed to exist.”
(Mostrarei o que acontecerá se permitirem a existência de vida sintética.)
Comodoro Oh, antes do elo mental com Agnes

“No good deed goes unpunished.”
(Toda boa ação é punida.)
Riker para Picard

“You need to be Jean-Luc Picard. Compassionate, patient, curious.”
(Você precisa ser Jean-Luc Picard. Compassivo, paciente, curioso.)
Troi para Picard

“I was that much of a hopeful fool again for a minute. Thanks for that.”
(Voltei a ser um tolo cheio de esperança por um instante. Obrigado por isso.)
Hugh para Elnor, antes de morrer

“Before your sister came to me, I was haunted by my past and marking time, wasting my life. But now I’m alive, and I have a mission, which means there’s not a hell of a chance that you or anyone else can stop me.”
(Antes de sua irmã me procurar, eu era assombrado pelo passado e estava marcando passo, desperdiçando a minha vida. Agora me sinto vivo e tenho uma missão, ou seja, não existe chance de você nem ninguém me impedir.)
Picard para Soji

Trivia

  •  O nome do episódio vem do grego e foi citado por Homero, na Odisseia. O poema épico cita Nepenthe como um narcótico que induz à perda da memória, para esconder a dor e a tristeza.
  • Os kzinti, mencionados por Riker, são uma raça humanoide-felina que aparece no episódio “The Slaver Weapon”, da Série Animada.
  • Riker chama Deanna de “Imzadi”. O termo betazoide foi usado pela primeira vez no episódio piloto de A Nova Geração, Encounter at Farpoint, num diálogo entre Riker e Troi, e significa “querido(a)/amado(a)”.
  • Quando fala sobre Data com Soji, Kestra menciona fatos que ocorreram em vários episódios de A Nova Geração: a habilidade de Data em tocar violino (“Sarek”, “In Theory”, “Inheritance”); a sub-rotina de sonhos de Data (“Birthright Parte I”, “Phantasms”), seu desejo de compreender e dominar a arte da comédia (“The Outreageous Okona”), a vontade de aprender a dançar (“Data’s Day”); e o gosto de Data por Sherlock Holmes (“Lonely Among Us”, “Elementary, Dear Data”, “Ship in a Bottle”).
  • Marina Sirtis usa a mesma peruca e as mesmas lentes de contato pretas que utilizou em Nêmesis. Ela guardou a peruca e as lentes por 18 anos, como lembrança do último filme. Nas redes sociais, brincou: “Ainda bem que afanei essas coisas porque eles não iriam ter tempo de mandar fazer uma peruca de 10 mil dólares.”
  • Picard menciona que seu coração é de duritânio sólido. Ele recebeu um coração artificial em 2327, depois de ser esfaqueado por um nausicano numa briga de bar, conforme narrado em dois episódios de A Nova Geração: “Samaritan Snare”, da segunda temporada, e “Tapestry”, da sexta temporada.
  • Kestra Troi-Riker tem esse nome em homenagem à irmã mais velha de Deanna, cuja morte foi contada no episódio “Dark Page”, da sétima temporada de A Nova Geração.
  • Thadeus Troi-Riker, o filho falecido de Troi e Riker, tem esse nome em homenagem ao coronel Thaddius Riker, antepassado de Riker que lutou na Guerra de Secessão americana, mencionado durante a visita de Riker à USS Voyager, no episódio “Death Wish”.
  • Deanna menciona que Thad teria feito 18 anos na semana anterior. Logo, ele nasceu em 2381, apenas dois anos após os eventos do filme Nêmesis.
  • Agnes Jurati menciona os gormaganders, “baleias espaciais” que aparecem pela primeira vez no episódio Magic to Make the Sanest Man Go Mad, da série Discovery. No flashback, Agnes está ouvindo ópera kasseliana, gênero musical mencionado pela primeira vez no mesmo episódio que introduziu o gormagander.
  • Duas imagens do episódio If Memory Serves, de Star Trek: Discovery, foram recicladas e reutilizadas para mostrar a aparente destruição da Terra, durante o elo mental entre a comodoro Oh e Agnes Jurati.
  • Kestra sugere a nave do capitão Crandall, que conhece tudo, de Q’OnoS à Fenda de Tyken. Essa fenda aparece em “Night Terrors”, episódio da quarta temporada centrado na personagem Deanna Troi.

Ficha Técnica

Escrito por Samantha Hemphrey e Michael Chabon
Dirigido por Doug Aarniokoski

Exibido em 05 de março de 2020

Título em português: “Nepenthe”

Elenco

Patrick Stewart como Jean-Luc Picard
Alison Pill como Dra. Agnes Jurati
Isa Briones como Soji Asha
Evan Evagora como Elnor
Michelle Hurd como Raffi Musiker
Santiago Cabrera como Cristobal “Chris” Rios
Harry Treadaway como Narek

Elenco convidado

Jonathan Frakes como William Riker
Marina Sirtis como Deanna Troi
Jonathan Del Arco como Hugh
Peyton List como Narissa
Tamlyn Tomita como comodoro Oh
Lulu Wilson como Kestra Troi-Riker
Derek Webster como guarda romulano
Kay Bess como o computador da La Sirena

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